sábado, 13 de abril de 2013

Diálogos de Siracusa - a diferença entre as regiões


Publius Coletius continuou com o seu jeito tranquilo de contemplar o mar enquanto lhe transmitiam as maiores desgraças da sua ilha.
Caio Indivisiu, com quem gostava de comentar as noticias que as trirremes traziam de Roma, lamentava, destroçado, as palavras do imperador, que vituperara a ilha do sul ao saber-se dos resultados do exercício do ultimo ano. 
Ele, grande proprietário da ilha, pagador de impostos e fértil em negócios nas províncias extremas do império, só conseguia retirar rendimento dessas provincias, que na ilha a plebe estava sem poder de  compra.
A ilha gastava demais com os seus centuriões, os seus questores, os seus pretores. Os impostos que mandava para Roma não chegavam para pagar o que Roma gastava na construção de teatros como o de Taormina, no transporte dos cereais, na formação dos construtores de aquedutos e de estradas  e na manutenção do exército.

Publius Coletius - Os prefeitos sucedem-se atarantados como mordidos por tarantulas, passe a redundancia.
Eu já te disse, Caio, o que deveriamos fazer, taxas sobre os agiotas, construção de vias de comunicação de elevada eficiencia energética, mas isso vai contra a vontade do nosso prefeito e do nosso pretor maximus, e quem liga a um pobre funcionário da Àgora, para mais reformado? 
Aproveitemos então para fazer o que o grande Anaximandro e o grande Socrates, de Atenas, faziam, contemplar o ceu e o mar enquanto discorremos sobre as hipoteses das causas de tanta desgraça, de tanta diferença entre as regiões do Império, e de como poderiamos corrigir isso.
Lembras-te quando o grande Spartakus conseguiu unir os produtores diretos do trabalho, os escravos, e fez uma redistribuição de rendimentos?
Os patrícios que não fugiram para Itália viram os seus rendimentos reduzidos e os artesãos, soldados e escravos viram os seus proventos aumentados. 
Agora tudo volta ao mesmo, os rendimentos a voltarem aos grandes patrícios, como tu.
Caio Indivisiu - Muito sofri eu, na altura, mas as coisas compuseram-se
Publius Coletius - Não para o pobre Spartakus, pendurado na cruz como um Cristo
Caio Indivisiu - Ele e os ladrões que o seguiam
Publius Coletius - Não lhes chames ladrões, amico meo, é pouco solidário, e nós homens devemos distinguir-nos de outras espécies pela solidariedade.
Sabes que o nosso código genético é assim, temos uma grande tendencia para a imitação.
Deve ser um  qualquer mecanismo dos nossos neurónios.
Se vemos um grupo de cidadãos com grandes rendimentos interrogamo-nos porque não os podemos ter tambem.
Caio Indivisiu - Ora, trabalhando, como eu.
Publius Coletius - Meu pobre amigo, se fosse assim tão simples... Mas não , só podemos pôr hipóteses. 
Em lugar de crucificar Spartakus, César devia ter dado ouvidos aos sábios da Grécia e substituido a força do escravo pela força do vapor.
Mas repara, não é só a nossa ilha que vive cada vez pior. O próprio imperador se queixa que cada vez falta mais dinheiro para trazer os cereais do Egito e para pagar aos centuriões da Capadócia, e o questor maximus não quer emitir moeda para que os preços não subam descontroladamente. 
Caio Indivisiu -  Mas eles em Roma reequilibram-se, eles conseguem crescer, e aqui, na ilha de Siracusa, as coisas estão cada vez pior, rerum sunt pejus,a situação degrada-se, corrompe-se, situ deteriorativus.
Publius Coletius - Pois é, mas repara que sempre que eles precisam de dinheiro arranjam agiotas que lhes fazem um juro baixo. E a ti que nunca falhaste com os teus pagamentos, que juro te exigem? Ainda tu, que tens propriedades até às faldas do Etna, uma multidão de escravos que trabalham para ti, ainda consegues equilibrar-te, mas os pobres pescadores, os pequenos artesãos, os padeiros, os soldados, os curandeiros, sem sestércios para investir nem para recolher do seu trabalho. 
César devia considerar Siracusa como parte integrante do seu império, e não como provincia subsidária e compradora das carroças e das trirremes que lá são fabricadas. 
Um artesão em Siracusa devia ganhar o mesmo que em Roma quando produz o mesmo. Mas não, o preço final do produto reproduz os custos de produção de todos os fatores. Depois dizem que é a produtividade que é diferente.
Caio IndivisiuQuid faciam? que fazer?
Publius Coletius – Aqui em Siracusa devemos unir-nos, patrícios, plebe, soldados, escravos, pretores, questores, enviados de César e cidadãos. 
Devemos repartir melhor os sacrifícios e os rendimentos. 
Tu podes continuar a ser um grande proprietário, mas os pequenos artesãos, os pequenos agricultores, os pequenos pescadores devem agrupar-se em cooperativas. 
Tempos virão a que se chamará a isso ganhar vantagem de escala. 
E temos de vencer a nossa aversão mediterrânica pela organização do trabalho em equipa,  temos de deixar de lado as nossas inseguranças desconfiadas, temos de nos aplicar a fazer planeamento, planos de transição da inoperância, ou da decadência, ou da hibernação, para o crescimento. 
Mas cuidado com a dimensão da atividade, para que os rendimentos decrescentes não surjam a obrigar a despovoar as cidades, a inviabilizar a gestão das coisas.
Caio Indivisiu -  Sempre utopista, amico meo.
Publius Coletius – Serei, mas acredito firmemente que se Roma e as tribos germânicas pagam melhor aos seus artesãos do que nós aqui em Siracusa é principalmente porque os agiotas lá têm mais dinheiro nos bancos e emprestam a taxas de juro mais favoráveis. 
Não é a diferença no rendimento do trabalho que justifica a diferença entre a nossa sociedade e a sociedade deles. 
Não somos mais preguiçosos do que eles, embora gostemos de apanhar sol nas nossas praias. 
Infelizmente temos de nos render ao maior poder do imperador de Roma, esperando que ele ou os seus pretores nos visitem e vejam como podem remunerar  melhor o nosso trabalho. 
Digo isto porque não quero fazer como Spartakus, embora seja um seu admirador.
Mas deixemos isto, amico meo, e visitemos o templo para com as vestais ofertarmos qualquer coisa à deusa Flora, a deusa do crescimento depois da latência do inverno. 









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