domingo, 31 de janeiro de 2010

Questões de planeamento territorial, urbanismo e transportes

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Estou um bocado atrapalhado.

O meu colega de Hamburgo vem cá passar a Páscoa e pediu-me elementos sobre os transportes em Lisboa para um trabalho comparativo que está a fazer.
Não sei se vou conseguir reunir as respostas até à Páscoa nem se o MOPCT ou o INE poderão fornecer informações fiáveis.
São as seguintes as perguntas:
1 – Qual a percentagem do custo do transporte (todos os modos incluídos, mesmo o transporte individual) da área metropolitana de Lisboa relativamente ao PIB local da área? (exemplos dados: Hong Kong 5%; Houston 14%)
2 - Qual a densidade de habitantes por hectare? (exemplos dados: Hong Kong 320 pessoas/ha; Houston 9 pess/ha
3 – Qual a correlação entre a quota do transporte colectivo nas deslocações na área metropolitana (contabilizar as deslocações a pé e de bicicleta) e o custo do transporte em percentagem do PIB local?
4 – Qual a correlação entre a quota do transporte colectivo nas deslocações na área metropolitana (contabilizar as deslocações a pé e de bicicleta) e a energia consumida por habitante e por ano?
5 – Quais as quotas do transporte colectivo e do transporte individual (excluir as deslocações a pé e de bicicleta) e qual a transferência de uma para a outra de modo a conseguir-se uma poupança de combustível por passageiro e por ano de 0,5 toneladas equivalentes de petróleo?

Alguém ajuda? Ou vamos ter de esperar pelo inquérito à mobilidade? Eu não sou muito de um diagnóstico exaustivo de uma situação para estudar as soluções, mas há mínimos e, para quem tenha de estudar soluções de planeamento territorial, urbanismo e transportes na área metropolitana de Lisboa, era conveniente ter as respostas a estas questões.

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O secretismo, o ordenamento territorial e um problema de Fermi

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O secretismo
O secretismo, como falado em 24 de Janeiro passado a propósito, por contraste, da política de divulgação do Dr Fernando Pádua, é algo muito querido em Portugal por muitos gestores e decisores.
É uma manifestação de falta de respeito pelos concidadãos baseada num sentimento de superioridade e de eleição (infelizmente, às vezes até são mesmo eleitos, ou nomeados por eleitos).
É também um desvio relativamente à directiva europeia de direito dos cidadãos à informação.
Custa aos eleitos que têm acesso à informação partilhá-la e assim, perder vantagem competitiva (adam smithismo puro).
Escrevo isto a propósito do deslizamento de terras na CREL, assunto bem dentro da problemática dos transportes.
Quase uma semana depois do acidente, consegui encontrar nos meios de comunicação social uma fotografia, que me permitiu localizar com mais precisão o deslizamento.

A localização do deslizamento de terras
As primeiras informações referiam entre o túnel de Carenque e o nó de Belas (ca 1800 m). A fotografia com o aqueduto ao lado permite referenciar o local como 30º46’53”N e 9º14’46”W.
Verifica-se no Google Earth (imagem com 2 ou 3 anos) que estamos junto de uma encosta com um desnível de cerca de 75m (ca de 25 andares) entre a cota da CREL e o cimo da serra (junto da subestação de Carenque da REN ).
Cerca de 100 m para sudoeste do local do acidente, vê-se um tratamento da encosta (escavação com projeção de calda de cimento) e o que parece uma vala alargada de drenagem que se prolonga para sudoeste, adjacente à via, por cerca de 360m . Aparentemente drenaria de SW para NE, para a tal zona escavada, onde termina a vala alargada de drenagem.
Pela encosta acima vêem-se postes de alta tensão e falta de vegetação que possa suster as terras e combater a erosão. Aliás, o limite sul do deslizamento coincide com uma massa de vegetação.
Dada a antiguidade da imagem, não identifico o local de despejo de terras provenientes de obras.
Embora o secretismo à portuguesa mande os gestores dizer, com muito sentido de responsabilidade (segundo o conceito português, também), que só podem saber-se as causas depois do inquérito concluído (não é isso que diz a Sabedoria das Multidões, a propósito da busca do submarino Scorpion; além de que o tempo que leva a fazer o inquérito desmobiliza a atenção da opinião pública, veja-se o caso do acidente de Novembro de 2009 com os carros oficiais do secretário geral da segurança e do presidente da Assembleia da Republica; noutros casos, como no acidente com o autocarro na A23, a sentença do tribunal indicia um mau entendimento ou uma impossibilidade legal de dar prosseguimento ao relatório técnico), é legítimo colocar a hipótese de que as circunstancias anteriores (deficiente drenagem ao nível da via e ao longo da encosta, ausência de vegetação, pressão das novas terras, até o recente sismo tendente a desagregar as terras) contribuíram, em conjunto com a elevada precipitação, numa ou noutra medida, para o resultado final.
Foi uma sorte não ter havido vítimas.
Não vale a pena, penso eu, procurar culpados e pô-los no pelourinho (outro conceito bem português). Vale a pena continuar a trabalhar na remoção das terras e na reposição das vias em condições de segurança, determinar em profundidade as causas e as circunstancias, e aplicar as recomendações resultantes para evitar ou minimizar a repetição do acidente.

O dever de um operador de transportes zelar pela segurança interna e externa das suas vias de transporte
As primeiras notícias davam conta de um porta voz da Brisa com muita inocência a deitar as culpas para o dono do terreno, que o incidente tinha vindo do exterior para o interior e não do interior para o exterior. E , dias depois, o senhor porta voz insiste em “responsabilizar” o dono do terreno.
Recordo a propósito um incidente comigo na A2, na descida para a saída de S.Bartolomeu de Messines ao km 225, no sentido N-S. Em consequência de muita chuva, terra argilosa das encostas adjacentes (que tinham sido cortadas mas não estabilizadas) deslizou para as vias e formou uma camada escorregadia no pavimento. As rodas do meu carro perderam a aderência, em claro fenómeno de aqua planning, mas consegui manter o carro na via. Vários carros estavam despistados na vala de separação central, porque nessa altura, há cerca de 10 anos, não tinha ainda sido montado o separador central (a auto-estrada foi inaugurada sem separador central, o que constitui outro exemplo de convencimento, com um acidente mortal por despiste na vala de separação central no próprio dia de inauguração) .
Formalizei junto da Brisa um pedido de informação sobre as medidas que tinha ou planeava para mitigar os riscos de escorregamento de terras para as vias e de melhoria das condições de drenagem das valas laterais.
A Brisa, lamentavelmente, porque publicita a segurança como a sua prioridade, rejeitou com sobranceria a prestação de informações completas, declinando qualquer responsabilidade no incidente. No local apenas limpou as valas de drenagem (claramente subdimensionadas para grandes precipitações). Noutras zonas da autoestrada, porém, executou importantes obras de consolidação das encostas. Na descida para S.Bartolomeu, porém, mantem-se o perigo em dias de chuva.
Quero com este exemplo chamar a atenção para que uma empresa de transportes tem de estar atenta ao que se passa na envolvente das suas vias. A construtora dos novos troços do IC 16 e IC17 acumulou grandes quantidades de terra retirada dos novos traçados junto do percurso do metropolitano entre as estações de Alfornelos e Amadora Este. E um amigo meu que trabalha no metropolitano foi lá ver se o peso das terras interferia com o túnel.
Havia alguma probabilidade de interferir. Quando o empreiteiro que construiu o Hospital da Luz começou as escavações para as fundações, o desaterro e a subsequente diminuição da pressão sobre o túnel provocou uma elevação da altimetria da via férrea do metropolitano. O meu amigo teve de lá ir a correr suspender a obra, que só recomeçou depois de tomadas as devidas medidas de prevenção e correcção.
Não posso concordar que o dono do terreno em Carenque tenha despejado terras sem os cuidados devidos, mas também não posso concordar com o desleixo da Brisa que não exerceu a devida vigilância sobre as condições de segurança da envolvente.

O ordenamento do território (ou a sua ausência)
Além do mais, tudo isto revela a ausência de planeamento territorial desde há muitos anos. Toda a região de Belas, que era também uma aprazível zona suburbana de recreio, foi vítima da pressão da afluência demográfica dos anos 60, com a explosão imobiliária anárquica, sem planeamento integrado, com a ocupação do terreno sem regras que não fossem o improviso, com o abandono de outras habitações, de industrias, de terrenos agrícolas, como se pode ver à beira da estrada de Belas.
Nestas circunstancias, é natural que acidentes como o deslizamento de terras aconteçam. Esperemos que não se insista na culpabilização, mas que se trabalhe conjuntamente para se evitar a repetição deste caso, em Carenque e em qualquer lugar.
Quase por milagre, na zona de Carenque, ao longo de todo este tempo, sobreviveram coisas como os vestígios das pegadas de dinossáurios, mesmo por cima do túnel da CREL, de antas e necrópoles neolíticas, um pouco a sul, na encosta do deslizamento, a quinta do senhor da serra em Belas, com as suas janelas manuelinas, alguns troços do aqueduto das águas livres… nem tudo é mau, no nosso país.

Um problema de Fermi
E chegado a este ponto, ensaio um problema de Fermi (esquecido do que é um problema de Fermi? ver o blogue do dia 2009-10-29, ou o de 2009-11-04, por exemplo) .
Estimando em 600.000 m3 a quantidade de terra que escorregou para a CREL, que numa semana foram retirados 50.000 m3, que as terras continuam a deslizar a uma velocidade de 5 cm/semana apesar de não ter voltado a chover significativamente, calcular ao fim de quanto tempo é que a CREL reabrirá.
Bom, segundo leio nos jornais (tal como li os números acima) a retirada de terras está sendo feita 24 horas por dia e será difícil aumentar o seu rendimento. Mas admitamos que vai ser possível retirar o excesso de terras em 10 semanas, que a partir da 5ª semana já é possível construir os muros de contenção (ou pregagens, ou ancoragens, ou os gabiões, o que os técnicos da especialidade melhor seleccionarem) que serão executados em 5 semanas, coincidindo com o prazo das 10 semanas para retirada de terras, e que depois são precisas mais 5 semanas para execução de valas de drenagem, para aliviar a pressão sobre as terras quando chove, e para conclusão da reparação e consolidação dos pavimentos das vias que talvez possa começar também à 5ª semana. Não esquecer, antes de reabrir, instalar um sistema de monitorização para vigilância dos deslizamentos dos terrenos envolventes e da estabilidade dos pavimentos da CREL.
Tudo somado dá, para este problema de Fermi, cerca de 15 semanas, ou 3 meses e meio para reabertura da CREL. Lá para os idos da primavera, fins de Abril (feliz ficaria eu se me enganasse).
A ver vamos. A mim me parece que deveria ser a Brisa a resolver o problema de Fermi, que têm para isso mais elementos, mas eles fecham-se naquela de que de momento não há condições para estimar prazos… são talvez as dificuldades que há em Portugal para fazer planeamentos… são os decisores políticos que definem os prazos, não são os técnicos. É uma pena.
Mas não culpem este ou aquele pelos prejuízos, culpem o secretismo dos projectos feitos à pressa e sem debate alargado, culpem a falta de ordenamento e planeamento territorial, culpem o secretismo da informação, culpem os prazos políticos das obras de fachada… ou culpem simplesmente este vício de dizer mal…

E outro problema, talvez não de Fermi
Seria interessante aproveitarem-se os hipotéticos 3 meses de interrupção do serviço da CREL para avaliar:
- o fluxo de tráfego de passageiros que circulavam pelo troço afectado, com destino a Lisboa,
- a percentagem desse tráfego que poderia ser canalizado para percursos em transportes colectivos existentes e projectados
- o fluxo de tráfego de passageiros que circularia pelo troço afectado, com destino a Lisboa, se já estivessem concluídos todo o percurso e nós de ligação da CRIL
- a percentagem deste tráfego que poderia ser canalizado para percursos em transportes colectivos existentes e projectados
Confesso humildemente não dispor de elementos para estas avaliações, parecendo que seria necessário actualizar os inquéritos à mobilidade na área metropolitana de Lisboa, conforme programação do MOPTC (ultimo inquérito oficial realizado pelo IMTT: 1998) ou por iniciativa de operadores de transportes.
Será provavelmente um método de avaliação das necessidades de percursos de transportes colectivos, ir cortando troços dos percursos rodoviários e ver como os transportes colectivos poderiam suprir os percursos interrompidos.
Foi isso que fez a GNR no próprio dia, sugerindo as alternativas rodoviárias.
E as alternativas ferroviárias? Eis mais um exemplo da ausência do ordenamento do território.
Eixos, ou raios, de penetração: Linha de Cascais, Linha do Oeste/linha de Sintra, Linha do Norte/Linha da Azambuja, e ficamos por aqui.
Por parecer existirem poucas alternativas ferroviárias aos percursos de que faz parte o troço afectado, não poderemos tirar deste incidente a conclusão de que a linha de metro ligeiro Algés-Falagueira-Odivelas-Loures-Sacavem, equivalente ferroviário entre a CRIL e a CREL, tem justificação na mobilidade na área metropolitana de Lisboa, intersectando os raios de penetração em nós de correspondência multi-modal com parques de estacionamento “park and ride”? (mas, por favor, em viaduto e com cruzamentos desnivelados para evitar acidentes).
Teremos então, neste momento, os percursos rodoviários sobredimensionados e os percursos ferroviários subdimensionados.
Aguardamos o inquérito à mobilidade?

sábado, 30 de janeiro de 2010

As laranjeiras da praça de Alvalade

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Eu estou a escrever isto porque sou um bocadinho rústico embora viva em Lisboa, mas não nasci em Lisboa, vim viver para cá ainda só tinha 5 anos, por isso é como se fosse de Lisboa mas na verdade sou como comecei por dizer um bocadinho rústico e por isso tive de escrever isto porque, como disse, estava habituado a viver no campo e de repente, com 5 anos vejo-me a viver em Lisboa e logo na primeira vez que saí, havia em frente da nossa casa, não era bem uma casa, era um andar, ali na rua de Santana à Lapa, uma encosta cheia de ervas e com um rebanho a pastar, e eu lembro-me de na altura pensar que afinal era bom viver em Lisboa e fui passear para lá como costumava fazer na minha terra que estavam sempre a dizer à minha mãe que era um perigo eu andar a passear pelo campo fora porque havia pedreiras para a fábrica de cimento e uma linha de caminho de ferro para os vagões levarem o cimento dali para fora que eu nasci numa terra em que se produzia e ainda se produzem bens de utilidade para a comunidade e aqui em Lisboa também era um perigo por haver muitos automóveis eu até me lembro num dos primeiros dias de ver no cimo da Santana à Lapa um Chrysler De Sotto todo cheio de cromados todo esborrachado, o focinho, num eléctrico que ia a subir a Rua de Buenos Aires e eu não gostei nada de ver porque gostava muito de carros com cromados e quando ia a meio da encosta a sentir o cheiro bom das ervas e a humidade da terra que ainda não estávamos no verão vem um senhor com um boné de pala, vestido todo de azul que era a farda dos guardas da altura, ainda não havia estas empresas todas de segurança que visam suprir as faltas nos quadros da polícia ou nos quadros das empresas, e começou a gritar que era proibido andar ali e que se lá me voltasse a ver eu ia preso, como devem calcular eu não gostei nada e não voltei lá porque apesar de me sentir livre de pensamento faço os possíveis por evitar conflitos e quando não se consegue resolver as coisas pela argumentação é porque as pessoas não utilizam os métodos correctos de abordagem dos problemas ou porque foram forçadas por condicionalismos externos ou internos, ou simplesmente não querem na expectativa de recolherem benefícios individuais, e de facto, o guarda estava ali para guardar o terreno onde o empreiteiro daí a uns dias começou a tirar a terra para depois construir os edifícios que lá estão, entre a rua de Santana à Lapa e o gasómetro que já não está lá, os prédios em cima daqueles pilares que, apesar de tudo, nem são dos piores exemplares da arquitectura dos anos 50 do século passado, ai a idade que eu já tenho, mas a verdade é que provavelmente terei ficado traumatizado com este episódio e criado um sentimento de impotência perante a liberdade cerceada de passear no campo, coisa a que eu estava mesmo habituado e também por isso sempre me deliciei a contemplar as árvores que vejo nos passeios de Lisboa com grande pena de estar a ser egoísta quando elas são plátanos ou tílias e o pólen das inflorescencias esféricas e dos amantilhos tanto perturba os concidadãos alérgicos quando começa a primavera, mas todos somos egoístas e nestas coisas das árvores há sempre a possibilidade do departamento de arquitectura paisagista da câmara municipal da minha cidade de Lisboa escolher convenientemente as espécies de árvores em função das necessidades dos contextos particulares de local, tempo e modo, sem prejudicar os alérgicos, estou a dizer minha cidade porque vivo cá há tantos anos, como já disse, casei com uma menina lisboeta e pago as contribuições que a Assembleia municipal em que estão representantes por força do meu voto, poucos representantes porque os meus concidadãos acham que devem votar de maneira diferente da minha, entende por bem fixar, por isso penso que tenho o direito de dizer que me sinto muito desgostado com a forma como o departamento de arquitectura paisagista da câmara municipal da minha cidade de Lisboa trata os arranjos paisagísticos, especialmente quando há mudanças por causa das obras do metropolitano, não nos esqueçamos que um dos temas principais deste blogue é precisamente a problemática dos transportes, e na altura das obras na estação do Marquês de Pombal que dantes se chamava Rotunda que era um nome bem republicano e servia para recordar que ali estiveram uns republicanos corajosos que ainda bem que as tropas monárquicas não estavam lá muito bem organizadas, que a força que mantem um sistema injusto acaba sempre por claudicar, é o que vale, e lá conseguimos ser uma república, que é coisa de que não podem orgulhar-se países mais civilizados que fogem à regra democrática de que todos os cidadãos nascem iguais em direitos políticos, sem cargos públicos à espera que o bebé cresça, e quando será que as monarquias escandinavas respeitam a regra democrática, terá de ser o príncipe herdeiro a declarar-se republicano, como o Júlio Verne ficcionou o grão duque herdeiro do império austríaco, mais valia que lhe tivessem dado ouvidos, ao Júlio Verne, e proclamado a república austríaca antes da I Grande Guerra e talvez não houvesse I Grande Guerra, mas de que serve agora chorar sobre o molhado, não sei, talvez o estudo mais científico do que interpretar a história dos conflitos na ótica dos vencedores pudesse evitar a repetição de erros como a invasão do Iraque, não sei, agora que não há meio do exército americano acertar a retirada com os chefes tribais e o exército afegão, nem o maestro Barenboim, com a sua orquestra palestino-judaica, conseguir convencer os repectivos decisores a acabar com a guerra, mas Marquês de Pombal também é um nome bem posto à estação para que os jesuítas não se esqueçam que podem colaborar com a comunidade mas façam o favor de não exagerar e não queiram controlar ad majorem gloria a formação das elites porque a comunidade dispensa heróis, vedetas e elites e o que era bom era nós fazermos as coisas normalmente como pessoas limitadas mas honestas, fazendo convergir os nossos esforços sem armarmos em detentores de verdades supremas, isto é, trabalharmos em equipa e por isso eu andei a recolher umas informações sobre espécies de árvores cujas raízes fossem horizontais, quando foram as obras da estação do Marquês de Pombal, não sei se se recordam que antes das obras havia na parte mais acima da avenida da Liberdade, em frente do Diário de Notícias, uns freixos frondosos e uns lódãos do rei bonitos que sombreavam os verões lisboetas, e as raízes tinham de ser horizontais porque as obras foram projectadas de tal maneira que a espessura resultante de terras entre a laje de cobertura da estação e a superfície, para os passeios da avenida e para as vias de rodagem, era muito reduzida e por isso eu recolhi essas informações e até tirei umas fotografias em Barcelona de uns arranjos nos passeios para ganhar volume de terras para as raízes das árvores, entreguei tudo ao meu amigo que na altura era o diretor da obra e ele falou então nas reuniões com os técnicos do departamento de arquitectura paisagista da câmara municipal da minha cidade de Lisboa, mas as coisas não correram bem porque lhe disseram que nós, nós os técnicos do departamento de arquitectura paisagista da câmara municipal da minha cidade de Lisboa, nós é que sabemos e os arranjos somos nós que decidimos, também não serviu de nada uns anos mais tarde, quando foi da obra da remodelação da estação Roma que esteve tanto tempo com a superfície da avenida avariada apesar de se ter usado o método construtivo invertido da laje de cobertura para baixo, eu ter sugerido que se estavamos na avenida de Roma era bom pormos uns pinheiros mansos, ai os pinheiros de Roma, mas os técnicos do departamento de arquitectura paisagista da câmara municipal da minha cidade de Lisboa devem ter-se assustado com a hipótese da processionária e das alergias às lagartas quando descem em procissão nos Fevereiros e resolveram pôr uns gingkos biloba, que eu também gosto muito dos gingkos biloba, são muito bons, os frutos, para fazer comprimidos com vitamina E mas nos Setembros os frutos caem, esborracham-se e deitam um cheiro muito pouco urbano, mas voltando à avenida da Liberdade, vejam como está o passeio da avenida da Liberdade em frente do Diário de Notícias com umas arvorezinhas raquiticas e pífias sem sombra no verão vá lá que ainda fizeram uns tratamentos de terras, umas modulações como eles dizem para ganhar espaço para as raízes de umas palmeiras que até ficaram com bom aspeto mas quanto às sombras foram-se e isso é uma pena porque desaparecer uma árvore, quer seja na avenida da Liberdade, quer seja noutro local da cidade ou noutra cidade ou numa aldeia, nós compreendemos, as pessoas também desaparecem, claro que temos pena mas é a lei da Natureza e a lei da Natureza é virem novas pessoas que eu também estou a acabar o meu percurso profissional, não sou como o Fernando Pessoa que achava que ficava mais novo com o tempo a passar por ficar mais longe da realização, e quando olho para os jovens que vão ficar, depois de eu me ir, até sinto um certo orgulho por eles ficarem e serem mais capazes do que eu, tenho a certeza de que não vai haver degradação nos domínios em que eu tentei desenvolver atividades conscientes, penosas e úteis, que é a definição de trabalho segundo George Gurvitch, a quem presto homenagem por ser, eu, de formação clássica, pouco impressionável pelas conquistas dos grandes gurus da sociologia da atualidade, mas ver uma árvore desaparecer sem ser substituída faz-me pena, muita pena, é como aquela tília que havia no largo da avenida D.Carlos que eu até acho muito bem que mantenha o nome porque D.Carlos era um excelente pintor, amante da Natureza e oceanógrafo, porém uma senhora que no largo vendia peixe numa banca ambulante a dias certos da semana queixou-se a um senhor da câmara, não sei se de boné, que os amantilhos que caíam da tília lhe sujavam o peixe e afastavam as freguesas e então ele, galante, mandou serrar a tília e lá ficou o vazio da tília, deve ter acontecido coisa parecida na praça de Alvalade, por onde eu passo todos os dias úteis a caminho da minha empresa, minha não por ser minha mas por nela ter tentado, com assinalável insucesso no âmbito de algumas políticas estratégicas dela, empresa, desenvolver as tais atividades conscientes, penosas e úteis, insucesso porque eu propunha uma coisa e a política estratégica ia por outro lado, e onde verifiquei um dia, triste, que estavam a arrancar as laranjeiras que ornamentavam as placas separadoras do transito rodoviário que aflui à estátua de António de Pádua e Lisboa, a arrancá-las com algum cuidado é certo, não sei se fingido, porque embrulhavam os torrões das raízes, e assim estariam a criar condições para as replantarem noutros locais, mas se foi isso que fizeram, que taxa de sucesso terão obtido, é verdade que as laranjas caíam e sujavam o chão, também estavam sujeitas à doença da mosca branca, e é provável que as cochonilhas já as tivessem atacado, e atacar essas doenças, para que alguém pudesse beneficiar das laranjas, envolveria encargos com pessoal e com os materiais necessários, alguns não renováveis, e é sabido que empresa bem gerida e câmara bem gerida são as que apresentam os rácios de pessoal, como eles dizem, os menores possíveis, embora nos cursos de reciclagem que promovem ou nas propostas de reestruturação que pagam aos seus consultores, que de consultores os rácios podem ser elevados sem serem acusados, os decisores, de má gestão, sejam os recursos humanos os bens mais importantes, o que não deviam dizer porque se fossem os mais importantes não andávamos a deixar crescer a taxa de desemprego para conter a inflação porque infelizmente é a correlação que existe, quanto maior o desemprego mais contidos os preços, claro, que se baixa o poder de compra tem a oferta de se adaptar à procura, e assim não podem as laranjas aproveitar a ninguém , o que é uma pena, mas é uma metáfora de que os recursos que a Natureza põe à nossa disposição para serem aproveitados, ainda por cima renováveis, não podem, ser aproveitados, porque é utopia aproveitá-los enquanto o critério dominante for o da maximização do lucro, assim como não podemos ter árvores nas ruas e nas praças de Lisboa enquanto o critério dominante for o superior entendimento dos técnicos do departamento de arquitectura paisagista da câmara municipal da minha cidade de Lisboa que decidiram pavimentar as placas separadoras da praça de Alvalade com pedra, bonita mas pedra, não arvores, que até são captores de CO2 para fotosíntese, pronto, ficámos sem as laranjeiras, ficámos mesmo, e iremos continuar a ficar sem as árvores do nosso contentamento, porque durante anos o meu amigo do metropolitano que já não é diretor de obra andou a negociar quando era diretor de obra o projeto dos arranjos exteriores da praça de Alvalade e nunca se chegou a nenhuma conclusão e agora de repente, sem que o projeto tivesse sido debatido pelas entidades envolvidas, a obra já está quase pronta e no estaleiro da obra lá está ufana, num letreiro empoleirado em dois postes, a câmara da minha cidade a dizer que fez uma requalificação muito bonita e muito bem feita, do que sinceramente discordo, quanto ao método, secretista, e quanto ao resultado, sem árvores, discordo, pronto, e discordo também que continuemos no futuro a seguir o mesmo caminho, pronto, que maçada não se poder mudar isto e não conseguir convencer os decisores nem os técnicos do departamento de arquitectura paisagista da câmara municipal da minha cidade de Lisboa a dar o braço a torcer, que coisa.
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sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Da arte de convencer o próximo – Solução do enigma

Não é bonito apresentar o enigma e não mostrar a solução.
De modo, que se não tiverem paciência para resolver o enigma, podem ver a solução clicando em (Ctrl+clique ou copy-paste na janela de endereços Internet):

http://cid-95ca2795d8cd20fd.skydrive.live.com/browse.aspx/Blogue%5E_1?uc=1

Façam o favor de clicar depois em:
- “enigma 1 solucao”
- gráfico “transferir”
- open
De vez em quando, uma pequena coisa torna-se muito importante, como achava Pascal quando dizia: "se não fosse um pequeno grão de areia na uretra de Cromwell, talvez a Inglaterra fosse uma república".
Como se vê por este enigma, quem quiser enganar o próximo, basta ocultar-lhe uma pequena diferença e derrubar toda uma teoria como a geometria euclideana.
Felizmente não é possível enganar toda a gente todo o tempo.
Isto coloca um problema interessante a quem tem de desenvolver atividades técnicas sem ser matemático puro ou físico teórico.
Que é o das escolhas acertadas das aproximações e daquilo que se pode desprezar para elaborar um estudo que possa ser útil à comunidade.
Por outras palavras, quando um decisor ou um consultor de decisores fazem o discurso de que primeiro é necessário fazer o diagnóstico e avaliar a dimensão do problema e só depois poder estudar e propor soluções, objectivamente o que está a fazer é a atrasar as soluções.
Tudo isto a propósito dos triângulos.
Lá estou eu a concluir que os problemas são para ser resolvidos por pessoal que já não põe em causa a geometria euclideana (dentro do seu domínio de aplicação ante relativista, perdoe-se-me a redundancia), que a conhece, e que sabe o que pode desprezar e o que não deve desprezar.
Mas para isso, é preciso estar dentro das questões.
É difícil perceber por quem só toca de ouvido…

quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

O Largo do Malvar





O largo do Malvar fica em Carnide.
Vejam o aspecto do largo e reparem no obelisco bonito que decora a fonte.
O pavimento é de basalto escuro, como convem a uma região vulcânica.
Provavelmente retirado da pedreira central da serra de Monsanto.
Reparem nos dizeres no bojo do pedestal: Câmara Municipal de Belem 1857.
Belem era um município. Fundiu-se com, o de Lisboa. Estiveram certos.
O CEO da Mota Engil, antes de ser CEO da Mota Engil, advogou a fusão de municípios.
Estava certo.
Sabemos que os defensores do caciquismo não gostariam, e os detentores da ciência autárquica vêm dizer que com autoridades metropolitanas resolvem o assunto.
Não resolvem.
Influenciado pelas palavras do presidente da república, penso que isso tem um nome: incompetência.
Não fazem ideia do que é organizar o território.
É uma pena, porque já há no país quem saiba.
Pensei nisso quando recebi um anuncio de um curso de mestrado numa universidade sobre “Metropolização e sustentabilidade”. (é sabido que existe uma correlação inversa entre o crescimento ordenado de uma aglomeração e a emissão de CO2 per capita)
É assim que se começa.

Da arte de convencer o próximo



Imaginemos que um senhor vai à televisão e mostra o desenho que preside a este blogue (podem clicar para aumentar e ver melhor).
E demonstra, por a mais b, que a geometria euclidiana está ultrapassada e que devemos inovar e esquecer o que os seniores com formação clássica andam para aí a resmungar.
O povo acreditava porque tinha sido demonstrado.
Mas será assim?
Acham que conseguem resolver este enigma?
São dois triangulos retângulos.
O primeiro contem 4 figuras que dentro dele ocupam todo o seu espaço. O segundo contém as mesmas figuras, com as mesmas formas e áreas, porém com uma arrumação diferente, onde sobra um espaço quadrado vazio.
No final, feito um cálculo da área de cada figura em centimetros quadrados e da sua soma para comparação com a área total do triangulo, complicou-se ainda mais a solução para o enigma.
Como explicar?

Ver solução no dia 29 de Janeiro próximo.

Doutor Belmiro, Doutor Belmiro...

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Talvez pudesse concordar consigo, que um povo culto não precisa de sindicatos.
Desde que o contraditório ficasse assegurado, que o monolitismo já aprendemos que não deve ser e devemos proceder como se as utopias fossem possíveis.
Mas talvez concorde comigo que um povo culto não precisa dos conselhos do doutor honoris causa Belmiro.
E um povo culto, mesmo sem sindicatos, opta por aumentar os impostos sobre os lucros do Doutor, não será?
Ingratos, não se importavam que o Doutor "deslocalizasse", para a Holanda, não é? Mas cuidado que eles lá também aumentaram os impostos sobre os bons resultados dos bancos e das empresas.
Ingratos, não se importam que a inflação cresça.
Realmente,desde que o poder de compra do pessoal aumente, é assim tão grave?
Ai Doutor, Doutor, que um governo culto também não lhe telefonava...
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Economicómio XLI – a situação explosiva 4, a dívida pública em 2040


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Com a devida vénia, transcrevo esta informação do DN.
Para a dívida pública concorrem o Estado, as empresas públicas e as famosas PPP (parcerias publico privado, que já demonstraram em Inglaterra, onde apareceram mais ou menos por causa do tatcherismo, que são mais prejudiciais que benéficas; que o diga o LUL, o metro de Londres, com a sua infeliz experiencia das companhias de manutenção externas).
O BPI elaborou um estudo sobre as contas públicas e a sua evolução até 2040 (será o estudo referido pelo dr João Salgueiro na sua entrevista?), verificando que a dívida pública é neste momento cerca de 100% do PIB.
Constroi 3 hipóteses possíveis para a evolução da dívida pública em função do défice, admitindo um crescimento do PIB entre 0,5 e 2,5% por ano:
1 – Se o défice primário (défice – juros) se reduzir a zero em 2014, então a dívida pública em 2040 será da ordem de 147% do PIB
2 – se o défice primário se mantiver da ordem de 3,7% como actualmente (défice total em 2009: 9,3% do PIB), então a dívida pública em 2040 será da ordem de 300% do PIB
3- se o défice primário se converter em superavit de 2,5% em 2020, a dívida pública em 2040 será da ordem de 115% do PIB.
O estudo do BPI critica fortemente os compromissos com as PPP e regista que em 2010 os encargos com as PPP e os défices das empresas públicas perfizeram 1.600 milhões de euros (1% do PIB).
Ciência interessante esta, não é?

Tenho mesmo de ver como se calcula o PIB.
Para já, começo pela fórmula, que retiro, com a devida vénia, do livrinho “Economia para todos” de David Moss, ed. Academia do Livro:

PIB = consumo dos particulares + investimento produtivo + despesa pública +
exportações – importações

Ainda bem que das 370.000 empresas registadas em Portugal, 10.000 são exportadoras.
Faço votos para que a minha empresa (minha no sentido de ser a comunidade onde ponho ao dispor da entidade gestora as minhas limitadas potencialidades profissionais) contribua para que as exportadoras exportem (seria interessante analisar esta hipótese, bem como a da redução das importações de combustível, o que fundamentaria razoavelmente a existência da empresa).

A continuar…

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A situação explosiva 3 – também é problema, a questão judiciária?

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Retomo a expressão do presidente da república do meu país, situação explosiva.
Afinal a situação explosiva não é apenas a questão económica, por aquilo que se ouviu na abertura do ano judiciário.
Mas a acusação foi clara: a qualidade da produção legislativa é baixa. Será a acusação um pouco imerecida para alguma da produção legislativa de iniciativa do Parlamento, mas o poder legislativo não está só no Parlamento.
Eu cidadão, humilde e limitado técnico numa empresa de transporte de pessoas, vejo assim validada, ao mais alto nível da magistratura da nação, o que disse publicamente na sessão de formação sobre a lei da nova contratação pública, ao senhor advogado que tinha colaborado na elaboração da lei e que respondera a uma pergunta minha: então, se é assim, obrigado, mas estou como a velhinha que está a ser ajudada pela nova lei, mas que não quer atravessar a rua, era por outro caminho que precisávamos de ir.
Se quiserem ouvir os técnicos, se o próprio Tribunal de Contas os quiser ouvir, em debate aberto e livre, será possível corrigir a lei.
O corolário do discurso do presidente foi desenvolvido depois por um senhor juiz que na televisão comentou o discurso: houve um chorrilho de disparates em leis importadas sem adaptação ao contexto nacional (finalmente explicou-se ao povo que os disparates da lei da reforma penal foram importadas a seco e a frio da Suíça); a solução agora é corrigir as leis mas simplificando o panorama legislativo para que os procedimentos judiciários não se atrasem.
Dir-se-ia que os senhores ministros que patrocinaram as leis das reformas, se estivessem minimamente ligados à realidade, nas prisões, na segurança de pessoas e bens, na sinistralidade rodoviária, nunca por nunca teriam proposto aquelas reformas, na educação, na administração interna, na saúde…
Como disse o juiz na televisão: mas não quiseram ouvir (de facto, o ruído feito pelos profissionais da comunicação social, a defender imprudentemente as reformas pelas reformas, independentemente dos contextos, foi enorme).
Tudo isto revela uma característica bem portuguesa, que é a de que pequenos grupos, com chefes com pouca visão integradora (com capacidade de compreensão pluri-disciplinar), podem criar uma doutrina que é imposta à maioria sem extrair desta as suas potencialidades de participação na construção das soluções.
Mas reconheço que nós, cidadãos pertencentes à maioria, precisamos de desenvolver as técnicas descritas na Sabedoria das Multidões, que nos permitiriam desenvolver mais trabalho de equipa.
É que o aumento do PIB também seria o resultado de conseguirmos trabalhar em equipa e não em árvore hierárquica inibidora das iniciativas e disseminadora “top down” de conceitos afastados do contexto real.
Para já, é positivo ouvir falar assim um presidente da república.
A ver se reagimos na direcção certa, sem que nos ajudem a atravessar uma rua que não queremos, nem é conveniente atravessar.
A ver.

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Mr President - Cut costs in the army, not in energy efficiency

Excuse me, sir, what I tell you.
Our budget, in our little country, is also affected by an huge indebtness and our government is cutting public expenditure, like yours.
Really, your GDP is very good, the biggest in the world.
US dollars 14 trillions (14x10E12) … not bad, compared with Portugal GDP, US dollars 220 billions (220x10E9) or 0.2 trillions...
You must teach us how to produce.
But you must excuse me again, it is a problem to solve these Wall Street guys.
Our bankers are also a problem, they don’t want that our government rises their taxes.
Another big problem: you must cut costs in army.
The best will be you accelerate Afganisthan withdraw, sincerely.
Cut costs with the army, but invest in energy efficiency, renewables, decarbonisation, safe nuclear, how to make synthetic fuel from coal and wood (ask your advisers to recover the Carter energy plan), and so on, and so on, that’s what is worth, believe and old man.
Best luck.

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Gestionarium XVII -Maria João Pires , ouçam também o que ela diz

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Quem diria, que no meio de uma entrevista de Maria João Pires surgia uma lição de gestão.
Disse ela, cito de cor, que o relacionamento com os directores de orquestra é, muitas vezes, difícil. Porque eles, coitados, têm muito a ideia de que têm de ser chefes, e isso de ter de ser chefe, de ser líder, é muito mau, estraga as coisas.
Mas há excepções, disse ela.
O que eu retiro daqui é que o conceito de chefe, nas empresas, tem de mudar.
Deve ser privilegiado o conceito de trabalho em equipa e a visão integrada das coisas, sem secretismos (pois, não pode o fagotista preocupar-se só com o seu instrumento; nem o macaco só com o seu galho, senão nunca mais desce da árvore)
Em suma, vejam o que diz a sabedoria das multidões.

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A General Electric

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A General Electric, nos anos 70, era o principal fabricante de radiotelefones portáteis e móveis para utilização industrial.
Ultrapassava a Motorola em volume de vendas, apesar desta ter tido o êxito de equipar os astronautas da Lua.
Bruscamente, no fim dos anos 70, o CEO Walker decidiu que o grupo devia desenvolver a componente financeira.
A divisão de radiotelefones foi extinta.
Mr Walker não é considerado, actualmente, tão bom gestor como os gurus da gestão o quiseram apresentar no seu tempo.
Tive a satisfação (isto de ir sobrevivendo às grandes transformações tem esta vantagem) de ver agora o actual CEO da GE a definir uma nova estratégia(mas tão velha, tão velha, vinda já do tempo do homo habilis, anterior ao homo sapiens) : privilegiar a produção de bens úteis que a GE nunca abandonou (geradores de energia eléctrica, locomotivas, turbinas para navios e para aviões, imagiologia médica) e desinvestir na componente financeira e de meios de comunicação social.
Isto é, estão a privilegiar o conteúdo e a utilidade e a subalternizar a imagem e a percepção “vendida”.
E estão a registar lucros , sem atingir o obsceno e sem fazer as tristes figuras da GM.
Aplausos.

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segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

A rede topológica do metro da Ciência


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Por uma curiosa coincidência, recebi este plano da rede de metro da ciência, no mesmo dia em que distribui as minhas modestas análises sobre os problemas topológicos das pontes de Koenigsberg e das redes de metro.
Será uma construção espanhola mas de uma universalidade a toda a prova, não proviesse do meu estimado colega que trabalha em Bruxelas na CE.
A Topologia é de facto uma grande ciência.
Mas temo que não baste aos planificadores de novas redes tocar a Topologia de ouvido.
Deve ser preciso também já ter viajado em várias destas linhas de metro.
Para, como diz o prof. Carvalho Rodrigues, “pôr a Ciência na equação”.
Caso vejam mal a imagem façam o favor de pesquisar em :

https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhlVLXcsosF5Q9kqBj1ffDyI40MXi9YqJ20bg7gVV6wAcbybvNgt89GU_Hah7K8aPC366jq2rnpQjejZUCS8IDBKFy4euz6mJkpN04E5k0lsmrnPrKNKTq2MMQMwgUhcdMRT8GikbPUEOo/s1600-h/metro-ciencia-g.jpg

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Economicómio XL - a estratégia da companhia aérea

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ENUNCIADO DO PROBLEMA:
Seja A uma dada companhia aérea e EA a sua estratégia, sintetizada nas seguintes orientações:
EA1 – maximizar as deslocações de turistas do exterior para o território nacional onde a companhia tem a sede
EA2 – maximizar as deslocações de emigrantes para o exterior
Seja MDA o multiplicador de divisas, contribuindo para o PIB, correspondente à geração de fluxos de capital do exterior para o território nacional
Seja RA o resultado da exploração da companhia A.
Seja B outra companhia aérea, com sede no mesmo país, com a seguinte estratégia EB:
EB1 – maximizar as deslocações de turistas do território nacional para o exterior
EB2 – maximizar as deslocações de imigrantes do exterior para o território nacional
Seja MDB o multiplicador de divisas, contribuindo para o PIB, correspondente à geração de fluxos de capital do exterior para o território nacional
Seja RB o resultado da exploração da companhia B.
As estratégias EA1 atraem divisas directamente para o turismo nacional; as estratégias EA2 geram divisas, indirectamente, através das remessas que os emigrantes enviam dos países onde se estabeleceram. MDA é assim positivo.
As estratégias EB 1 e 2 asseguram, pelo contrário, a exportação de divisas. MDB é, assim, negativo.
Graças à maior dimensão dos fluxos da companhia B relativamente à companhia A, RA é negativo e RB é positivo.
PEDIDO:
Assinale dentre as hipóteses seguintes a estratégia de prosseguimento mais correcta do ponto de vista do PIB nacional:
a) Fecho das companhias A e B
b) Fecho da companhia A e privatização da companhia B
c) Fecho da companhia B e fusão da companhia A com uma companhia de outro país cujas estratégias se assemelham a EB
d) Fecho da companhia B e fusão da companhia A com uma companhia de outro país cujas estratégias se assemelham a EA

Toda e qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência e não poderá ser utilizada como juízo de menos valor das capacidades gestionárias, seja de quem for e seja em que circunstância for.
Este problema é dedicado aos pilotos da TAP envolvidos na polémica da conversa no Facebook que não agradou à administração.
A dedicatória não é motivada por concordância com qualquer argumentação daquela conversa, mas apenas pelo reconhecimento do direito à expressão de opiniões que, embora me parecendo incorrectas, merecem ser expostas, se correspondem ao pensamento não constrangido dos seus autores (já Voltaire o dizia).
E também, votos de que o curso de ética promovido pela TAP corra bem, em ambiente aberto de discussão não constrangida.

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domingo, 24 de janeiro de 2010

Contra o secretismo

Felizmente não sou só eu que abomino o secretismo.
E ainda bem que entre outros que o abominam, que eu pouco importo, pelos vistos, estão pessoas como o Dr Fernando Pádua.
Com a devida vénia, repito aqui a ideia que nos transmitiu na sua entrevista ao DN: que os doentes fazem bem em se informarem na Internet sobre as doenças para, mais bem informados, poderem discuti-las com o médico.
E há 30 anos que o Dr Fernando Pádua faz por transmitir o máximo de informação, para grande contrariedade dos colegas que professam o secretismo e a exclusividade da informação.
É verdade que informação também é poder.
Por isso mesmo, que seja partilhada.
Aplausos.

Jean Simmons

Vi o filme Spartacus quando tinha 17 anos, no salão de uma coletividade de cultura e recreio, num verão algures na região da serra da Estrela, no princípio da década de 60.
A minha professora de História já me tinha dito como Spartacus ocupa um lugar importante na história da Humanidade.
Nos anos 50 e 60 foi possível criar obras de arte dedicadas à libertação da opressão. Parecia que a espécie humana estava bem encaminhada, estavam os Beatles quase a cantar “All you need is love” e o “Hair” a ajudar acabar com a guerra do Vietnam.
Primeiro apareceu o romance histórico, nos USA, quase ao mesmo tempo Aaron Khatchaturian, na URSS, compôs o bailado Spartacus.
E em 1960 Jean Simmons fez a escrava Frígia, contracenando com Spartacus, Kirk Douglas.
Jean Simmons morreu agora.
Foi muito bom vê-la.
Não percam o filme:
http://www.youtube.com/watch?v=mOCsNrzlV2k
, nem o adagio do bailado:
http://www.youtube.com/watch?v=86v05kSTZ3Y&feature=related

Rodoviarium XIII – A velocidade antes e após Elvas

Com a devida vénia, retransmito a informação dada pelo Dr João Salgueiro na sua entrevista ao DN de 2010-01-24.
Viajando por auto-estrada de Madrid para Lisboa, verificou que os automóveis de matrícula portuguesa deslocam-se em Espanha, duma maneira geral, a velocidades compatíveis com o código da estrada. De Elvas para Lisboa, diz João Salgueiro que os automobilistas portugueses se portam mal e desaparecem-lhe da vista.
Isto a propósito da dificuldade dos portugueses em cumprir regras e procedimentos.
Não quero armar em santarrão, até porque também ultrapasso o limite de 120 km/h. Mas os colegas de estrada exageram. E nas cidades ainda é pior. Parecem fiáveis os dados estatísticos que dizem que o número de passageiros de automóvel mortos em acidentes nas cidades diminui e o número de peões mortalmente atropelados aumenta. É muito forte a correlação entre o não cumprimento dos limites de velocidade nas cidades e o crescimento do número de atropelamentos mortais.
A velocidade máxima a que um condutor é capaz de pôr o seu carro a deslocar-se não devia ser nunca um critério para escolha do estado de movimento de um automóvel. Mas é isso que está inscrito no córtex de muitos condutores, configurando uma predisposição para homicídio involuntário, mas premeditado, uma vez que já foi disseminado que a probabilidade de sobrevivência de um peão atropelado a mais de 50 km/h é inferior a 5%.
E como ficam zangados comigo quando têm de seguir a 50 km/h atrás de mim…é nessas alturas que me lembro que não há um código da estrada económica para conter os ímpetos assassinos de Adam Smith.

sábado, 23 de janeiro de 2010

Educação IX - A produtividade no ensino

Seja um sistema de ensino A com 150.000 professores que produzem, cada professor, 20 horas por semana ao longo de 32 semanas.
A produção total do sistema é, assim, de:
150.000 x 20 x 32 = 96 milhões de horas por ano
(seria mais correcto considerar como produção o número de horas.aluno, mas simplifiquemos admitindo que todas as turmas têm o mesmo número de alunos ao longo do ano)
Considerando a produtividade de um factor de produção como um quociente entre a quantidade total produzida e a quantidade utilizada desse factor de produção, temos que a produtividade é de:
96.000.000 : 150.000 = 640 horas por ano por professor.

Seja agora um sistema de ensino B com 120.000 professores que produzem, cada professor, 24 horas por semana ao longo de 32 semanas.
A produção total do sistema é, assim, de:
120.000 x 24 x 32 = 92,16 milhões de horas por ano
E a produtividade foi de:
91.160.000 : 120.000 = 768 horas por ano por professor

Comparando A e B, no pressuposto de que o volume de alunos, o número de alunos por turma e a taxa de absentismo eram iguais em ambos os casos, temos que:
O sistema B tem menos 20% de professores que trabalham 20% mais do que no sistema A
O sistema A tem menor produtividade do que o sistema B.
No entanto, o sistema A produziu mais horas de aulas.

1ª conclusão: os alunos do sistema B, mais eficiente, tiveram menos aulas com professores que, individualmente, dão mais aulas.

Toda e qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência, até porque não disponho dos números reais e porque ninguém escolheria o sistema B, a menos que quisesse, cumulativamente:
- prejudicar economicamente os professores
- prejudicar a educação dos alunos
- agravar a criminalidade daí a uns anos, subsequente ao insucesso escolar

2ª conclusâo: desconfiem da próxima vez que um senhor, com estudos de economia, aparecer na televisão a dizer que do que o país precisa é de aumentar a produtividade; assim como assim, quando as variáveis são muitas, é fácil manipular os números…

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Gestionarium XVI – Ecce uxor , Ecce Homo e o Museu das Caldas

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O gestor
Devemos estudar as técnicas de gestão que vemos alcançar o sucesso.
Sucesso aqui significa que os gestores conseguiram o que queriam.
Mas devemos analisar se o que queriam era um objectivo de longo prazo, ou de curto prazo.
Por exemplo, a senhora ministra da cultura tem um objectivo de longo prazo: aumentar a eficiência económica dos seus museus, aumentando a oferta com o mesmo orçamento.
E tem um objectivo a curto prazo: substituir os directores de museus que são técnicos de museologia, por gestores.
Assim, o objectivo de longo prazo virá por acréscimo, crê a senhora ministra.
Este é um dos principais problemas de gestão que os decisores têm de resolver.
Dada uma fábrica, põe-se um engenheiro a governá-la ou um gestor?
Dado um hospital, põe-se um médico a governá-lo ou um gestor?
Dada uma escola, põe-se um professor a governá-la ou um gestor?
O termo governar, tirado da náutica, é apropriado. Porque na náutica traça-se uma rota estimada, entrando com as correntes, os ventos, a velocidade estimada. Vai-se navegando e vai-se comparando a rota real com a rota estimada. Não se traça um segmento de A a B. Não passe pela cabeça de ninguém que se pode navegar assim. Ou bate nas rochas, ou vai dar à praia, ou vai para o mar alto. O contexto não se adapta à vontade do gestor. É o decisor que tem de se adaptar às condições, e verificar se a sua estimativa está ou não a afastar-se da realidade.
Isto é, governar não é para gestores, porque gestores não sabem calcular a força dos ventos ou das correntes.
Dir-se-ia que, quando se pretende melhorar a eficiência económica de uma empresa, é uma boa solução pôr um bom gestor como assistente do diretor , o qual deverá ser um técnico, e não o contrário.
Pôr um gestor a governar os hospitais conduz à situação atual: são as melhorias espetaculares na eficácia dos tratamentos que compensam o abandono por médicos experientes do serviço público e as mortes nos hospitais por carência de meios humanos (informações que nos chegam do interior dos hospitais por pessoas que lá trabalham);
Pôr um gestor a governar as escolas conduz à situação atual: reforço do insucesso e abandono escolar, aumento da criminalidade, dificuldade de qualificação para o tipo viável de empregos;
Pôr um musico a governar o ministério da cultura parece ser uma boa ideia.
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Ecce uxor
Mas, ecce uxor (eis a mulher) : a senhora ministra é uma excelente pianista; mas agora é gestora e como tal se comporta. Agravante é o facto de achar que tudo tem de ser decidido por ela, que para isso foi escolhida por quem foi eleito. Agravante é também o facto de quem foi eleito andar arredio da problemática da cultura (o primeiro ministro do anterior governo afirmou isso publicamente, não vamos contrariá-lo).
Cultura, como se sabe, é o que pode fazer-se quando nos libertamos da obrigatoriedade de prover a subsistência.
É provável que quem governe ache que o objectivo da gestão dos museus é apresentar indicadores de eficiência económica.
É ainda natural que uma senhora pianista os ignore, porque música não é Ieronimus Bosch, embora se esperasse que por ser artista a sua sensibilidade a abrisse ao respeito pelos técnicos de museologia. Mas não nos esqueçamos de que oficiais superiores das SS também tocavam Beethoven (ver a história de Theresinstadt).
É pois natural que ache, que ignore os critérios de avaliação da qualidade do trabalho de uma equipa de especialistas em museus.
Como os gestores de uma empresa de transportes ignoram os critérios de avaliação da qualidade do trabalho de uma equipa de especialistas em transportes.
E então, como dizia José Régio na toada de Portalegre, a senhora ministra achou que o diretor do museu de arte antiga não tinha perfil ( quando roda o rosto de 90º deixa de se ver?) e de supetão lhe comunicou que no dia seguinte ia deixar de ser diretor do museu.
Tem o direito de o fazer (o cargo é automaticamente colocado à disposição do ministro sempre que o governo muda), mas disse o ex-diretor, por uma questão de cortesia profissional é costume falar destas coisas com calma, com os restantes membros da equipa, e estudar em conjunto uma transição. É costume, quando as pessoas são corteses. Quando não são, não é costume.
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Ecce homo
E ecce homo (eis o homem).
O novo diretor, vindo do Grão Vasco, assim foi apresentado, ecce homo (se forem ao museu de arte antiga, não vejam só o Bosch e o painel de S.Vicente, vejam também o Ecce homo e, claro, o resto).
É isso, temos homem, temos gestor com perfil.
“Esta é a ditosa pátria minha amada”, de quem Luis Vaz também disse “nesta apagada e vil tristeza”.
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O Museu das Caldas
E, para arrancar com a nova estratégia da rede de museus, a senhora ministra mandou retirar da rede o museu das Caldas da Rainha.
Tudo isto me faz lembrar a história do publicitário que há uns anos apresentou a sua campanha para anunciar a abertura das novas estações dos CTT na Pontinha e na Buraca que dizia: a Buraca e a Pontinha cresceram, cresceram, e os CTT tiveram de lhes dar condições para lhes satisfazer as necessidades.
Alguém também teve de chamar a atenção que não devem escrever-se estas coisas assim, e a campanha foi mudada.
Também a senhora ministra não devia ter mandado o museu das Caldas ser o primeiro a sair da rede dos museus. Chama muito a atenção a forma como o museu se retira da rede, tanto tempo em que esteve tão aconchegado nela.
A senhora ministra devia seguir uma regra preciosa de gestão que não segue: ouça primeiro as pessoas antes de decidir, ou melhor, decida com elas, leia a sabedoria das multidões, para não mandar retirar o museu das Caldas com toda a gente a ver.
Votos de felicidades para o ex-diretor, agora regressado ao museu do azulejo, ali na Madre de Deus, aonde eu ia todos os domingos ouvir a minha namorada no coro da igreja, acompanhado pelo órgão tocado pela senhora dona Guilhermina, com corais e missas de Bach, Teleman e Buxtehude, e que é um sítio maravilhoso, mesmo sem musica e sem a cortesia da senhora ministra.
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Economicómio XXXIX – A situação explosiva 2: a estatística dos bancos

Com a devida vénia, retiro do DN a seguinte informação:

Lucro dos 5 maiores bancos portugueses em:
2005 2.100 milhões de euros
2006 2.660 milhões de euros
2007 2.900 milhões de euros
2008 1.724 milhões de euros (em Setembro faliu o Lehman Bros)
2009 1.730 milhões de euros

Percentagem sobre os rendimentos dos 5 bancos principais sobre a qual foram cobrados impostos:
2005 11,7%
2006 19,4%
2007 14,5%
2008 12,8%
2009 9,9% (1º semestre)

Considerando que a minha ignorância em economia é extensa, ser-me-á perdoado que, olhando para este quadro, me ocorra imediatamente a conclusão de que o poder político está ao serviço do poder económico e uma sugestão para o nosso governo minimizar o risco de situação explosiva de que falava o nosso presidente: aumentar os impostos sobre os rendimentos dos bancos.
É verdade que isso trará o inconveniente de aumentar a quota do rendimento do trabalho relativamente ao do capital, o que não é dispiciendo numa economia dominada pelos adam smithistas, que dirão que assim os investidores fogem do país (para onde exactamente irão eles, sabendo-se que nos USA e na Holanda já o fizeram, aumentando nomeadamente os impostos sobre os depósitos nas “off-shores”?).
Mantenho a sugestão.
O FMI ficava mais descansado, que via os impostos aumentar e o defice a diminuir, e arranjava-se dinheiro para nacionalizar o BPN de acordo com o princípio nacionalizem-se os prejuízos para depois privatizarmos os benefícios.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

A Marinha Grande em 18 de Janeiro de 1934

Peço desculpa por comemorar assim a revolta da Marinha Grande. Não é bonito contar histórias de família, mas gosto muito desta história.
Um senhor jornalista do século, que militava no partido anarquista, decidiu juntar o trabalho ao prazer, desafiou a mulher e alugou logo de madrugada um táxi que o levou à Marinha Grande.
O burguês de Lisboa emocionou-se em contacto com as massas anarco-sindicalistas e comunistas que exprimiam muito claramente a sua oposição a Salazar, numa altura em que era viva a segunda republica espanhola (sabiam que a primeira republica espanhola viveu de Fevereiro a Dezembro de 1873?).
Mas o gauleiter de Leiria tinha experiencia militar e as forças da legião portuguesa acorreram triunfantes, nas suas camionetas de caixa aberta de recorte sinistro.
O jornalista, a mulher e o motorista de táxi retiraram para uma pequena povoação ali perto, na estrada para Leiria, Maceira Liz, onde funcionava a fábrica de cimento fundada pelo tio do senhor Champalimaud, que ainda não era o principal accionista porque o tio era vivo.
O tio, o senhor Henrique Sommer, cujo nome ficou mais conhecido pela disputa jurídica em torno da sua herança, de que saiu vencedor o senhor Champalimaud como “mais capaz” para a gerir, era um exemplo do capitalista esclarecido do princípio do século XX.
Na Maceira foram construídos alojamentos para todos os empregados, capela, posto de enfermagem, farmácia, cantina, estádio de futebol, campos de jogos e cinema.
Os bairros estavam organizados de acordo com o estatuto do funcionário, desde as casas modestas em banda para os trabalhadores de menor qualificação, passando pelas mais arrebicadinhas - também em banda, com duas colunatas e um pequeno telheiro à entrada, como Raul Lino gostava - para, por exemplo, a enfermeira-parteira, até ás moradias geminadas para os engenheiros - com telhados quase verticais de ardósia em estilo alsaciano, que o senhor Henrique Sommer era originário da Alsácia - e as 3 moradias isoladas para os directores.
E foi assim que, noite dentro, um vizinho delator – que, desgraçadamente, a delação é um hábito desagradável neste país - viu o jornalista, a mulher e o motorista de táxi a entrar na casa da enfermeira-parteira.
Telefonou ao pequeno gauleiter da terra e este ao gauleiter de Leiria que enviou um grupo de legionários armados a casa da enfermeira-parteira para prender os comunistas fugidos da Marinha Grande.
A enfermeira-parteira ficou brava e pôs os legionários na rua aos gritos. Que nunca se tinha metido em política nem nunca se iria meter (e nisso estava a dizer a verdade) e que parecia impossível já não poder receber em casa, em sossego, a própria irmã e o marido (o que também era verdade) que, coitados, estavam tão contrariados por o táxi ter tido uma avaria no caminho e por isso tinham chegado tão tarde (o que já não era verdade).
Deu-se a circunstância de, 11 anos depois destes sucessos, eu ter nascido numa daquelas casas geminadas de telhados negros quase verticais, ainda o meu pai não tinha sido posto na prateleira pelo senhor Champalimaud (mas com bom ordenado, que o senhor Campalimaud nisso não era sovina), por ter feito aquela rábula que se contava muito do senhor Champalimaud, que gostava que lhe aceitassem os convites imediatamente e o meu pai disse que ia pensar três dias.
E a enfermeira-parteira era a minha mãe.
Desculpem o sentimentalismo, que querem, uma pessoa não é de pau nem de ferro, e é uma maneira como qualquer outra de homenagear os revoltosos da Marinha Grande e os cidadãos e as cidadãs que querem trabalhar em paz e sossego.

As pontes de Koenigsberg ou um ponto de vista da Topologia no plano de expansão de uma rede de metro





As pontes de Koenigsberg

Koenigsberg já não vem assim no mapa. O nome agora é Kaliningrad e é a capital da região autónoma russa do Báltico.
Mas no tempo de Euler era Koenigsberg, e Euler gostava muito de passear pelas pontes da cidade.
Koenisberg estendia-se pelas duas margens do rio Pregel e por duas ilhas, ligadas por sete pontes.
Não era como Lisboa, que se acantona agora numa das margens, em vez de aglutinar as populações das duas margens, sem que os edis eleitos tenham a lucidez de inscrever a agregação dos mini-municípios no seu plano de estratégias.
Muito menos, nem eles nem os detentores das melhores soluções da RAVE, terão a coragem de pensar em duas ilhas como em Koenigsberg. Artificiais no caso do Tejo, para facilitar a construção de pontes ou túneis (a técnica dinamarquesa para ultrapassar o Báltico) mas conjugando-a com o fecho da Golada para controle do assoreamento.
Euler magicou, nos seus passeios e em casa também quando os netos lhe saltavam para o colo, que ele estava sempre a magicar em problemas matemáticos, como poderia traduzir numa expressão matemática as condições em que era possível percorrer as sete pontes de Koenigsberg sem passar duas vezes pela mesma ponte.
A expressão que encontrou não era muito complicada, ao menos depois de Euler a encontrar, e constitui o primeiro teorema topológico.

O primeiro teorema da Topologia

Se quiserem reparar nas imagens a seguir aos diagramas da rede Metro, B e C são as duas margens e A e D são as duas ilhas. Temos 4 nós, 7 ligações (ou pontes) e 4 áreas delimitadas. O teorema diz que será sempre
nºnós – nºligações + nºáreas = 1

e como corolário, que a condição para que seja possível partir de um ponto e voltar a ele passando apenas uma vez por cada uma das pontes, é que em cada nó o número de linhas convergentes seja sempre par.
O que não se verificava em Koenigsberg, condenando ao fracasso toda as tentativas dos cidadãos ingénuos que matavam a cabeça com a hipótese.
Esta evocação dos inícios da topologia, estudo das propriedades das redes que não mudam quando os seus elementos são sujeitos a deformação contínua, serve para recordar isto mesmo, que as redes de metropolitano ou de qualquer sistema de transportes urbanos são redes topológicas.
Bom, dentro de certos limites, claro. Podemos dizer aos futuros turistas que chegarem ao desejadamente efémero aeroporto da Portela, efémero depois da almejada chegada do metropolitano ao dito aeroporto, que têm à sua disposição uma linha, um segmento de reta, que os levará ao “downtown”. Não precisamos de lhes dizer que vão na direção Nascente e depois de Nascente para Poente até terem de mudar de linha para o sul, para o “downtown”. Na verdade, acho que estamos a enganar o turista.
Mas também, o “downtown” é para desertificar e os hotéis, nesta Lisboa em que eles crescem como cogumelos, que se distribuam ao longo da sonhada linha vermelha. Sonhada às voltas em “V” por toda a Lisboa, no estranho plano de expansão que o nosso governo divulgou em Agosto do ano 2009, e que parece agora querer reformular.

Podemos também dizer que os problemas topológicos são complicados e que é de recomendar prudência aos cidadãos que sejam incumbidos de projectar planos de redes de transportes ou das suas expansões. Que não se deixem tentar pela ingenuidade dos cidadãos de Koenigsberg, que ainda hoje andariam à procura da solução impossível se Euler não tivesse existido.
Foi por causa deste plano de expansão, e deste risco de submersão no mar da ingenuidade, que eu invoquei a topologia.

O plano de expansão da rede do metropolitano de Lisboa de Agosto de 2009

Consideremos os diagramas da rede de metro que encimam este modesto blogue. O plano de expansão apresentado pelo MOPTC é a segunda imagem. Como terá nascido este plano? Uma linha circular, fechada sobre si própria no “miolo” da cidade e, sobreposto, um “V” deitado a atravessar por duas vezes a cidade, uma ligação radial de Santa Apolónia à periférica Amadora e Hospital, e a “antena periférica” para Odivelas. Eu não devia escrever “periférica”, porque a Amadora e Odivelas deveriam ser municípios integrantes do grande município de Lisboa, como em Londres, mas estamos em Portugal e temos dificuldade de trabalhar em equipa (recordo um ex-ministro que saiu da vida política formal para ganhar a vida no mundo empresarial e que definiu, ainda ministro, como estratégia essencial, a agregação de municípios, não a desagregação).
Este plano constitui uma alteração da estratégia de oferta de transporte e de expansão da rede. Mais uma alteração (a decisão de levar a linha amarela para Odivelas, em vez de a levar a Moscavide, no princípio dos anos 90, e a construção da linha vermelha para servir a Expo98 já servida pela linha suburbana da CP, constituiu a alteração do conceito desta linha como transversal; gostamos em Portugal de zig-zaguear).
Na primeira imagem, mostra-se o diagrama da rede baseado no plano do MOPTC, mas com algumas adaptações que traduziriam as expansões de acordo com a estratégia habitual. Reparem que evita, por exemplo, gastar dinheiro com a construção de uma estação entre Alvalade e Campo Grande, a que acresceria os gastos adicionais de energia devidos a mais uma paragem na linha.
Evita também os gastos adicionais de conversão de duas linhas numa linha circular fechada.
A estratégia básica da rede do metropolitano de Lisboa consistia, até agora, no conceito de linhas radiais cruzadas por uma linha transversal em arco dum sector circular não fechado e eventual construção de mais linhas transversais de raio crescente e concêntricas; em complemento, se o futuro fosse radioso, radiais de atravessamento do Tejo (Santos-Cacilhas, por exemplo, pelo caminho mais curto, como ensinava Vitruvius).
Observe-se que este conceito coincide com o do plano director da cidade: 1ª circular rodoviária - Av.Berna; 2ª circular – Av.Gen.Norton de Matos; 3ª circular - a CRIL, 4ª circular - a CREL.
Bruscamente, no Verão passado, é distribuído à população o conceito da linha circular fechada sobre si própria, longe dos limites do município restrito de Lisboa, portanto demasiado próxima do centro geográfico da cidade, como se fosse a linha distribuidora do tráfego na Baixa da cidade pelas linhas que a atravessarem.
Embora a justificação apresentada fosse o falso argumento de que a maioria das deslocações se fazem segundo o traçado dessa nova linha circular.
Digo falso porque não há inquéritos confiáveis de origem-destino (a informação recolhida da rede de canais de acesso por cartão sem contacto é insuficiente por não poder considerar as entradas fraudulentas, as entradas quando fora de serviço e porque fora dos eixos servidos as deslocações em Lisboa são difíceis, isto é, as linhas existentes constituem oferta rígida sem alternativa) e porque a estrutura habitação-emprego está gravemente deformada (desertificação, instabilidade da fixação das actividades secundárias e terciárias, degradação dos edifícios)

A terceira travessia do Tejo

E como se articula a rede expandida do metropolitano com as linhas suburbanas?
Não se articula.
E essa desarticulação ajuda a ver melhor o risco da solução da linha circular fechada.
A RAVE aguardará a conclusão dos seus estudos de traçado da linha suburbana que há-de vir do novo aeroporto de Alcochete os quais nunca deveriam ser desenvolvidos sem integrar as problemáticas das redes do metropolitano e de autocarros e eléctricos (agora pomposamente chamados de metro ligeiro de superfície), para convocar um programa de televisão do tipo “Prós e contras”.
O porta voz da RAVE demonstrará nesse programa, com enfado, acompanhado por dois ou três projectistas de obras de arte (pontes e viadutos), a excelência das soluções que encontraram, mesmo sem consultar os pareceres técnicos dos técnicos das especialidades que não são as dos técnicos que a RAVE tenha contratado.
E dirá mais uma vez que qualquer oposição irá comprometer o planeamento.
Não será a força dos argumentos. Será apenas a força do mais forte, e o subterfúgio do facto consumado.
E contudo, como dizia Galileu, nós, insignificantes técnicos que trabalhamos em transportes (ou pomos ao dispor das estruturas decisórias das nossas empresas as nossas poucas capacidades de trabalho) ainda não sabemos onde os decisores da RAVE se vão dignar implantar a estação de correspondência da linha suburbana que fará a terceira travessia do Tejo com a rede do metropolitano e de autocarros.
É apenas mais um exemplo da incapacidade de planificação colectiva no nosso país (para o diagnóstico e hipóteses de tratamento, mais uma vez recomendo a leitura do “Sabedoria das multidões”).

Alcântara

A REFER dirá que vai fazer uma estação subterrânea no nó de Alcântara, em simultâneo com o desnivelamento que a Liscont fará para os seus comboios. Mas a estação de Alcântara é de construção muito cara porque os terrenos são de aluvião e aterro. Possivelmente pensarão melhor e desistirão da obra.
Entretanto os comboios da Liscont e da linha do Estoril saturarão a linha da cintura apesar de quadruplicada. Pela linha da cintura, vocacionada para o serviço suburbano, já passam os comboios interurbanos e os comboios de mercadorias, e qualquer linha necessita dum período de calmaria para a manutenção (não mandem fazer manutenção com os comboios a passar, por favor).
Reparem que enviando os comboios do Estoril à linha da cintura estão a pedir a linhas suburbanas que façam serviço urbano. Exemplo acabado de descoordenação de planeamento e de falta de integração dos modos de transporte. Ou talvez integração à portuguesa, despejando ingenuamente várias linhas sobre a linha da cintura.
Tal como no caso das condutas de água, se várias condutas debitarem o seu caudal para uma única conduta, esta entope, obrigando a reduzir o caudal.
No caso dos comboios, 20 comboios por hora numa linha comum significa 1 comboio de 3 em 3 minutos; se 4 linhas convergiram nessa linha comum, temos que, num dado sentido, só podem 5 comboios por hora, ou 1 comboio de 12 em 12 minutos; e basta uma pequena perturbação na linha comum para perturbar todas as 4 linhas. É por isso que as linhas suburbanas do RER de Paris são independentes uma das outras.
Pareceria mais equilibrado que fosse uma linha urbana, de metro, portanto, que fosse a Alcântara, buscar os passageiros da linha do Estoril, em estação de correspondência em viaduto, para economizar na construção e na energia de operação (uma estação subterrânea implica um declive de 4% até à Estrela ou as Amoreiras, implicando maior consumo de energia do que com a estação em viaduto). Qual é o argumento para levar os comboios da linha do Estoril à linha da cintura? A comodidade de evitar ao passageiro a mudança em estações de correspondência.

As vantagens e as desvantagens da linha circular fechada ou a comodidade de evitar a correspondência versus a incomodidade das perturbações da linha

A comodidade de evitar a correspondencia é um argumento interessante numa rede topológica. Reflecte um pensamento rígido, de quem definiu deslocações padrão para os passageiros e os quer ver a percorrer esse percurso.
É o oposto de uma rede flexível, cheia de nós de correspondência que permitem, e este é um argumento que os planeadores que nunca tiveram experiência de manutenção ou de exploração de redes têm muita, muita dificuldade em compreender, uma alternativa de percurso quando o outro bloqueou.
Uma rede de transportes urbanos não deve ser constituída por linhas únicas. Devem permitir percursos alternativos.
Alcântara, por exemplo, deve ser um nó de correspondência (estendendo a noção de nó ao Alvito, para correspondência com os suburbanos da margem sul do Fogueteiro e Setubal)
E este é o principal argumento contra a ideia das linhas circulares fechadas. São extremamente sensíveis a perturbações, que se propagam por toda ela, mesmo que existam dispositivos de emergência para exploração parcial em caso de perturbação em parte da linha circular.
Vamos tentar explicitar a questão: se numa linha de metro tivermos uma perturbação do tipo excesso de afluência de passageiros (um ligeiro atraso de um comboio com a subsequente acumulação de passageiros no cais, por exemplo), toda a linha sofrerá perturbações porque uma linha de comboio é um circuito série.
Se a perturbação for devida a uma avaria, a experiencia diz que, em média, são necessários 10 minutos para avaliar com um mínimo de segurança a origem da avaria e o tempo necessário para a reposição da exploração ou o accionamento do dispositivo de emergência para exploração parcial da linha. Felizmente, na maior parte dos casos a origem da perturbação não é grave e é susceptível de recuperação.
Entendamo-nos sobre os 10 minutos.
10 minutos é um valor que já nos faz encolher os ombros sem benevolência numa viagem de 300 km, porque o pendolino rápido se atrasou, de Faro a Lisboa, 10 minutos à espera de vez no carrocel da linha suburbana do Fogueteiro e Setúbal (lá está, uma linha de comboio é um circuito série, um de cada vez, e o modo interurbano não deveria partilhar com o suburbano a mesma infraestrutura).
10 minutos numa linha urbana é um atraso grave. Se a economia de uma cidade metropolitana está sã, na hora de ponta é exigível um serviço com um intervalo de 2 minutos entre comboios. 10 minutos de perturbação significa 5 comboios parados, distribuidos ao longo da linha (por razões de segurança de circulação, os comboios não devem aproximar-se uns dos outros, com os passageiros dentro, em nenhuma circunstância) . E 5 comboios podem significar 4500 a 5000 pessoas, 10 minutos paradas, à espera…porque os decisores que não andam de metropolitano, nem exploraram linhas de metropolitano, nem mantiveram linhas de metropolitano, podem ter decidido que entre os pontos A e B haveria apenas uma linha circular fechada, e não duas linhas independentes, integradas numa rede malhada com percursos alternativos.
Isto é, dum lado a comodidade dos que fazem o percurso de um arco de 270º ao longo de uma linha circular. (Pensemos nisto: o percurso médio por passageiro na rede do metropolitano de Lisboa é actualmente de cerca de 4 km; mesmo admitindo que suba para 5 km, não será demasiado pequena para ser circular, uma linha circular definida pela distancia entre os pontos mais afastados inferior a 6 km?)
Do outro lado, a incomodidade de quem, num percurso inferior a 180º, sofre as consequências da avaria que ocorreu nos restantes 180º.

Recomendações para evitar perturbações na exploração

Em resumo, para nos imunizarmos às perturbações de exploração,
- criemos o maior número possível de percursos alternativos com uma rede
malhada
- autonomizemos as linhas, evitando a convergência de linhas numa linha
comum e evitando bifurcações
- evitemos a partilha da mesma infraestrutura por modos de transporte
diferentes (o pendolino numa linha, o suburbano noutra; quanto
às mercadorias, não esquecer que a noite é precisa para a
manutenção; o metro, mesmo que seja ligeiro de superfície, deve
seguir numa linha segregada, não partilhada com o modo
rodoviário; recorrer aos viadutos)
- criemos nós de correspondência do metropolitano, quer entre linhas do
metropolitano, quer com os outros modos (comboios de longo
curso,suburbanos, autocarros, transporte individual ou “park and
ride”)

Deve dizer-se que uma vantagem importante de uma linha circular é a de que, entre os pontos A e B, comparada com 2 linhas independentes entre os mesmos pontos, necessita de menos 4 comboios para assegurar o mesmo serviço em via dupla (Para intervalos curtos ente comboios, existe a necessidade de um comboio em cada término em manobra de inversão). Mas essa vantagem económica diminui em valor relativo à medida que aumenta a distância entre os pontos A e B (por exigir maior número de comboios em linha). Além de que o custo dos 4 comboios é inferior ao custo das obras, no metropolitano de Lisboa, para transformação das duas linhas independentes actuais na linha circular pretendida, nos troços existentes que carecem de intervenção para isso (zona dos viadutos do Campo Grande).

Manual do projectista de novas linhas de metropolitano preocupado com a eficiência energética

Dado o contexto de preocupação em que vivemos, em evitar o desperdício de energia com o transporte individual, importa também que o transporte colectivo seja exemplar em eficiência energética.
Para esse objectivo, há umas regras simples que o projectista de novos traçados de metropolitano pode e deve seguir:
- minimizar os desníveis entre as estações
- sempre que possível, colocar a estação a uma cota superior à linha (facilita os arranques e as travagens)
- privilegiar os percursos à superfície, recorrendo a viadutos, quer para a linha quer para as estações (economia de construção e de energia de ventilação)
- evitar estações profundas e minimizar o volume de construção das estações, especialmente se se tratar de estações de correspondência, cujos percursos devem ser reduzidos ao mínimo possível(gastam mais energia de ventilação e em escadas mecânicas)
- evitar curvas de pequeno raio (oferecem maior resistência ao movimento)
- preferir túneis duplos a simples (aqueles oferecem menos resistência ao
movimento)
- evitar sempre que possível inter-estações inferiores a 900 m (o consumo de
energia depende do número de paragens e arranques)
- aproveitar as coberturas das estações e linhas à superfície para instalação de
paineis fotovoltaicos
- utilizar redes de energia e comboios com travagem por recuperação, condução
automática e dispositivos de economia energética embarcados e nas
instalações fixas (supercondensadores e “free-wheels”)
- para reduzir o transporte individual no interior da cidade e assim diminuir o
consumo geral de energia, aumentar o número de nós de correspondência
com o modo suburbano e construir parques de estacionamento do
tipo “park and ride”


E ainda o plano de expansão do metropolitano. Três críticas

Proponho três críticas principais ao plano de expansão apresentado pelo anterior governo em Agosto de 2009:
1 – converter a linha verde existente e parte da linha amarela numa linha circular envolve dificuldades construtivas e custos elevadissimos, nomeadamente na ligação a executar entre as duas linhas nos viadutos do Campo Grande e na construção de um término novo para a extensão que já existe do Campo Grande a Odivelas; em consequência da complexidade construtiva, seria enorme e prolongada a perturbação do serviço no resto da rede que pudesse funcionar;
1.1 – se a ligação entre as duas linhas for feita a nascente da estação Campo Grande, terá de se construir um novo troço de viaduto e reperfilar a Rua Agostinho da Silva; construir um novo término subterrâneo para a linha Campo Grande-Odivelas; construir uma nova ligação entre a actual linha verde, no lado sul da estação Campo Grande, e o viaduto de acesso ao parque de material e oficinas PMOII, para prolongamento até ao aeroporto e ligação à linha vermelha;
1.2 – se a ligação entre as duas linhas for a Poente, terão de se ultrapassar os parâmetros limite de comodidade e segurança para a via férrea nas novas ligações entre a linha do lado sul da estação e a linha para a Cidade Universitária; neste caso, o término da linha Campo Grande-Odivelas pode manter-se no lado norte da estação, mas a ligação à linha vermelha, de Telheiras ao aeroporto, obrigará a um novo troço de linha que poderá passar em viaduto sobre a estação ou derivar em viaduto (com construção de novos cais com ligação pedonal à estação de campo Grande) para junto da segunda circular, acompanhando esta até ao aeroporto;
2 – complexidade construtiva semelhante se verificará na estação Pontinha com a ligação da linha vermelha à extensão Pontinha-Amadora, obrigando à construção de novos cais de correspondência com a estação actual e à demolição de extensa porção do túnel existente na saída de Pontinha para Alfornelos;
3 – a tentação de servir mais áreas com o recurso a “bifurcações” é grande, mas deverá ser vencida; na prática, os aparelhos de via provocam, em caso de avaria, perturbações que se repercutem no resto da linha; sempre que possível, as áreas que se pretendem servir devem sê-lo por linhas independentes com percursos de correspondência optimizados, isto é, reduzidos ao mínimo (as actuais estações de correspondência do metropolitano não são referências do que deve ser feito)


Estratégia antiga, estratégia nova para a expansão do metropolitano

Mas voltemos ao plano de expansão da rede de metropolitano divulgada em Agosto de 2009, tentando analisar algumas implicações das declarações do novo governo, no sentido de limitar a expansão da rede do metropolitano de Lisboa apenas ao interior do perímetro do município.

A estratégia anterior do metropolitano consistia em ir buscar passageiros aos municípios limítrofes. Perante o argumento do novo governo de que os troços mais carregados são os do centro, poderia ponderar-se que o reduzido número de percursos possíveis (isto é, o reduzido número de linhas existentes) e a desastrosa situação urbanística da cidade fora dos eixos principais e na própria baixa, pode conduzir a conclusões ilusórias das estatísticas disponíveis, resultantes do sistema dos canais de acesso sem contacto.
Se os troços estão desigualmente carregados, isso significará que a área metropolitana tem áreas rarefeitas ao longo dos eixos principais. O que é um pouco estranho, porque se assiste à desertificação da baixa e à deslocação das empresas para a periferia do município; porque se assiste à saída de muitas pessoas que vêm de fora e que abandonam o comboio antes da baixa.
Essa falta de homogeneidade deveria ser eliminada por políticas de reurbanização , de reabilitação urbana, de fixação na baixa das pessoas e das empresas e, claro, nas tais áreas rarefeitas (deuses, o tempo que isso vai exigir…quando pensamos nos anos que foram precisos para desenvolver a alta de Lisboa) e noutras áreas rarefeitas, fora dos eixos principais mas perto do Tejo (entre Alfama e a Expo existem zonas por urbanizar…).
Dir-se-ia que há sinais contraditórios e que a opção de mudar a estratégia para privilegiar a expansão da rede do metropolitano no centro da cidade pode basear-se nos sinais erróneos.
Puo darse, como diriam os italianos.
Será mais certo, porém, dizer que a nova estratégia do novo governo será a de fazer das novas linhas de metropolitano um factor reestruturante da cidade. As expansões irão estimular a valorização dos bairros que servirão.
Teoricamente é verdade. Uma boa linha para uma zona central de uma cidade facilita o acesso aos locais de emprego dessa zona (o problema é que a nossa baixa está a ser abandonada, como é o caso dos tribunais que fugiram para a Expo, mais a esquadra da polícia da rua Capelo…) e, consequentemente, deveria baixar o preço das habitações na zona central, exactamente porque, facilitando o acesso a partir da zona excêntrica servida pela linha, tenderá a aumentar a procura para fora do centro e a diminuir a procura no centro (o problema é que as pessoas fogem da baixa porque não têm onde estacionar o carro e porque as casas não são famosas em termos de conservação).
Por outro lado, a experiencia também já foi feita: a linha vermelha tem, junto das suas estações, habitações a preços baixos relativamente aos preços de zonas excêntricas; porque a procura é baixa por razões de urbanismo.
Dir-se-ia portanto que pode ser arriscado concentrar na função reestruturante a fundamentação duma expansão de rede de metro.


Conclusão

Seria talvez preferível encarar tudo isto de uma forma integrada, isto é, toda a estratégia de desenvolvimento do município, os seus planos de urbanização, as suas matrizes de fixação de empresas (sector terciário mas também secundário) e de habitantes, os seus planos de reordenamento da zona portuária e das margens norte e sul, os seus esquemas de ligação à margem sul (é certo que, tomando os exemplos de qualquer cidade evoluída, se não houvesse constrangimentos financeiros pelo menos duas ligações por metropolitano em túnel à margem sul estariam fundamentadas), de penetração rodoviária, de reformulação dos eixos suburbanos, as suas políticas de coordenação com os municípios limítrofes (estamos longe da ideia de grande município, não é?).

Mas quem o fizer, se o fizer - que desenvolver uma estratégia para a área metropolitana de Lisboa é uma tarefa complexa que exige uma equipa pluri-disciplinar diversificada, com espírito de equipa (o que não quer dizer consensual), que não sofra da síndroma da revelação só acessível a uns poucos, que se abra e discuta as soluções antes dos momentos de decisão irreversível (será a nova estrutura anunciada pelo novo governo? separada do próprio metropolitano de Lisboa - que é onde reside agora o “know-how”-, separada da autoridade metropolitana de transportes – que tem as suas funções bem definidas)- deve estar precavido contra a ingenuidade dos habitantes de Koenigsberg e aprender, ou rever, rapidamente, umas noções básicas de Topologia, embora a Topologia seja como a música - pode-se tocar pela partitura, mas se não se tiver ouvido, é difícil.

sábado, 16 de janeiro de 2010

Gestionarium XV – as medalhas, as estatísticas e os inquéritos de satisfação do cliente

Com a devida vénia, cito o DN e o seu cronista.
Roger Day, um senhor de 62 anos que participava nos desfiles de veteranos das forças armadas britânicas, foi julgado e condenado por usar medalhas falsas sem jamais ter participado nas lutas directas em que o exército de sua majestade britânica se compraz em envolver (guerras do golfo, Iraque, Afeganistão, etc).
Ocorre-me de repente que as semelhanças são capazes de ser grandes com aqueles técnicos da nossas empresas de transportes que exibem orgulhosos as estatísticas com os êxitos da sua gestão, saídas, as estatísticas, de programas (software) de tratamento de ocorrências, disfarçadas as ocorrências e a sua gravidade nos meandros das estatísticas, ou os resultados de inquéritos de satisfação do cliente.
Recebi ontem um inquérito de satisfação do cliente do senhor director geral das contribuições e impostos. Não é brincadeira, recebi mesmo. Espera o senhor director geral que eu seja complacente. Assim se chegará a um resultado de que possa orgulhar-se. Mas se não for complacente, alguém dentro daquela estrutura, mais directamente ligado às lutas na frente de trabalho, vai estudar as razões e as circunstâncias das falhas e propor soluções?
Infelizmente, a experiencia na minha empresa (minha no sentido de ser a empresa em que ponho ao dispor da estrutura gestionária da empresa as minhas parcas capacidades) diz-me que raramente isso acontece. Quantas vezes andei à procura pelos tais programas (software) de comunicação e arquivo da empresa onde andava a reclamação que o cliente enviou ao provedor e o provedor remeteu sabia-se lá para quem, sem fazer a mínima ideia de quem podia resolver o problema…
Por isso achei que o senhor Roger Day é um paradigma dos nossos técnicos que cultivam a imagem mais do que a realidade próxima, dos tais clientes.
Embora o senhor Day tenha a desculpa de que o que fez, o fez para conquistar e manter a estima de uma moça 27 anos mais nova do que ele…

Concerto na Sé


Eu, ateu impenitente

Venho pelo presente agradecer ao patriarcado de Lisboa o concerto de órgão e coral de Ano Novo, na Sé de Lisboa, em 9 de Janeiro de 2010 (repetido na Sé de Évora e no Porto).
Musica de órgão de Buxtehude por João Vaz e musica religiosa vocal de frei Fernando de Almeida pela Capella Patriarchal (coro de câmara, com 2 sopranos, 2 mezzo-sopranos/contraltos, 2 tenores, 2 baritonos/baixos, todos jovens) com acompanhamento de órgão.
Frei Fernando compôs em Portugal entre 1640 e 1660 musica de grande qualidade (engraçado como o senhor D.João IV, sempre que podia, fugia às questões políticas e ao confronto com a sua insuportável rainha, a andaluza Luísa de Guzman, que achava que mais valia ser rainha por um dia que duquesa toda a vida, e se dedicava à música e a apoiar os músicos).
Estava cheia, a Sé; não há dúvida, há gente para tudo.
Por mais esforçadas que sejam as forças obscurantistas, por mais eficazes que sejam as medidas que afectam a educação das novas gerações, e as que fazem prevalecer os critérios económicos sobre os critérios artísticos (valha a verdade que cultura, em definição coloquial, é quando a pessoa não precisa de se preocupar muito com a obtenção dos factores de subsistência, o que, não coloquialmente, nos conduzirá à eterna discussão das formas de organização da sociedade), e as que encaminham grande parte dos jovens para a criminalidade e a marginalidade,ou voltam as costas sem querer ver, por mais esforçadas que sejam essas forças, dizia eu, é também possível ver e ouvir vozes jovens a cantar tão bem naquele espaço bonito.
Já que a santa madre igreja católica apostólica e romana (SMICAR) é acusada de violentar consciências, ao menos que nos ofereça concertos assim. Agradecido.