quarta-feira, 30 de novembro de 2011

O peso do estado

A tendencia de simplificação de que as pessoas sofrem põe dum lado o "tea party" e os neo-liberais europeus que defendem a minimização do estado e, do outro, os sistemas assistenciais.
O "tea party" abandona à sua sorte os "loosers", que não souberam triunfar, e corre sérios riscos de aumento da criminalidade e de epidemias por falta de assistencia médica.
Os sistemas assistenciais tentam repartir para assegurar o direito ao bem estar, à educação, à saúde  e à segurança social, mas o poder económico e financeiro dificulta a formação e o acesso às mais valias para repartição.
Neste impasse que se vai vivendo, de que um bom exemplo é a luta por uma política de emprego entre o presidente Obama e o congresso hostil, vejamos o peso do estado, expresso na despesa publica em percentagem do PIB, conforme gráfico do Expresso de 29 de novembro de 2011:


Verifica-se que Portugal está abaixo das despesas publicas da França ou da Finlandia.
Se imaginarmos que as despesas são realizadas em França e na Finladia com um rendimento (quociente entre o dinheiro investido diminuido do desperdício, e o dinheiro investido) de 90%, e em Portugal com um rendimento de 70%, obtêm-se as barras a branco no segundo gráfico, para o valor do dinheiro investido diminuido do desperdício.



Esta é a famosa questão da produtividade.
Seria aqui que se deveria centrar a ação, na diminuição do desperdício na despesa publica e no aumento da eficiencia dos dinheiros publicos.
Mas não, os cortes na despesa pública são preferencialmente cegos e em valor absoluto.
Salvo melhor opinião, isso contribui para agravar o desperdício (afastamento do ponto de rendimento ótimo) e os resultados obtidos.
Talvez nem se deva culpar a  troica, com o seu preconceito de que os trabalhadores portugueses têm salários  elevados para o que produzem e portanto devem ser baixados para ficarem ao nível dos paises do antigo bloco de leste. E que o numero de funcionários públicos é exagerado. 700.000 numa população ativa de 5.500.000 é exagerado? sendo 280.000 professores e médicos?!.
Pior que os senhores da troica será quem, de Portugal,  lhes dá a informação, porque a dão distorcida e tendenciosa.

Aguardemos a influencia dos cortes em indicadores como a mortalidade infantil, a longevidade, o insucesso escolar, o indice de bem-estar, e o coeficiente de Gini.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Falas de governantes - as regalias, benesses e mordomias

Confesso que preferia ler o senhor ministro da economia e dos transportes no seu blogue Desmitos, antes da sua nomeação.
Este excerto de abril de 2011:
 "Ajudam-se os bancos alemães e franceses (e espanhóis, no nosso caso) a evitarem as consequências mais danosas de uma excessiva exposição aos activos tóxicos das dívidas públicas dos países da periferia europeia, enquanto as populações destes países europeus têm de suportar o custo total da desmesurada expansão do crédito que caracterizou a última década. Com amigos assim, quem precisa de diabolizar o FMI?
Este é exactamente um dos temas de hoje do Wall Street Journal, que em mais um artigo arrasador para o nosso país (um país de trabalhadores "under-educated" e "under-trained")..."

pode ser lido em :
http://desmitos.blogspot.com/2011/04/com-amigos-como-estes-quem-precisa-do.html

Embora discordando de muita da argumentação do senhor ministro no seu blogue, julgo que a sua leitura é instrutiva.
Coisa que não posso dizer das suas intervenções que vejo reproduzidas na comunicação social.
Especialmente pela forma como fala.
Estranho, como no blogue o seu discurso era (era, porque desde junho de 2011 que não publica) calmo, cordato e didático.
E agora, nas suas intervenções, está tenso, é agressivo, professoral, relapso perante a informação contraditória.
Por exemplo, volta-se para os senhores deputados e pergunta: "Acham bem que as irmãs solteiras dos funcionários da CP viajem de graça?"

Não sei se consigo responder à pergunta, dadas as minhas limitações, mas vou tentar, em intenção do senhor ministro.

Há muitos, muitos anos, mas já depois da fusão das empresas de transporte ferroviário (foi, a CP resultou de uma fusão de várias companhias; no domínio dos transportes e das energias a centralização tem algumas vantagens sobre a dispersão), e numa altura em que as comunicações rodoviárias eram rudimentares, era difícil , por razões de equilíbrio da despesa pública, atrair bons técnicos ao serviço ferroviário.
Para compensar o baixo salário, entre outras agora chamadas regalias, benesses ou mordomias, a CP ofereceu passagens gratuitas (e em primeira classe, numa altura em que havia carruagens de terceira classe, de bancos corridos de pau) aos seus funcionários e familiares.
Visto de outra perspetiva, a CP estava a poupar nas despesas de pessoal, incluindo nas futuras pensões de reforma.
O que certamente agradaria ao senhor ministro.
Passaram os anos e é natural, por razões inerciais, que as "regalias" fossem sendo deixadas.
Por exemplo, anos antes de eu entrar para o metropolitano, era tradição os seus técnicos não trabalharem em exclusividade.
Muitos dos meus antecessores trabalhavam, por vezes na zona da fronteira do desejável, em gabinetes de projeto que prestavam serviços ao metropolitano.
A alta direção da empresa tolerava o facto porque assim podia pagar menos aos seus funcionários e podia garantir a sua qualidade.
A coisa foi-se compondo e, quando comecei a trabalhar, a não exclusividade já não era bem vista, dados os possiveis conflitos de interesses, tirando o caso dos colegas que mantinham uma atividade como professores.
No entanto, era o tempo em que nas empresas privadas se ganhava , a todos os niveis, cerca de 50%  mais do que nas empresas e funcionalismo publicos.
Mas voltando à CP, há sempre uma grande inércia que se opõe à mudança das coisas.
E isso até nem é muito mau, porque permite aos sistemas uma certa segurança e resistencia às medidas fraturantes impostas de supetão por jovens seguros de si mas pouco experientes no negócio.
De modo que chegamos assim à atualidade com disposições e expedientes que originalmente eram economizadores e que agora são considerados regalias.
Porquê?
Porque aconteceu aquele fenómeno de crescimento mais acentuado dos salários das empresas públicas relativamente aos salários das empresas privadas (excluindo os cargos de direção, claro, claro).
Realmente, houve tempo em que se ganhava melhor nas empresas privadas, e não havia falta de trabalho, pelo que o argumento da segurança não era muito apropriado. Estava-se num ponto favorável da curva dos rendimentos decrescentes, como dizem os economistas.

Não será razão para perguntar tão zangado: "Acham bem?", pois não?
Porque assim até parece que o senhor ministro está a dar razão ao Wall street journal, que os trabalhadores portugueses são uns sub-educados e sub-formados, passe o anglicanismo.

O Porche Cayenne

Quando se publica um texto no blogue, aparece uma série de anuncios que o Google exibe automaticamente por relação com palavras do texto.
Engraçado, ter acontecido com a publicação do texto sobre a falta de ética na economia de dia 28 de novembro.
Porque no texto se referiam os 4% e os 5,2% das taxas de juro de empréstimos, apareceu-me um anuncio do Porsche Cayenne.
Integra-se no contexto, não é?
Um país aflito com as suas taxas de juro e outro país, muito cioso das sua produtividade, a querer-lhe vender objetos de luxo.
Não seria melhor começar já a preparar um plano de transição entre este sistema económico e financeiro que estimula a produção e a venda de Porsche Cayenne, e um sistema que se contente com um carro mais económico?

O código do IVA e o cidadão que não queria a fatura

Com a devida vénia, remeto para um artigo sobre o código do IVA no Imprensa Falsa:
http://imprensafalsa.com/306844.html

A obrigatoriedade de passar fatura é honorável e é por muitos considerada um dever de cidadania.
Mas não é universal este entendimento.
Respeite-se o voluntarismo dos senhores ministros e o caráter sagrado que querem dar à contribuição das faturas para o bolo dos impostos.
Acham os senhores ministros que assim se combate a evasão fiscal.
Pessoalmente, acho, que se os senhores ministros acham, um cidadão insignificante também tem o direito de achar, que a evasão fiscal se combate com o fim do sigilo bancário como primeiro passo.
Outros se seguirão, mas este será o primeiro passo, se se quiser ir pelo caminho da eficácia, antes de pensar em incomodar os cidadãos com obrigações de faturas.
Salvo  melhor opinião, claro.
É que papeis para controlar já os cidadãos têm muitos.
Farão o favor, os serviços competentes, de fiscalizar as máquinas registadoras dos estabelecimentos comerciais, para evitar o software de fuga, diferente do registo das transações.
O cidadão não tem nada que ser incomodado com isso nem de ser suspeito de cumplice de evasão fiscal.
Ao cidadão basta o talão da máquina registadora, o recibo, seja qual for a sua cor, ou até a conta manuscrita.
E considerem tambem que há cidadãos que acham (lá está, têm direito a achar) que os impostos não devem (não devem mesmo, é o termo correto) ser a unica fonte de receitas da comunidade organizada, podendo esta ser detentora de empresas lucrativas.
E que não devem ser tão altos que convidem a desistir do registo da transação.
Porque se forem excessivamente altos, a obrigatoriedade da exigencia da fatura torna o cliente um cumplice do exagero do imposto.
Salvo melhor opinião.
Pensem nas feiras. Se o cidadão vendedor de fruta já pagou a licença da sua barraca de vendas (é, os serviços têm de conhecer os valores normais de mercado para poderem fixar as licenças) , estar a passar fatura é duplicação de impostos (eu sei que taxa e imposto não é a mesma coisa, mas só para os especialistas não é a mesma coisa, para quem paga é), e duplicação de impostos é anti-constitucional.
Pelo menos por enquanto.

Por isso, tratar o tema da forma como o Imprensa Falsa faz, com o cidadão a recusar a fatura, é capaz de ser mais sério do que parece.

A musica subversiva de Nino Rota



Este blogue já afirmou que a ópera é muitas vezes subversiva pelos temas que trata.
Umas vezes escondendo a crítica ás estruturas sociais e aos seus protagonistas, e outras deixando-a evidente.
O mesmo se passa com os grandes musicais como West Side Story, Hair, Doctor Atomic, A morte do senhor Klinghoffer, e com a grande musica de filmes.

Nino Rota é um compositor de formação clássica, autor da musica para o filme o Padrinho (Godfather).
O tema da valsa acompanha recorrentemente cada uma das execuções da mafia.
Nino Rota justificou esse tratamento como um ciclo de violencia interminável, tal como a valsa rodopiando, com os sucessivos crimes de morte, com uma lógica de repetição e de impossível libertação dessa condenação.

Musica subversiva, ilustrando a lógica de destruição periódica que o sistema económico e financeiro que domina as sociedades vai executando implacavelmente, sem respeito pelos direitos humanos ao emprego e à segurança social expressos na declaração universal.

Talvez a valsa de Nino Rota ajude a compreender as politicas recessivas que nos afligem, já que a argumentação não é o nosso forte.
Lá, lá-lá-lááá, lá-láá-a ... ...

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

A ética não é uma entrada no dicionário da teoria económica que está sendo praticada

A ética não faz parte do dicionário da economia que está sendo praticada.
Houve um tempo em que um ministro das finanças do  meu país repreendeu um deputado que pedia ao governo medidas conta os ladrões dos bancos (não os assaltantes, mas os gestores).
Tenha termos, disse o senhor ministro.
Daí a uns dias, os gestores eram publicamente denunciados por práticas danosas.
Ignoro se o senhor ministro pediu desculpa pela frase infeliz "Tenha termos".
Se não o fez, cometeu uma infração à ética.
Recentemente, chocou-me um jovem deputado, dirigindo-se a um senhor ministro do atual governo, perguntar-lhe se não tinha vergonha na cara por valorizar uma medida que segundo o deputado não o merecia.
Também ele foi repreendido, ignoro se com ou sem razão porque não conheço os pormenores do caso que se discutia.
Mas conheço o caso que se passou comigo, quando depois de algumas incertezas o governo atual divulgou a boa nova de que os juros do empréstimo de 78.000 milhões de euros seriam de cerca de 4%.
Fui ao calculador das prestações e amortizações, e para um empréstimo a 15 anos obtive uma prestação mensal de 576,96 milhões de euros, o que conduziu a um valor total pago de 103.852,8 milhões de euros.
O total de juros seria assim de 103.852,8 - 78.000 = 25.852,8 milhões de euros.
Posteriormente, a comunicação social informou que a comissão da troica para o empréstimo é de 655 milhões de euros (1,2 milhões de euros por  mês para cada uma das 3 entidades emprestadoras).
Temos assim que juros e comissões são, em 15 anos, 26.507,8 milhões de euros.

Foi portanto surpreendente o anuncio de que afinal os juros serão 34.400 milhões de euros, isto é, mais 8.547,2 milhões de euros.
Voltando ao calculador, determinei a taxa como sendo próxima de 5,2%.

Noutras profissões, mais respeitadoras das regras da matemática e das leis da física, um erro de 30% como este, anunciar 4 e impor 5,2, é classificado como incompetencia, desatenção grosseira, simples ignorancia ou vontade expressa de enganar.
E um erro destes justificaria uma renegociação das condições de prazo e taxa de juro.
Mas não parece neste caso que a ética comande a politica de informação económica aos cidadãos.

Tambem não parece que os problemas do nosso país se resolveriam apenas passando a taxa de 5,2 para 4%, quando o nosso país não tem a capacidade produtiva, por exemplo, da Irlanda. Lá, o grupo de assaltantes/gestores de bancos causou danos maiores do que no nosso país, mas a estrutura produtiva da Irlanda tem maior capacidade para compensar os danos, e era aí que se devia pôr a tónica, mas os economistas que nos governam cingem-se aos números, e têm dificuldade em compreender os indicadores que traduzem o funcionamento da industria.

Resta-nos assim a liberdade de expressão de deixar escrito que os senhores economistas que governam a Europa e que não querem mudar a política do BCE, e que governam o nosso país e que não querem partilhar os sacrifícios com os beneficiários dos rendimentos do capital, deveriam reconhecer o falhanço do seu sistema financeiro.
Quanto mais tarde o reconhecerem, maiores serão os danos.

sábado, 26 de novembro de 2011

Falas de governantes – a origem das religiões



O meu amigo arqueólogo já me tinha dito que o país ainda tem algum orgulho nos seus vestígios da pré-história.
Não se conseguiu destruir tudo,  não se conseguiu utilizar todas as pedras originais para construir  habitações ou monumentos mais do gosto da nova época.
Na encosta norte do monolito da Póvoa de Lanhoso a construção da estrada de acesso à igreja e castelo pôs a descoberto um castro com várias habitações.
Idade do ferro, terceiro milénio antes de Cristo.
Reconstituição

Gostavam de alturas, estes celtas/celtiberos (?) . Provavelmente defender-se-iam melhor assim. E lá no cimo fariam as suas práticas religiosas, nem que fosse apenas o que King Kong fazia do alto do seu penhasco, contemplava o sol e a paisagem .
Não gostavam nada destas povoações nas alturas os colonizadores romanos.
Talvez por isso os castros foram sendo soterrados, sacrificando apenas as pedras da parte mais alta das paredes.
Provavelmente algumas das pedras do castelo da Póvoa de Lanhoso terão vindo das paredes das habitações  circulares ou quadradas dos castros.

Assim como algumas das pedras da igreja vieram do castelo.
A igreja culmina, no cimo do batólito, uma via sacra, muito vulgar nos montes minhotos, possivelmente por herança das religiões anteriores.

Interessante o inicio da construção deste conjunto religioso ter sido por volta do fim do século XVII, numa altura em que a dívida do país era muito grande, esgotadas as finanças com as guerras da restauração e com as reorganizações da sociedade  portuguesa.
Mas talvez o dinheiro tivesse aparecido no sentido down-top, isto é, por entusiasmo popular e da burguesia comerciante e produtora agrícola em ascensão por contraste com a nobreza já pouco feudal, e buscando apoio no seio da classe sacerdotal.
Terá sido um bom investimento, porque em poucos anos a cornucópia do ouro do Brasil equilibrou as contas e permitiu alguma industrialização, pelo menos nos vinhos, nos têxteis e, naturalmente, nas pedras graniticas.
Ultima estação da via sacra

A poucos quilómetros, noutro ponto alto, estende-se, imponente, por mais de 24 hectares, a citania de Briteiros.
Reconstituição


Deduzo que todas estas pedras foram cortadas a partir do granito da serra e descidas até aos locais de construção.
Reparo nas caleiras que conduzem as águas pluviais até ao balneário.
Balneário

Com um pouco de boa vontade concordarei com o meu amigo arqueólogo que aqueles traços na pedra são arte rupestre, uma representação antropomórfica com 5.000 anos de resistência à intempérie.

Os vestígios no terreno e os recolhidos no museu, em Guimarães, fazem supor que a comunidade era auto-sustentável.
E eu interrogo-me se esta construção circular de maiores dimensões,com bancos à volta,  seria mesmo o conselho dos anciãos.

Porque se fossem sábios, os anciãos teriam conseguido encontrar forma de resistir aos assaltos de romanos, visigodos, suevos, árabes, francos.
Mas não, não encontraram.
Tiveram de fazer como Asterix, ou melhor, Vercingetorix.
Fantasio, claro.
Misturaram-se, e isso foi bom, mas desceram das montanhas.
Talvez este círculo fosse um circo, para distrair as pessoas, que não tinham muitos anos de vida para se distraírem.
Ou fosse um local de rituais sacrificiais, sabe-se lá se também humanos.
Porque não vejo vestígios da religião dos habitantes?
Será ignorância minha ou preconceito?
Que as religiões novas tentam esconder ou fazer desaparecer as religiões que vêm substituir?
Olho para estas pedras e penso que a origem das religiões está no cérebro do homo sapiens.
Que o cérebro da criança, sem que ninguém lhe insinue isso, imagina um companheiro para trocar impressões.
Não pode fugir a isso porque as sinapses se organizaram em neurónios que se espelham a si próprios, independentemente da realidade  e da forma como ela é traduzida pelo cérebro da criança.
Por isso desapareceram os vestígios da religião.
Desvaneceram-se com os cérebros dos habitantes das citânias.
Cinco milénios depois, os rituais das salas de cinema ensinam aos habitantes das cidades, com o filme “Matrix” dos irmãos Wachowsky, que “a realidade é apenas um sinal eletroquimico nas sinapses” , que só existe por existir esse sinal.
Em vão  tentou Platão sensibilizar os habitantes para a alegoria das sombras nas paredes das cavernas.
Em vão tentou Descartes convencer os habitantes a distinguir o sonho do acontecimento real.
Em vão tentou a academia das ciências britânica, mais ou menos na mesma altura em que começou a construir-se a via sacra pelo monolito da Póvoa de Lanhoso acima, que todo o conhecimento fosse testado e comprovado antes de ser admitido como verdade cientifica, e mesmo assim contestável, verdade só de nome provisório, porque sempre pode ter escapado alguma coisa à observação e à experimentação.
Prevalecem os neurónios auto-suficientes e indiferentes à realidade.
Como dizia o  pedreiro cabo-verdiano, entrevistado durante as obras de construção do tunel do metropolitano entre o Marquês de Pombal e o Rato, quando  a repórter lhe perguntou se as obras iam ser concluídas dentro do prazo:
“O que é preciso é ter fé, acreditar”.
Concluíram-se sim, dentro do prazo, a desconexão da Rotunda e o prolongamento do metropolitano até ao Rato foram executados dentro dos prazos, sim, em 1995. Não houve “derrapagens”, como tantos se lamentam que existe sempre.
Mas não foi por se ter tido fé, foi por se ter trabalhado bem.
Por isso oiço o governante pedir aos portugueses que “não deixem de acreditar” e sinto frio, porque acreditar assim é crer na realidade que é só a  do cérebro e é descrer na força e na razão da argumentação.
Talvez o mesmo frio dos habitantes das citânias, quando lhes foi demonstrado que não podiam continuar a viver nas suas encostas, no meio das suas pedras.
Mas como Mel Gibson imaginou no seu Apocalipto, com elevada probabilidade houve habitantes das citânias que conseguiram sobreviver à fuga, e deixar o seu ADN por aí.
Não se sabe onde, mas por aí, mesmo sem acreditar, e talvez até por isso mesmo.

Rodado de carro de bois, em exposição em Calvos, Póvoa de Lanhoso.





Notar as cavilhas de freio dos cubos das rodas e as cintas de ferro fixadas com cravos para reforço e proteção das madeiras.
Vestígios de falta de lubrificação das chumaceiras de apoio da paltaforma.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Cabeços de amarração

Cabeços de amarração, perto de Santos, sem uso marítimo, resistindo ao tempo e à ferrugem, à beira do rio da minha aldeia.




Uma questão de transportes - o estacionamento



A rua da fotografia tem dois sentidos.
O estacionamento de veículos deve-se , metade, a residentes, um quarto, a pessoas que trabalham em pequenas empresas da zona e o outro quarto, a desportistas do estádio do INATEL.
O local é muito procurado porque nas avenidas próximas o estacionamento é pago com parquimetros.
A pessoa que se vê na fotografia é cega e moradora na zona.
Os passeios estão intransitáveis por pessoas com mobilidade reduzida.

Não podemos culpar os condutores que estacionam ilegalmente e sem consideração pelos peões, quando várias medidas podiam ser tomadas, isto é, a ausencia de medidas reguladoras corretas gera o comportamento incorreto dos automobilistas (é uma metáfora, não podemos culpar os bancos da crise financeira quando os governos se abstêm de implementar efetivas medidas de regulação, mas podemos culpar os governos por omissão; não podemos culpar os particulares que se endividaram quase na proporção dupla do estado, mas podemos culpar as entidades que persuadiram os particulares a endividarem-se):
- passar a rua a sentido único
- instalar parquímetros
- fiscalizar e multar o estacionamento em cima de passeios
- realizar inquéritos para averiguar se os condutores faltosos não poderiam utilizar transportes coletivos e incluir eventuais falhas de cobertura da rede de transportes coletivos em futuros planos de reorganização das redes

É, as questões de transportes são mesmo complicadas.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Pitagoricamente jogando com numeros II - civitas iniquitatis

Jogando com numeros poder-se-á chegar à definição dos limites e do conteúdo da cidade da equidade.
Se já se definiu internacionalmente a forma de cálculo do coeficiente da desigualdade de Gini, também pitagoricamente poderiamos chegar à cidade da equidade.

Mas ainda não o fizemos.
Vivemos ainda na civitas iniquitatis, apesar do senhor ministro das finanças garantir que a distribuição dos sacrificios é equitativa.
Como aliás diz o senhor primeiro ministro, sem admitir contestação e garantindo professoralmente que não muda o orçamento porque é sagrada a partilha de 1/3 para as receitas e 2/3 para o corte de despesas e afinal  não há gorduras do estado suficientes para cortar .
E como argumento demonstrativo da equidade dos sacrificios, disse o senhor primeiro ministro que os funcionários publicos são amputados de dois subsidios mensais e os trabalhadores do setor privado poderão ser sujeitos a trabalhar mais duas horas e meia por semana, reduzindo assim o valor do seu salário horário.
Vem a troica e diz que é óbvio que a redução salarial dos funcionários públicos se repercutirá no setor privado.
Em sentido contrário funcionou o aumento salarial dos funcionários publicos em 1972, através da concessão de um subsidio de férias.
É que na altura não havia duvidas, o salário médio do setor privado era claramente superior ao setor público.

Mas deixemos isso e joguemos um pouco com os numeros, não para encontrar a solução para a equidade, que essa só se conseguiria com estudos estatísticos e sociológicos sobre dados que me parece não existirem (em Portugal costuma-se decidir sem recolher e tratar dados em quantidade suficiente), mas para tentar outras perspetivas.

Haverá 900.000 funcionários publicos e trabalhadores de empresas publicas?
E 3.600.000 trabalhadores do setor privado?
Como o senhor primeiro ministro diz, o salário médio no setor publico será 15% superior à média nacional? (seria interessante a tal auditoria à divida externa, identificando os credores e os devedores por classe, explicando por que sendo a divida privada superior à publica, são os salários do setor privado tão inferiores aos do setor publico; provavelmente Medina Carreira explicaria que tanto os assalariados publicos como privados se empenharam a aumentar a divida ao estrangeiro).
Excluindo os escalões superiores, teve o cuidado de acrescentar, provavelmente por ter lido o email que circulou com os vencimentos  de antigos ministros que ocupam lugares de administração em empresas mais ou menos ligadas às áreas dos seus anteriores ministérios.
Mas admitamos que o salário médio publico, considerando o peso de médicos, professores, quadros técnicos licenciados, é 20% superior ao do setor privado.
No quadro seguinte aplica-se o critério de equidade defendido pelos senhores governantes, da equivalencia entre o corte de subsidios e o aumento do numero de horas semanais (repete-se que o interesse é meramente de jogo com numeros, porque a equidade não se mede assim, apenas com estas variáveis) chegando-se a resultados diferentes.

Concluiu-se que mesmo depois de cortar 2 subsidios o salário publico ainda é superior 2,86% ao sala´rio privado de 40 horas. E que passar de 40 para 42,5 horas semanais corresponde a uma redução de 5,88% no salário horário privado.
Para que os salários horários ficassem iguais depois do corte de subsidios no publico e da variação das horas por semanas dos privados, seria necessário que estas fossem reduzidas para 39 horas, isto é, uma diminuição de 13 minutos por dia.
E se quiserem supor que  a produtividade do privado é superior em 10% à do setor publico (não estou a pôr setores contra setores, o que desviaria a atenção das causas a montante, mas as obrigações de serviço público, como por exemplo transportar menos pessoas por veículo em horas de pouco movimento, implicam naturalmente perdas de produtividade, não por insuficiencia dos seus trabalhadores, mas pelas obrigações sociais em si), então o horário semanal privado teria de baixar para  35 horas e a diminuição diária seria de 5 minutos.
Não parece portanto ser este o caminho para definir equidade entre o setor publico e o privado, até porque as variáveis que devem ser consideradas são muitas.


1 - Imaginemos agora que uma empresa com 10 trabalhadores tinha uma produção semanal P=1000 (por exemplo, 1000 peças de mobiliário) com um horário de 40 horas semanais.
A sua produtividade era 2,5 peças por homem.hora.
Quando passou a 42,5 horas semanais, recebeu encomendas adicionais e passou a ter uma produção 5% maior. Mantendo o quadro, a produção aumentou para 1050 peças, mas a produtividade baixou para 2,47 peças por homem.hora.

2 - Imaginemos que a procura baixava e a produção semanal reduzia-se 10% , de 1000 para 900.
Com o mesmo quadro de pessoal a produtividade baixaria de 2,5 para 2,24.
A tentação seria grande para despedir um trabalhador.Mesmo assim a produtividade baixaria de 2,5 para 2,48. Pelo que a tentação de um segundo despedimento conduziria a um aumento da produtividade de 2,5 para 2,79.
No entanto, baixando as horas semanais para 36, manter-se-ia a produtividade em 2,5 o que parece indiciar que cada caso é um caso.

Estas e outras variações estão no seguinte quadro:

Conclui-se assim que aumentar o numero de horas semanais, quer com aumento da produção, quer com diminuição da produção , conduz a diminuição da produtividade.
Isso mesmo se poderia ver a partir da fórmula da produtividade, aumentando os homens.hora ou diminuindo a produção a produtividade baixa:

produtividade =produção/fator de produção   (p=P/(hom.h) )




Nestas condições, é admissível discutir a proposta da CIP de criar uma bolsa de  horas (depósito de acumulação durante a baixa da procura para descarga em período de aumento da procura) para absorver as flutuações da procura e da produção, garantindo a manutenção do quadro de pessoal e as remunerações globais anteriores ao aumento do numero de horas (baixando portanto o salário horário). Esta opção significa a supressão das horas extraordinárias (outra forma de suprimir as horas extraordinárias em dias uteis é a isenção de horário de trabalho).
Outra hipótese seria as remunerações dependerem de uma parcela proporcional à produção, somada a uma parcela proporcional ao numero de horas trabalhadas (princípio da parceria ou participação dos trabalhadores nos resultados).
Ou então, considerando os resultados razoáveis obtidos, e não querendo inventar o que já está inventado, a aplicação do regime de "kurzarbeit" (trabalho encurtado) a todo ou parte do quadro de  pessoal.
Este regime evita o despedimento ou a dispensa, mediante o desvio de trabalhadores, em períodos de menor procura, para cursos de formação financiados por fundos públicos (dado que o sistema nasceu na Alemanha, será de esperar que a UE possa colaborar).
Ver:



O segundo endereço contem uma reflexão interessantissima sobre a natureza da crise atual, na qual poderá estar a desempenhar um dos lugares principais o problema do desemprego com origem no desenvolvimeto tecnológico (teriam razão os barqueiros do Reno que queimaram barcos de vapor, ou o médico do tempo dos primeiros comboios que afirmava que o cérebro humano, por não ter sido desenvolvido para isso, começava a funcionar mal acima de 20 km/h?).

No entanto, numa altura em que a UE sobe a comparticipação de 85 para 95% nos fundos QREN, dotados para o nosso país com 21 mil milhões de euros (têm é de se fazer corretamente os projetos e o seu planeamento para se obterem os financiamentos), custa a compreender algumas afirmações anti-investimento dos senhores governantes, quando esses fundos poderiam combater o desemprego.

Diamantes de sangue

Gladstone, primeiro ministro do tempo da rainha Vitória, defendeu-se no parlamento quando foram encontrados, pelas tropas inglesas, sacos de farinha vendidos por ingleses, num acampamento de rebeldes num dos recantos do império do oriente,  dizendo:
"Business is business".

Mas o livro "Diamantes de sangue, corrupção e tortura em Angola", de Rafael Marques, numa altura em que a Sonangol, familia do presidente angolano e generais angolanos pensam aumentar os seus investimentos em Portugal, faz pensar até aonde a frase pode ir.
O livro denuncia a prepotencia das empresas diamantíferas na Lunda e Quango, ligadas ao poder politico.



E numa altura em que os teóricos e académicos discutem o grau de isenção da informação numa estação pública, oiçam esta edição programa da Antena2 "Última edição":


Citação no programa, do sociólogo norueguês Johan Galtung: "O arquétipo da violencia estrutural (meios para impedir os individuos de desenvolver o seu potencial) assenta na exploração dos grupos mais fracos pelos que estão no topo da cadeia do poder".

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Um poema de Álvaro

Não estou pensando em nada 
E essa coisa central, que é coisa nenhuma, 
É-me agradável como o ar da noite, 
Fresco em contraste com o verão quente do dia, 

Não estou pensando em nada, e que bom! 

Pensar em nada 
É ter a alma própria e inteira. 
Pensar em nada 
É viver intimamente 
O fluxo e o refluxo da vida... 
Não estou pensando em nada. 
E como se me tivesse encostado mal. 
Uma dor nas costas, ou num lado das costas, 
Há um amargo de boca na minha alma: 
É que, no fim de contas, 
Não estou pensando em nada, 
Mas realmente em nada, 
Em nada... 


Poema de Álvaro de Campos, heterónimo de Fernando Pessoa, em "Poemas"


Fernando Pessoa aprendeu o inglês como língua natural em Durban, para onde os pais emigraram quando tinha 5 anos. 
Pensava portanto em inglês e isso foi muito bom quando voltou a Portugal com 17 anos e tomou contacto a fundo com a literatura portuguesa e com os poetas modernistas e simbolistas portugueses seus contemporâneos.
Pensar em inglês é uma forma mais económica, dado que o pensamento inglês foi estruturado à volta das trocas comerciais que o povo fazia numa linguagem contendo o máximo de informação com o mínimo de componentes, enquanto a corte inglesa falava em francês e fazia os seus jogos de poder segundo a estratégia francesa de ideias .
É portanto, o pensar em inglês,  mais eficaz ao abordar uma questão, estudá-la, propor saídas e finalmente apresentar a conclusão.
Dito assim pode parecer fácil, que sistematizar uma questão seria resolvê-la.
Nada disso, Fernando Pessoa teve de criar heterónimos para atacar de diversos pontos de perspetiva as questões.
Mas talvez tenha pensado muitas delas em inglês, "just in english", e por isso os portugueses não o tivessem compreendido na altura.
Pode ser-se incompreendido, quando se pensa em inglês.
Por exemplo, não se diz que se pôs a máquina de lavar roupa a correr, diz-se que se ligou a máquina.
Mais uma razão para, quem vem de fora, fazer  o esforço para pensar em português, para automatizar a construção das frases em português, o que só se conseguirá com o alargamento do vocabulário dominado e com a aceitação desta famosa maneira de ser, "à portuguesa". 


Tem  vantagem de não se perder tempo a "traduzir mentalmente" de inglês para português.




Nota - Dedicado ao autor , e à sua superchefe de gabinete, do neologismo "descompetividade", como sinónimo de falta de competitividade.

domingo, 20 de novembro de 2011

Pitagoricamente jogando com números I - uma percentagem de portugueses



Tenho em comum com o senhor ministro das finanças o gosto dos números. No meu caso, não por acreditar que a realidade deles, números, seja mais real do que a realidade simplesmente ou complexamente realidade.
No caso do senhor ministro não sei, mas temo por vezes, perante algumas afirmações dele, que dê aos números uma importancia exagerada.
Foi o caso de ter dito que 80% dos portugueses tinham votado nos partidos que subscreveram o memorando com a troica.
Consultados os resultados eleitorais, eu diria que a soma das votações nos 3 partidos corresponderia a 78,4% dos eleitores que votaram.
E a 46,2% dos eleitores inscritos.
Não estou a dizer que o senhor ministro não tem legitimidade para tomar as decisões que toma, nem a valorizar a votação nos outros partidos, estou apenas a corrigir a percentagem de votantes nos 3 partidos.
46,2% dos portugueses habilitados para votar, e não 80%, apoiaram os partidos do memorando.
41,1% abstiveram-se.
Imaginemos, não pitagoricamente, isto é, retirando importância aos números dos votos “expressos” e tentando aproximar-nos da realidade, que no parlamento estavam vazios os lugares correspondentes a 41,1% de eleitores.
Os 3 partidos do memorando estariam em minoria.
Verdade que abstenção significa alheamento, mas quem se abstem também sofre as consequências da desgovernação da coisa publica.
Qualquer sociólogo se preocuparia com um sistema em que os cidadãos alheados quase superam os votantes.
E quando o partido abstenção tiver mais lugares vazios no parlamento que os deputados eleitos por voto “expresso”?
Vão os senhores políticos continuar de consciência tranquila a achar-se legitimados.
Gostaria de recordar o parecer de Boaventura Sousa Santos, de que mais importante do que  discutir o papel das esquerdas ou direitas na crise, será o discutir como resolver a crise da democracia representativa, ferida pela indiferença dos abstencionistas e pela agressão da corrupção e da especulação financeira.
Embora pessoalmente preferisse medidas concretas imediatas do tipo das 22 medidas dos economistas aterrados, concordo que se deva debater em público a crise da democracia representativa.
Gostaria também de recordar o parecer de António Coutinho, presidente do instituto Gulbenkian de ciência, pela sua subversiva e lapidar definição do caminho a seguir (ver em

“a democracia deve evoluir adaptando os seus formalismos às descobertas cientificas.
Assim, deveria ser reformulado o papel dos partidos, centrando-os na ação formativa, sem prejuizo da sua liberdade ideológica, evidentemente, mas reservando a representação dos cidadãos no Parlamento a técnicas de amostragem (amplamente conhecidas da estatística, da sociologia, das    metodologias das sondagens).
Isso permitiria uma mais perfeita representação da vontade e do sentir da população, e seria um desenvolvimento do que se faz já hoje com os jurados.”

Não tenho confiança nenhuma em que os principais atores da coisa publica se preocupem com estes conceitos, invocando certametne os superiores interesses da nação para os desprezar,  mas é interessante pensar que há pessoas que têm outra opinião.


quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Falas de governantes - a cultura e a justiça

1 - Cultura
De supetão, em atropelo dramático, diriam outros trágico, e outros ainda burlesco, de forma abrupta, cortante como a queda da espada de Damocles, pum! catrapum!, já está e já, já, deixa o senhor Diogo Infante de ser diretor do teatro nacional Dona Maria II, assim falou o senhor secretário de estado da cultura.
Ou talvez não de forma tão abrupta porque o relapso Diogo em cénica vénia, à disposição o lugar tinha já posto, da soberana criatura.
Como raios de Zeus descem do como olimpo da secretaria de estado os anátemas de que o corte maior ao TNDMII era porque o relapso não tinha cumprido as ordens de corte de 15% como todos os colegas cumpriram, o que na prática dava um corte de 36% entre 2010 e 2012.
E a doutrina, estranha num homem de cultura, que embora pouco sensível à ópera, ao bailado e à musica sinfónica, escritor premiado e jornalista cultural, como é o senhor secretário de estado da Cultura, admirador confesso de George Steiner, o critico das Humanidades por não terem combatido a barbárie da crise económica, estranha, dizia, a doutrina  que é despejada como a carga de um camião de aterros sobre o pobre ex-diretor: "Os tempos actuais  exigem que as empresas e as instituições do Estado sejam geridas com critérios de excelência e que os responsáveis que as dirigem sejam capazes de encontrar soluções que maximizem resultados, escusando-se muitas vezes a escolher o caminho mais fácil”.
Fica assim Diogo Infante com o labéu de não ter querido reduzir o fardo da palha para o seu cavalo, de não ter querido habituá-lo a dar espetáculo sem comer.
Eu gostaria só de dizer, a propósito de cultura e de crise, por que é estranha a doutrina, falando em numeros, como o atual governo gosta.
Porque um país em que o orçamento da cultura é inferior a 1% do orçamento de estado é um país auto-limitado e que se auto-exclue, por maior que seja a fé que depois da recessão vem o crescimento, e  por maior que seja a desconfiança relativamente a alguns dos agentes culturais do nosso meio.


Malabarices


2 - Justiça
A senhora ministra da justiça afirmou que existem 4408 guardas prisionais e que, por o número ser próximo da média europeia, não haverá admissões. Será talvez um paradoxo, uma vez que, para fazer face ao aumento da criminalidade violenta, estão a ser admitidos policias e GNRs, o que seria para fazer detenções; a menos que se pretenda aumentar a produtividade dos guardas aumentado a taxa de ocupação das prisões. Mas não sei se as prisões terão capacidade, depois de se terem vendido umas quantas. Talvez então o melhor seja privatizar, organizar um concurso para prestação de serviços de prisão. Nos USA dá muito resultado, até dá receita ao estado. Mas também é verdade que a criminalidade nos USA não é a mais desejável.
Independentemente desta questão, o sindicato dos guardas afirma que o numero de profissionais em serviço nas prisões é inferior a 4000. Teriamos a fala da senhora ministra padecendo de um desajustamento relativamente à presença efetiva de guardas, de cerca de 10%. Não é grave, mas deve ser corrigida, a fala.
Faz-me lembrar um ralhete que sofri do senhor administrador, criticando-me por ter uma sala de desenho com  12 desenhadores e deixar acumular o trabalho. Tive de esclarecer que tinha 8 desenhadores efetivos para todas as valencias e tarefas próprias de todas as infraestruturas e equipamentos fixos do metropolitano, 3 administrativos reconvertidos em operadores de cópias por motivos psicológicos e 1 desenhador sofrendo em alto grau de uma doença do foro neurológico que o indisponibilizava frequente e inesperadamente. É muito fácil gerir a partir do tableau de bord com luzinhas a acender e a apagar que não traduzem a realidade. E é muito fácil também, por razões de produtividade, despedir as pessoas que deixam de poder produzir por adoecerem, sem pensar como elas vão sobreviver, em vez de as aproveitar no que elas podem fazer.
Enfim, questões de justiça.

A troica em Portugal, aos 16 de novembro de 2011

Retenho das declarações dos membros da troica, em 2011-11-16, que é satisfatório o cumprimento do memorando, embora não o seja a transferencia do fundo de pensões dos bancos (tambem concordo devido aos acréscimos de despesa futuros), e que:
-  é óbvio que a redução de salários da função pública se irá refletir na redução de salários do setor privado;
-  ou se reduzem os salários para o trabalho que se produz, ou se aumenta o trabalho que se produz para manter os salários
-  os salários da função pública e o numero de funcionários são elevados
- que cortar salários é uma opção do governo português mas que a troica dá suporte

Confesso que me desiludiram estas declarações. Mesmo em paridade de poder de compra os salários em Portugal não são elevados.
O numero de funcionários públicos ser elevado ou não depende da extensão do serviço público; o montante ser elevado depende da qualificação dos funcionários (médicos, professores...). A proposta da troica para redução do numero de funcionários é de 2%, ou uma passagem de 700.000 para 686.000 .
Comparando com os salários dos países que, segundo o senhor presidente do Conselho da UE estão imunes à crise porque sempre adotaram politicas firmes (e porque a geração atual herdou uma estrutura produtiva forte, e porque alguns desses países têm politicas fiscais que prejudicam os paises europeus de economia  mais fraca), só pode concluir-se que os salários em Portugal são baixos.
Acresce a taxa de desemprego, que contribui para a redução da quota dos rendimentos de trabalho.
Aliás, sendo pequena a quota da contribuição do fator trabalho para os custos de produção, como é que estes senhores encaram com tanta naturalidade fazer recair sobre ele o grosso do esforço?
Os burocratas económicos e financeiros da corrente dominante da Europa têm esta ideologia neo-liberal, de reduzir a tout prix as despesas públicas, sem contabilizar os prejuízos sociais daí decorrentes, e de impor a austeridade a quem vive do seu trabalho, sem cuidar dos outros rendimentos, sem querer entrar em conflito com os off-shores, e sem querer dotar o BCE dos poderes de um banco central, segundo as politicas definidas pelos partidos votados pelos eleitores (pelo menos enquanto não for possível pensar numa democracia mais direta).

Por isso  volto à medida nº 9 das 22 medidas propostas no manifesto dos economistas aterrados: efetuar uma auditoria pública às dívidas pública e privada, identificando as entidades particulares ou empresariais credoras e identificando o destino dos empréstimos recebidos e a sua contribuição para o equilíbrio da balança de pagamentos. Quem emprestou, e a quem foi emprestado, e onde foi gasto e com que utilidade o que foi gasto. Ver em:
http://fcsseratostenes.blogspot.com/2010/10/economicomio-lxii-as-22-medidas-dos.html

E proponho tambem o provérbio chinês aplicado à troica: "Não me dês o peixe, dá-me uma cana e diz-me como se pesca".
Não me importo que venhas para cá uns tempos montar fábricas e construir barcos de pesca. Podes gerir as fábricas e explorar os barcos, até nem te tens dado mal com a Auto-Europa e a fábrica de eletrónica para automóvel da Bosch, em Braga.
Podes montar os negócios que quiseres, desde que empregues o nosso pessoal; vai-o formando e quando tivermos dinheiro compramos a vossa parte de comum acordo.
Mas não nos digas que os nossos salários são elevados.


Salário bruto por hora em euros em 2006 - salários mais elevados com as cores mais escuras:
"In the euro area (EA-16), where employees earned on average 13.99 EUR gross per hour, the top three high-wage countries were Ireland (20.83 EUR), Luxembourg (19.19 EUR) and Belgium (17.45 EUR). The euro area countries registering the lowest gross hourly wages were Slovakia (3.10 EUR), Slovenia (6.75 EUR) and Portugal (7.00 EUR)"


Gravura  e citação retiradas de: 
Para o salário mínimo ver:

 Salário anual bruto em PPS (paridade de poder de compra standard) em dólares em 2009:

Rank
Country
2009 $
1
51,493
2
50,610
3
47,810
4
45,385
5
45,161
6
45,160
7
43,607
8
43,250
9
42,173
10
41,923
11
41,421
12
37,544
13
37,269
14
35,582
15
34,903
16
32,957
17
32,816
18
32,638
19
32,121
20
27,460
21
22,666
22
19,618
23
18,220
24
17,812
  retirado de: