quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Citação de Silva Peneda, 28 de outubro de 2013

Silva Peneda, presidente do conselho económico e social: "A maior transformação dos últimos tempos foi a captura do poder político pelo poder financeiro". Concordo e recordo a minha professora de História e Filosofia, esposa de um ministro de Salazar e ferverosa cristã, que nos ensinou isso mesmo quando falou da analise marxista ao estudarmos a economia politica do século XIX, ou, como nos explicava nas aulas de substituição o seu colega menos cristão, ao estudarmos o "processo histórico".
Concordo, pois, nos últimos tempos, desde a revolução industrial do século XIX, o poder financeiro "capturou" o poder politico.
Ou, como dizia (dizia) Obama, "Não fui eleito para fazer o jogo dos senhores de Wall Street".
E no entanto, seria muito interessante estudar-se agora, em Portugal, a luta da democracia norte-americana contra os "barões-ladrões", na primeira metade do século XX (e o triunfo na segunda metade do complexo militar-industrial de que falou Eisenhower ao despedir-se da presidencia).
Eu penso que valia a pena a imprensa dedicar-se a este assuntos, para mostrar as correlações entre os USA e Portugal.

O milagre do missionário

O missionário tinha sido chamado a uma fazenda do noroeste para vir salvar a nação dos índios, ao sul.
Tendo-se inteirado da situação da nação, recolheu-se em meditação para ligação ao seu senhor, conhecido no meio dos missionários como o salvador.
Erguendo os braços, teve uma visão de recuperação e gritou "milagre, milagre".
Alguns índios, apesar de tudo, conseguiam produzir e vender para fora da nação, apesar do comércio estar nas mãos das grandes companhias estrangeiras e dos agiotas.
Era esse o milagre a que o missionário, na sua posição ingénua, se referia.
Na verdade, era um milagre, apesar da atuação de todos os missionários na nação índia, que lançavam a maioria dos índios na situação de nada produzir, deixando as terras incultas, haver ainda alguns que conseguiam produzir.
Tempos difíceis, na nação índia.

terça-feira, 29 de outubro de 2013

Semelhanças


Longe de mim querer desculpar a desastrada atuação do primeiro ministro de Portugal durante a crise de 2008, mas ao comparar os dois gráficos de divida pública dos USA e de Portugal, com o crescimento exponencial durante e após a crise, não quererão os senhores sábios economistas que culpam o povo português de ter vivido "acima das possibilidades", analisar uma forte correlação entre as variáveis do gráfico de cima e as do gráfico inferior?
Digo correlação, ou ocorrencia estatística simultânea, ou comportamento similar das variáveis, não digo relação de causa e efeito.






Vida cidadã em Lisboa

Penosa Lisboa, num dia de outubro de 2013:

segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Confesso que gosto de os ler

Confesso que gosto de os ler, aos economistas que cumprem os deveres da sua militancia defendendo as politicas de austeridade do atual governo e reprovando o comportamento dos criticos.
Será um resquício insconsciente de masoquismo, porque, por exemplo, Ricardo Reis, professor na universidade de Columbia, acha que a maior parte das opiniões que por aí se vêem, na internet ou nas cartas às direções dos meios de comunicação social, são de "palermas" que não sabem nada de economia. Mais educado, Nogueira Leite chama incautos a quem se atreve a discordar ou a propor soluções que o pensamento dominante ignora olimpicamente (lembram-se da taxa Tobin? que será feito dela? e aquela comissão sobre os movimentos do multibanco? a SIBS não deixou?).
João Cesar das Neves, outro exemplo, embora delicado e evangélico na forma como escreve, acha que a culpa foi da população que gastou acima das suas posses numa bebedeira de crédito (pessoalmente acho que abaixo das capacidades, mas enfim).
Agora que se aproxima o fim do período de intervenção da troika (junho de 2014) os senhores economistas educadores debatem e explicam as diferenças entre um programa cautelar e um segundo resgate.
Como assumido "palerma" e  ignorante de economia, a ideia do programa cautelar lembra-me a proposta de há mais de 4 anos dos economistas de esquerda aterrorizados, para mutualização da dívida e redução dos juros.
http://fcsseratostenes.blogspot.pt/search?q=economistas+aterrorizados
Mas eis que os nossos economistas educadores vêm agora explicar que o melhor é o programa cautelar, que o tribunal constitucional se chumbar o orçamento de estado vai lançar o país num segundo resgate e isso é muito mau (a teoria redentora de João Cesar das Neves até transformará esse mau no melhor que poderia suceder ao país se o segundo resgate ajudar a tirar o poder às grandes empresas que fazem prevalecer os seus interesses  e que paradoxalmente se queixam ao tribunal contitucional).
Só que fico confuso quando vejo um eminente professor como o senhor ex-ministro Campos Cunha explicar (sic) "se conseguirmos ultrapassar esta fase com um programa cautelar, é uma grande vitória para Portugal. É uma coisa bem diferente de ter um segundo resgate. Ainda estamos para ver o que é exatamente um programa cautelar ... "
Pois, como se dirá em Campo de Ourique,  o que era bom era um programa cautelar. Não sabemos o que é, mas era bom.
Vivam os economistas.


O presidente Obama correu a abraçar a kanzlerine

O presidente Obama, com o seu ar desengonçado tipicamente norte-americano, correu a abraçar a bundeskanzlerine que o tinha ido esperar ao aeroporto.
- Estou muito zangada consigo, presidente - atirou a chanceler
- Eu sei - respondeu o outro - ouvi-a a queixar-se no telemóvel ao seu marido, mas estou aqui para esclarecer isso. No hard feelings, OK?

Esta pequena ficção será um desrespeito por pessoas como Assange, Manning ou Snowden, que correm riscos vindos de quem se esperaria defender os principios da democracia e as regras universais de convivencia da ONU.
Mas este blogue não é perfeito e foi vítima do pecado do despeito por o presidente americano não querer escutá-lo.
Por mais que este blogue vocifere contra a paranoia das armas de destruição maciça, contra as intervenções "pre-emptives", contra os drones que matam inocentes, contra a abertura efetiva (apoio ao Koweit, ou aos rebeldes segundo conceitos de interesses estratégicos e energéticos decididos em Washington) aos dementes que matam por tudo e por nada no Iraque, na Libia, no Afeganistão, na Síria, o presidente não escuta este blogue.
E não é por falta de agentes ou de mecanismos automáticos de escuta.
Imaginem que no último mês, este humilde blogue teve 2277 visualizações de páginas, como diz o Blogger, sendo que dos USA foram 726.
De Portugal foram 634.
Da Alemanha 121.
Mas o presidente não escuta.
Por isso ficou este blogue despeitado.

sábado, 26 de outubro de 2013

Citações da atualidade

1 - "Entristece-me ver que há pessoas e instituições que começam a desistir de Portugal"                                    Henrique Granadeiro, CEO da PT, a propósito da obsessão de vender
                                   todas as participações públicas, em vez de beneficiar delas

2 - "O principal risco do orçamento de estado não são as decisões do tribunal constitucional, mas sim o fraco crescimento económico... O crescimento da economia em termos nominais tem de ser sempre superior às taxas de juro que vão ser pagas"
                                  José Poças Esteves, a propósito da apresentação do relatório de
                                  setembro da SaeR
http://www.jornaldenegocios.pt/economia/detalhe/saer_tribunal_constitucional_nao_e_um_risco_para_o_orcamento_do_estado.html

3 - "Estou desapontado por não ver esforço suficiente dos governantes para mobilizar os fundos estruturais do Banco Europeu de Investimentos para financiamento das PME"
                                  Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia, referindo-se
                                  provavelmente, não aos fundos QEE 2014-2020/quadro estratégico
                                  europeu, sucessor do QREN, mas ao programa COSME para
                                  apoio às PME:
                                              http://access2eufinance.ec.europa.eu.
                                   (porque insistirão os governantes em desviar fundos QEE para apoio às PME
                                   quando aparentemente já há programas específicos para isso? razões
                                   eleitorais? alergia a infraestruturas ferroviárias e portuárias com
                                   comparticipação pública?)          

Leonarda

Os senhores poderosos que te expulsaram de França e os eleitores que votam obcecados pela xenofobia e pela banalidade do mal de que falava Hanna Arendt (ninguém tem o direito de decidir que outros são dispensáveis ou que não podem viver) não me vão ler. Dizem (até o ministro Manuel Valls, tenhamos piedade dele, porque primeiro levaram os comunistas, os judeus e os ciganos, mas depois, quando já ninguem puder ajudar, talvez o levem a ele...) que os ciganos não se integram.
E os eleitores obcecados votam contra os estrangeiros.
Tão pouco tu me lerás, mas eu gostava de te dizer que, se precisares, eu testemunho que sim, que os ciganos se integram.
Tive um eletricista que foi um ótimo profissional, perfeitamente integrado.
Todos se davam bem com ele e cumpria bem o seu trabalho.
Era cigano, sim, e por vezes aparecia com uma pequena águia presa ao seu ombro.
Como é possível no século XXI pararem um autocarro escolar de uma visita de estudo, tirarem-te dele e expulsarem-te do país, Leonarda?
Como escreveu José Manuel Pureza, "Uma família cigana imigrante ilegal é certamente mais fácil de combater do que um fundo de investimento que arrasa salários e pensões na bolsa."

Neorrealismo na Europa do século XXI



http://www.youtube.com/watch?v=IK3Iflfyyls

O video do youtube mostra imagens de Ribnovo, aldeia bulgara, perto da fronteira com a Grecia.
A Bulgaria integra a UE e sofre os efeitos da crise.
Muitos dos habitantes estão desempregados e trabalham as terras produzindo tabaco. Toda a familia, incluindo as crianças em idade escolar, tem um trabalho intenso durante 8 meses, obtendo um rendimento anual de cerca de 4.000 euros .
A emigração tambem já não rende, uma vez que a maioria dos emigrantes ia para Espanha para trabalhar na agricultura.
Sabe-se o efeito nefasto que a privação da escola ou o trabalho infantil tem sobre o desenvolvimento das crianças e sobre as condições sociais.
Recolhi estes elementos de uma reportagem sobre o trabalho infantil na Europa, que passou na RTP Informação (por um lado cumpre-se o serviço público, por outro distrai-se a população com telenovelas e reality shows e oculta-se-lhe a realidade do falhanço da politica económica dominante).
Depois das imagens de Ribnovo o programa ocupou-se de Napoles, mostrando um rapaz de 13 anos trabalhando clandestinamente num café e as condições em que vive a familia: pais desempregados, duas irmãs de 4 e 9 anos.
O pai trabalhava numa pizaria que fechou.
A mãe mostra alimentos fornecidos pelo programa europeia de ajuda alimentar.
Passa-se fome na Europa, como na Coreia do Norte, como na Ucrania dos anos 30.
As 3 crianças, mal alimentadas, frequentam a escola.
A diretora informa que 60% das crianças faltam à escola para irem trabalhar clandestinamente.
Sabe-se o que isto dá no futuro: regressão e vandalismo.
A economia de Napoles está a regressar aos tempos do neorrealismo italiano do pós-guera.
Pode-se extrapolar da reportagem que 40% da população europeia vive na pobreza, que o desemprego afeta essa parte da população (não são os doentes e os inválidos que estão desempregados, são adultos válidos e que querem trabalhar) e que as desigualdades aumentam (a economia funciona para a população que tem emprego).
Salvo melhor opinião, tudo isto evidencia o falhanço da politica económica da UE que não está centrada no combate ao desemprego, antes se preocupa mais com a redução dos custos de produção, precisamente reduzindo os encargos com salários.
Não parece ser fisicamente possivel combater o desemprego sem emissão de moeda para pagar aos empregados, controlando a inflação, mas os sacerdotes da religião de Chicago não querem.
Nem os do centro burocrático da UE nem os seus seguidores do governo português, nem obviamente os banqueiros.
Como diz o poema de Vinicius,

                           "... Tende piedade dos homens públicos e em particular dos políticos
                                 Pela sua fala fácil, olhar brilhante e segurança dos gestos de mão
                                Mas tende mais piedade ainda dos seus criados, próximos e parentes
                                Fazei, Senhor, com que deles não saiam políticos também.
...."

sexta-feira, 25 de outubro de 2013

O planeamento de tarefas, do DN de 25 de outubro de 2013

Com a devida vénia ao DN, donde retirei os elementos, comento o grave problema da falta de planeamento de tarefas no nosso país e de crónico incumprimento de prazos, desde a falta de pontualidade nas reuniões, até à ausencia de integração e à descoordenação entre atividades de um empreendimento.

1 - Na região de Lisboa existem neste momento em julgamento duas ações contra a construção de outros tantos campos de golfe, um junto do Taguspark e outro no Jamor.
As ações começaram agora a ser julgadas, quando ambos os campos estão concluidos e um dele em funcionamento.
Estes simples factos deveriam, como os resultados fora da norma em análises clínicas, motivar uma alteração profund ano funcionamento da justiça (descentralização do poder decisório, desburocratização, alteração dos critérios na formação jurídica, criação de orgãos de controle mútuo, disponibilização de informação ao público e oportunidade de participação em debates...).
Mas não, muito barulho para nada, como dizia Shakespeare.

2 - cronograma do guião da reforma do Estado segundo o atual governo (guião, não reforma...):

27out2012 - PC: até 2014 realizaremos a reforma do Estado que será a "refundação"
28nov2012 - PC: as medidas serão conhecidas até fevereiro
16fev2013 - PC: PP apresentará um guião "muito proximamente"
15abr2013 - CDS: guião será concluido até 13maio (7ª avaliação da troika)
29mai2013 - PP: guião será divulgado em junho
1jun2013 - PC: guião será discutido em junho
13ago2013 - PM: PP comunicará "oportunamente" o guião
11set2013 - PC: guião será apresentado até 30set
3out2013 - PP: discussão até 13out
23out2013 - PC: discussão será no conselho de ministros de 24out (adiada para 30out)

Muitas vezes repreendi os meus colaboradores quando tinhamos um prazo para entregar um trabalho e o deixávamos passar ou ameaçávamos deixá-lo passar. Mas nunca tive um caso assim. 
Certamente que concordarão comigo os gestores seguidores da escola de Chicago e os professores de finanças públicas cujo coração balança entre Buchanan e Musgraves.
Não será evidencia de simples incompetencia, será mais simples incapacidade de apreensão dos dados concretos.

É possível que esta incapacidade de cumprir prazos e de cumprir os horários seja um dos elemetos essenciais da dificuldade dos portugueses em trabalhar em equipa, em tomar decisões, em organizarem-se em grupos de recolha de dados, sua análise, estudo de soluções, sua experiencia, análise dos resultados, formulação da proposta concreta.
É possível.
Mas se é assim, em lugar de depositar em poucos a impossibilidade de resolução dos problemas, mais valia alargar as decisões e repartir a responsabilidade de as tomar por muitos.
Salvo melhor opinião, claro. 
Ver propostas de organização em "A sabedoria das multidões" de James Surowiecky.

Cinema - Hanna Arendt





Hanna Arendt, filme de Margarethe von Trotta

Confesso que fui desconfiado ver o filme.
Será difícil fazer um filme sobre uma filósofa teórica da organização politica.
Mas é um excelente filme com um texto muito bom, intensamente perturbador.
Biográfico quanto baste, mas com uma mensagem essencial, que me pareceu, dita por ela própria, ser esta: que nem sempre é o interesse egoísta que comanda a economia e a politica; que pode ser a ação de uns poucos que para isso detêm o poder, que decidem que outros são dispensáveis, que para nada são precisos. E que o mal que esse desvio da humanidade representa pode ser executado e espalhado por pessoas medíocres, que não questionam as ordens ou o pensamento dos seus chefes (“a triste verdade é que o mal é feito por pessoas que nunca decidiram se o que fazem é bom ou mau”).
Hanna Arendt referia-se ao totalitarismo nazi, ao julgamento de Eichmann e ao colaboracionismo de alguns lideres religiosos judeus durante a guerra com os próprios nazis.
E que mais grave do que a tentativa de genocídio é o próprio desvio que faz abater o mal com banalidade sobre as vítimas.
Mas que pensar de quem era jovem nos anos 30 e 40 e foi incorporado no exército alemão?
Que fazer nesas circunstancias?
Que fazer quando se era incorporado no exército colonial português e se recebia ordem de atacar os moimentos de libertação?
Como dotar a democracia de meios para evitar os totalitarismos? Nesse aspeto algumas garantias de democracia direta que se encontram até nas constituições de alguns países (referendos, iniciativas legislativas, assembleias de freguesia) poderiam ajudar, para alem da separação de poderes e, de forma indispensável, a educação das pessoas, para que pensem e não dependam do que lhes dizem os lideres, quer sejam religiosos quer sejam politicos.
Que podemos chamar a quem acha dispensáveis os seus semelhantes e os lança no desemprego?
E que fazer quando se é uma chefia intermédia e se recebe ordem de fazer uma lista de "dispensáveis"?
Para Hanna Arendt o julgamento de Eichmann devia fazer-se (embora num tribunal internacional), mas o mal estava antes do que estava  a ser julgado, o genocídio; o mal esteve nas pessoas vulgares terem enveredado por considerar dispensáveis outras pessoas.
Filme terrivelmente atual para muitos, quando o mal se banaliza e se expande pelo planeta, enquanto comodamente alguns vão vivendo e votando nos lideresinhos politicos e validando as opções do poder bancário central.


PS - o comentário seguinte é irrelevante e sem importancia quando comparado com a grandeza do problema estudado por Hanna Arendt, e diz respeito a um acessório da realização: a ação do filme passa-se em 1961, mas pareceu-me que o modelo de automóvel mais recente que se vê é de 1957. Poderá ser indício, se não erro, de economias da produção,ou de menor atenção do consultor de veículos históricos.

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Complementos de reforma

Dediquei o post em que comentei o 11ºcongresso da ADFERSIT "aos que andam de bonde", para quem Vinicius invocou a piedade divina.
Ver o poema completo de Vinicius em:

Dedico este post a outros, tambem referidos no poema, aos que empobrecem:
                                   “…Mas tende realmente piedade dos ricos que empobreceram
                                   E tornam-se heróicos e à santa pobreza dão um ar de grandeza…”


Alexandre Soares dos Santos, no programa Olhos nos olhos da TVI24 de 21 de outubro de 2013, disse que o peso do fator trabalho na sua fábrica de margarina era, antes de 1974, 5%; depois da revolução de abril subiu para 10%, e agora é novamente 5%.
Penso que isso se deve a salários baixos (compensados com alguma politica social por parte do grupo empresarial), mas principalmente ao fator de automatização que sobe a produtividade.
Se o peso do trabalho baixa, seria justo referir o pagamento da TSU não ao volume dos salários mas sim ao valor acrescentado bruto produzido pela empresa.
Mesmo empresas de pessoal intensivo (interno ou por outsourcing) como o metropolitano de Lisboa, têm um peso do fator trabalho que não atinge 50%.
Feitas as contas para todo o país, chega-se à conclusão que 75% dos impostos são pagos pelos rendimentos do trabalho, que são 48% do rendimento total, e 25% dos impostos são pagos pelos rendimentos do capital, que absorvem 52% do rendimento total.
Pode portanto afirmar-se que esta é uma situação de iniquidade, agravada por fazer recair sobre o fator trabalho o  maior peso da austeridade.
A iniquidade não é boa conselheira, e já se fala no parlamento europeu (cujas eleições são cruciais para a mudança de politica) que não basta pôr nos tratados que o défice publico não pode ultrapassar 3% do PIB e a divida publica 60%.
É preciso pôr também os indicadores de desigualdade de Gini, do desemprego e da pobreza.

Falaremos então de equidade quando o pagamento dos impostos pelo trabalho e pelo capital forem proporcionais, quando a taxa de pobreza, o índice de Gini e a taxa de desemprego baixarem (os políticos da corrente dominante continuam a ocultar que faz parte das sua estratégia um desemprego elevado para controlar o nível de preços).
Entretanto, observemos:
- o sistema previdencial da CGA não é de repartição (em que só os ativos descontam para as pensões dos reformados) porque o Estado não pagou ao longo da carreira dos reformados as contribuições equivalentes à TSU que as empresas privadas pagam. Isto é, capitalizou (ou beneficiou com esse capital grupos privados, o que configura crime de peculato?).
- ao longo dos anos, a segurança social foi sendo superavitaria, apesar de ir buscar dinheiro em função dos salários pagos pelas empresas e não em função do valor acrescentado que elas produziram (o que daria muito mais dinheiro) . Se foi superavitaria (deixou este ano de o ser com a contenção orçamental, mais do que com a diminuição dos empregados) isso significa que ao longo das carreiras dos atuais reformados foram sendo pagas as reformas dos reformados de então com as contribuições dos reformados de agora, sobrando porem dinheiro (apesar de vir da segurança social o dinheiro para pagar a assistencia hospitalar de todos os cidadãos, no ativo em empresas privadas e publicas, ou reformados da segurança social ou da CGA).
- Esse superavit seria naturalmente passível de ser investido em capitalização. E de facto foi, mas o fundo de capitalização, criado em 1991 e chamado Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, é muito reduzido (em 2008 valia 5% do PIB; agora 8 mil milhões de euros? que só chega para pagar 9 meses de reformas?) e os fundos de pensões que habilidosamente têm sido transferidos de grandes empresas para o Estado só têm agravado as contas da segurança social, em vez de reforçar o fundo financeiro de apoio. Esse superavit podia ainda ter sido aplicado nos certificados de reforma facultativos de compaticipação individual até 6%, cuja existência foi sistematicamente ocultada aos ativos que descontavam, pelo que o seu montante é insignificante.
- assistiu-se ao longo dos anos à paranóia (do que não pode acusar-se o atual governo, embora o governo da mesma cor entre 2003 e 2005 procedesse da mesma forma) de convencer as pessoas a reformarem-se cedo. As contas das empresas, nomeadamente as publicas, ficavam assim aliviadas embora se sobrecarregasse a segurança social ( o que não era problema porque era superavitaria).
- Neste contexto surgiram os complementos de reforma (que no metropolitano de Lisboa acabaram para quem fosse admitido depois de 2005). Para a empresa, para cada trabalhador reformado antecipadamente, dum lado da balança está a soma de (valor anual do complemento da reforma (10 milhões de euros por ano/n trabalhadores no caso do metropolitano?) vezes  o numero de anos entre a idade expetativa de vida e a idade de reforma antecipada (Iev – Ira)) mais (valor acrescentado anual do trabalhador, vezes o numero de anos entre a idade da reforma e a idade da reforma antecipada  (Ir – Ira)), isto é, o valor do que a empresa perdeu; do outro, está o que poupa: (Ir – Ira) x V  , sendo V o vencimento anual:

(Cr x (Iev – Ira))+ (Va x (Ir –Ira))  < (Ir – Ira) x V

Daqui se conclui que só no caso do vencimento ser muito mais elevado do que o valor acrescentado ou em caso de morte prematura é que compensava pagar o complemento de reforma. Então a natureza do complemento de reforma tem de ser outra, que será, em princípio, a equivalência ao pagamento de uma TSU não à segurança social, mas que permite à segurança social requerer à empresa uma contribuição menor (por outras palavras, mudando repentinamente de um sistema com complemento de reforma para outro sem complemento, é natural que as contribuições para a TSU das empresas subam , e que na equação acima, o termo do complemento de reforma Cr x (Iev – Ira) será substituído por um termo com o aumento da contribuição  para a TSU.
- Na verdade, o efeito perverso é ser elevado o valor Ir – Ira pelo que se põe a hipótese de um regresso parcial ao trabalho dos reformados por antecipação com prestação de trabalho em horário reduzido em condições especiais de prestação de aconselhamento ou pareceres em alternativa ao corte dos complementos.
- no entanto, dado que a maioria das contratações dos reformados que agora sofrem os cortes dos complementos de reforma foram feitas numa altura em que nas empresas públicas o vencimento era muito inferior ao das empresas privadas, quer ao nível de licenciados , quer ao nível operário, e essa “regalia” foi usada como compensação dessa inferioridade salarial, parece defensável considerar que a sua extinção viola o princípio da segurança contratual.
- É interessante o testemunho da associação APRE, que referiu o comentário de um jurídico alemão, Emmerich Krausse, que qualificou ironicamente esta invenção dos governantes portugueses de quebrar um contrato como a mais notável invenção dos portugueses desde o astrolábio náutico.
- considerando que a quebra contratual se justifica em casos de “force majeure”, teríamos de estender essa quebra aos contratos das PPP e dos contratos de equilíbrio financeiro das rede energéticas, sendo certo que, a ser aplicada, dispensaria a austeridade no caso dos cortes dos complementos de reforma, dentro dos critérios de equidade de repartir igualmente pelo trabalho e pelo capital os sacrifícios.
- relativamente aos complementos de reforma, que a lei do orçamento suspende no caso das empresas publicas com resultados liquidos operacionais negativos, importa definir o que são resultados líquidos.
considere-se que o saldo operacional

Sop=Rop – Dop                    
                             sendo Rop e Dop a receita e a despesa operacional total

A receita operacional total será igual a

Rop = Rov + Ric                   
                             sendo Rov as receitas de vendas de passes (de acordo com formula de repartição proporcional aos passageiros.km transportados), bilhetes e outras receitas, como prestação de serviços a outras empresas (projetos e consultoria, no caso da FERCONSULT pelo menos na proporção da colaboração com o metropolitano) ;   Ric as indemnizações compensatórias calculadas para cobrirem o diferencial entre o preço de custo de produção e a receita de venda, sendo o cálculo do custo de produção a média dos custos de produção das redes homólogas europeias)
A despesa operacional será igual a:

Dop = Dt – Dinv – Dj – (Va-Rop)                    
                                            sendo Dt a despesa total da empresa; Dinv os custos de investimento, amortizações e depreciações, Dj o valor dos juros dos investimentos e empréstimos para aquisições; Va será o valor acrescentado correspondente à produção, calculado como percentagem da contribuição para o valor acrescentado das empresas do fator trabalho transportado pelo metro, eventualmente estimado em 30%.

Reconhecendo-se que os cálculos rigorosos exigem investigação profunda e morosa, não parece que seja razoável proceder de supetão aos cortes dos complementos de reforma, sem apresentação de um plano de transição ou alternativo, pelo que parece justo suspenê-los com uma providencia cautelar.

PS em 26 de outubro de 2013 - talvez simplifique substituir os cálculos dos resultados líquidos a partir da indemnização compensatória e do valor acrescentado por um cálculo equivalente ao do versement transport em uso em França para financiar os transportes coletivos ds áreas metropolitanas - as empresas são taxadas entre 0,5 a 1% sobre os salários dos seus empregados. No entanto, do ponto de vista teórico, parece-me mais correto utilzar o valor acrescentado

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Três passos que desejaria não serem no sentido da privatização-concessão

1º passo – os para-choques da estação do Cais do Sodré da linha de Cascais

Vemos na fotografia três para-choques deslizantes. No fim das três linhas mais a norte do feixe de linhas da estação do cais do Sodré da linha de Cascais.

Observando bem, verificamos que o para-choques da linha do meio está desalinhado.
Terá havido uma colisão violenta de um comboio numa manobra de estacionamento mal calculada.
Pela posição e deformação do para-choques, o comboio não deveria ter batido a mais de 30 km/h. A inércia de um comboio é muito grande. Mesmo batendo a uma velocidade baixa, a energia cinética é muito elevada, porque proporcional à massa do comboio e ao quadrado da velocidade. De pouco serve aquela caixinha amarela, que é uma baliza de travagem automática pontual (só um controle automático contínuo da velocidade do tipo ATP, automatic train protection, poderá evitar colisões em caso de desatenção do maquinista). Ainda bem que o para-choques tinha espaço para recuar. Isso evitou que o comboio colidisse com o cais.
O para-choques da linha do meio foi deixado desalinhado porque esta via não serve passageiros. Alguém terá achado que não valia a pena gastar tempo e dinheiro da manutenção com a reposição do para-choques (e muito menos com o controle automático de velocidade). Terá sido menos consideração para com a segurança física de um maquinista com uma falha de atenção, e das pessoas que trabalhem ou frequentem a livraria e o bar vizinhos.
Por maioria de razão, não se vem gastando dinheiro na linha de Cascais para atualizar o material circulante e a infrraestruturas, ambos em caminho de acentuada degradação, testemunhada pela taxa de disponibilidade do material circulante, pelas baixas velocidades por precaução, e por acidente como os descarrilamentos.
Refiro-me a este passo apenas porque o senhor secretário de estado dos transportes mantem viva a fé nas privatizações, a começar pela linha de Cascais, apesar das queixas pungentes de que o tribunal constitucional é um empecilho ao equilíbrio operacional das empresas de transportes preparadas para as privatizações ou concessões (esquecendo porem o diferencial enorme entre as indemnizações compensatórias para a FERTAGUS e para as empresas públicas).
Dificilmente umaentidade privada fará investimentos de substituição do material circulante, de novas subestações de tração (pessoalmente acho defensável passar dos atuais 1,5 kVDC  para 3 kVDC com catenária rígida, mas se quiserem garantir a interoperabilidade, teremos os 25 kVAC).
Claro que se podia estudar uma parceria com um consórcio envolvendo fabricantes de material circulante e de infraestruturas, mas o código de contratação pública não ajuda e era preciso um grupo de técnicos imune a influencias exteriores, especialmente independente das simpatias do governo, que debatesse em ambiente aberto todas as problemáticas e que, naturalmente, conhecesse o negócio de comboios nos seus aspetos técnicos.
O recurso a verbas do QEE 2014-2020 poderia ser uma solução, mas o governo parece querer privilegiar pequenas empresas que, sendo honoráveis, não têm o efeito multiplicador dos investimentos em infraestruturas eficientes de serviço público.
Não admira assim que o senhor secretário de estado vá protelando o anuncio das decisões.


Ver  comentários sobre a problemática da privatização da linha de Cascais e os acidentes de maio de 2012 e Fevereiro de 2013 em:
e



2º passo – o postalete de Cacilhas

Custou-me muito decidir-me a escrever sobre o descarrilamento do metro ligeiro do sul do Tejo em Cacilhas, no término da linha.
Porque tenho dificuldade em escrever sobre uma linha ferroviária cujos carris terminam com um postalete, antes de um poste, sem para-choques ou, vá lá nos mínimos, calços deslizantes sobre os carris, para paragem das rodas.

com a devida vénia ao DN
O descarrilamento, por saída do fim da linha, ocorreu em 8 de Setembro de 2013.
A comunicação social apressou-se a informar que a empresa estava a investigar as causas do descarrilamento.
Seguiu-se o habitual silencio.
Como também é habitual, não se escreveu que qualquer maquinista está sujeito a falhas de atenção, como qualquer mecanismo biológico. E que a repetição de tarefas rotineiras, estatisticamente, acaba por revelar isso mesmo (a sabedoria popular usa o ditado “tantas vezes vai o cantaro à fonte que um dia lá deixa a asa”). É por isso que os sistemas ferroviários, considerando as maiores distancias de travagem, quando comparadas com o modo rodoviário, devem estar protegidos com sistemas automáticos de controle de velocidade.
Mas não foi por isto que me decidi a escrever.
Já estou habituado ao silencio do GISAF sobre os acidentes (atropelamentos e colisões) do Metro sul do Tejo.
Foi porque calhou deparar-se-me um estudo interessante sobre a ineficiência e as dificuldades económicas da rede.
Numa altura de crise, convinha reduzir importações de combustíveis fósseis rentabilizando a rede do sul do Tejo e substituindo deslocações em transporte individual Almada-Seixal-Barreiro-Moita-Montijo por transporte ferroviário (o que implicaria a expansão da rede com fundos QEE 2014-2020) .
O estudo é de António Vila Verde Ribeiro e chama a atenção para que se deveria acabar com a sobreposição das carreiras de autocarros com a rede do metro ligeiro. Os dois modos deveriam ser complementares e não concorrentes.
E a secretaria de estado dos transportes pouparia dinheiro nas indemnizações compensatórias e na importação de petróleo.

Ver o estudo de Vila Verde Ribeiro sobre o metro sul do Tejo em:



3º passo – os acidentes na linha Sarmiento de Buenos Aires

Em 19 de outubro de 2013 ocorreu mais uma colisão no término da linha Sarmiento, na estação Once de Septiembre, no mesmo local onde em fevereiro de 2012 a colisão provocou 51 mortes.
O material circulante do acidente de outubro de 2013 é diferente do de Fevereiro de 2012. Neste houve encavalitamento da segunda carruagem sobre a primeira com destruição parcial desta, provocando as mortes.
No acidente de outubro de 2013 , possivelmente por haver dispositivo anti-climbing, a primeira carruagem avançou sobre o cais cerca de 15 metros, amortecendo o choque mas mesmo assim provocando feridos.


Continua a ser um erro a falta de capacidade de absorção dos para-choques, a falta de espaço para deslizamento, a falta de espaço entre o para-choques e o ponto de paragem e, naturalmente, a falta de um sistema ATP de controle automático da velocidade do comboio.
De assinalar que depois do acidente de fevereiro de 2012, na sequencia de vários acidentes graves e da evidencia de falta de manutenção do material circulante e das infraestruturas por parte da concessionária, o estado argentino retirou-lhe a concessão. A operação é atualmente assegurada por um consórcio público-privado.
De assinalar ainda que mais uma vez se evidencia que qualquer maquinista está estatisticamente sujeito a falhas como qualquer mecanismo biológico, pelo que deverá estar protegido ppor sistemas automáticos de controle de velocidade. O maquinista correu ainda o risco de ser linchado por passageiros irados e está acusado pela policia de ter roubado o disco de gravação video da cabina de condução (na sequencia do acidente o compartimento do gravador de video abriu-se e expôs a gaveta de acesso ao disco, pelo que, no meio da confusão, a sua recolha parece correta).

Ver comentário com fotografias aos acidentes ferroviários na linha Sarmiento, em Buenos Aires, em Setembro de 2011 e Fevereiro de 2012 em:

Conclusão:

Dos 3 passos anteriores permito-me tirar a conclusão de que ter fé em panaceias como a privatização ou concessão a todo o preço, .mesmo que por imposição de economistas da troika que nunca trabalharam na parte técnica dos transportes, é um caminho arriscado do ponto de vista da segurança ferrovária.
E sobre segurança ferroviária até a UE tem normas para se cumprirem.

PS em 25 de outubro de 2013 - de acordo com a Railway Gazette, o governo argentino rescindiu a concessão ao consórcio que depois do acidente de fevereiro de 2012 operava a linha Sarmiento. Não existindo ainda ATP e não estando claramente esclarecidas as causas do ultimo acidente, parece-me precipitada a decisão, mas a Argentina é um estado soberano. Igualmente a ideia de colocar o "guarda" do comboio na cabina de conduão no ultimo percurso, antes do término, parece "peregrina", com o intuito apenas de dizer qualquer coisa à opinião publica.

O primeiro ciclo

Era o tempo em que a formação escolar da maioria dos que trabalhavam no metropolitano se limitava à instrução primária.
Era o tempo em que ainda não se lhe chamava, à instrução primária, primeiro ciclo, mas já era o tempo em que a revolução de abril de 1974 começava a abrir as escolas secundárias e as universidades à população portuguesa.
Era o tempo ainda em que se chamava primeiro ciclo aos primeiros dois anos do liceu, ou ensino secundário.
E por entre o entusiasmo da mudança das relações de trabalho no metropolitano surgiu a ideia, por um lado dos privilegiados com um curso superior e do outro, de quem queria melhorar a sua formação escolar com a ajuda dos licenciados, como fator de progressão na sua carreira profissional.
Assim se organizou, no centro cultural e desportivo, um curso intensivo do primeiro ciclo do ensino secundário, para dez profissionais de várias especialidades, que ao fim de meia dúzia de meses foram com sucesso presentes a exame numa escola secundária.
O centro cultural e desportivo tinha sucedido ao antigo centro desportivo da FNAT.
Depois da revolução fez-se um cuidadoso trabalho de remodelação dos estatutos, para que o centro pudesse ser gerido com alguma autonomia e alargasse os seus objetivos para alem da equipa de futebol.
Formámos um grupo coral, organizámos algumas viagens, umas de interesse cultural e outras não, mantivemos e desenvolvemos as colónias de férias para os filhos dos trabalhadores, mas a realização do curso do primeiro ciclo foi o êxito que mais me tocou.
Coube-me a disciplina de história de Portugal, porque na altura tínhamos poucas licenciadas em direito, sociologia ou humanidades e os outros colegas preferiram as matemáticas e as ciências da natureza.
Tive a sorte de ter uma boa professora de história e de filosofia.
A senhora, apesar de esposa de um ministro do ditador de Santa Comba, tinha uma sólida preparação científica, muito para além da piedosa versão da dilatação da fé e do império, mostrando aos seus alunos a importância das causas económicas e sociais, em detrimento dos heroísmos individuais e dos idealismos religiosos.
Foi assim um prazer para mim encontrar no livro de apoio, recém publicado, sem os cortes da censura do regime anterior, uma nova perspetiva da história de Portugal.
As mentiras das visões de Cristo nas batalhas de Afonso Henriques e, mais tarde, do Condestável, o episódio horrível da execução do bispo cristão de Lisboa durante o saque depois da tomada pelos cruzados, a excelencia da cultura islâmica peninsular, a importância da peste negra na crise do reinado de D.Fernando, o interesse egoísta da casa de Lencastre mas a capacidade gestionária dos seus membros que tornou possível a organização da expansão comercial dos descobrimentos, a puerilidade dos fidalgos falidos que gastavam o seu parco dinheiro em sedas traficadas nos navios da pimenta das Índias, a crónica insolvência das contas públicas e a dependência das importações, quer fossem armas, quer fossem queijos holandeses, como bem descrevia um professor da universidade de Pisa que nos visitou em plena euforia gastadora dos meados do século XVI.
Mas era o século XIX e a revolução liberal que suscitou mais interesse por parte dos alunos, talvez por comparação com a revolução de abril de 1974, uma substituição de relações de trabalho e de formas de produção, uma transferência de rendimentos para as classes menos privilegiadas, com a fuga de capitais para o estrangeiro, a ida de donos da industria para o México e para o Brasil, aguardando a oportunidade do regresso.
E tudo isso enquanto o metropolitano funcionava, ininterruptamente, com dificuldade em obtenção de peças de reserva devido ao embargo de algumas empresas estrangeiras, mas sem nunca ter deixado de prestar o seu serviço de transporte à população.
Era o tempo em que crescia uma grande esperança de que fosse a população trabalhadora a organizar-se e a gerir o seu tempo, a sua força de trabalho, o seu território, desde o nível das freguesias e das empresas, e não subordinados a grupos económico financeiros, politico partidários, com auto intitulados lideres e as suas coortes organizadas de diligentes centuriões a condicionar a vida da maioria.
Era o tempo em que os mais assustados diziam que se caminhava para o abismo, quando na realidade se atravessava apenas um período de aumento dos custos do petróleo, embora esse “apenas” fosse do tamanho do mundo, que é essa a dimensão da economia do petróleo.
Era o tempo em que uma equipa de universitários do MIT analisou as finanças portuguesas e concluiu que, apesar da diminuição do PIB, coisa que sempre acontece quando há uma mudança politica importante, as contas da nação estavam razoavelmente sãs.
Era o tempo em que chegáramos a uma encruzilhada e nunca saberemos se teríamos conseguido seguir com êxito pela outra via.

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Um estudo de caso

Não é importante, mas o observador entretem-se por vezes a comentar casos sem importancia. Talvez seja mais um exemplo da estranheza que os portugueses suscitam em estrangeiros.
Estar a discutir coisas sem importancia, quando tanta coisa grave nos acontece.
Também pode ser que seja mais um exemplo de que a lingua portuguesa não é muito clara e de que nós portugueses temos dificuldade em exprimir as ideias de modo a serem bem compreendidas, complicando-se a coisa quando pensamos que há uma relação intima entre os mecanismos cerebrais e a formação da linguagem.
Terá sido por uma ou por todas estas razões que o embaixador de Espanha depois de vir a Lisboa apresentar a candidatura de Filipe II de Espanha ao trono português (apresentar a candidatura também é uma forma de expressão; o castelhano também manifesta dificuldades de expressão) regressou a Madrid e começou o seu reatório ao rei dizendo que "los portugueses, pero son gente mui estraña". Querendo possivelmente dizer o mesmo que o cronista romano: "não se entendem sobre o seu governo nem deixam que ninguem os governe" (e contudo, se pedissemos aos paises escandinavos que nos fornecessem um grupo de técnicos para administrar a coisa pública por uns tempos talvez não fosse mau; desde que não se demorassem muito por cá, que estas coisas pegam-se).
Já foi dado neste blogue o exemplo do telemóvel. No Brasil diz-se celular (exprimindo a natureza da rede de emissores GSM), em França portable, que é o que ele é, em Inglaterra celular phone. Mas alguém em Portugal juntou telefone e radio móvel.
Outro exemplo, em qualquer país do mundo temos a meteorologia. Em Portugal temos o instituto do mar e da atmosfera.
Nas comunicações em congresso fala-se muito em "case studies".
Uns traduzem por "estudos de caso", e outros por "casos de (para) estudo".
Realmente os anglo-saxónicos têm uma gramática diferente: quando dizem "case", não é certo que seja um "caso" o substantivo. O seu cérebro fica à espera que o fim da frase lhe diga qual é o substantivo, o que é que vai aplicar-se ao "caso". O caso ficou em "stand-by". E só depois se conclui que é o "caso" que é o objeto de um "estudo".
Precipitadamente os portugueses acham que é o "caso" o substantivo, e que se o "estudo" vem depois só pode ser para servir o "caso", isto é, é um "caso de ou para estudo".
Linguagens precipitadas (e contudo, em inglês consegue-se normalmente exprimir a mesma ideia com menos palavras, missing you e saudade é uma das exceções), utilizadores de linguagens que não esperam pelo fim das frases, ou dos raciocinios, para tirar conclusões ou responder, facilmente se afastam da realidade, e em cada troca de frases mais se afastam dela.
Não admira assim que seja dificil aos portugueses entenderem-se.
Não acham que isto dava um caso de estudo, perdão, um estudo de caso?


O 11ºcongresso da ADFERSIT no centro de congressos do Estoril em 17 e 18 de outubro de 2013

"Meu Senhor, tende piedade dos que andam de bonde..."                                                                            (Vinicius de Morais, o desespero da piedade,  
                                                                                 ver o poema completo no fim deste post)

Podia ter sido este o tema do congresso, que talvez tivesse ficado mais próximo das causas últimas do desolador panorama dos transportes em Portugal, mesmo sem considerar as culpas que nisso a crise terá.
Mas não, o tema foi "Os transportes, a energia e o ambiente".
Graças aos patrocinadores foi possível debater algumas questões relacionadas durante dois dias, no edificio cedido pela camara municipal de Cascais.
Este blogue teve a hora de fazer uma apresentação sobre energias renováveis e a tração rodoviária com hidrogénio, que já foi inserida neste blogue.
A atividade da ADFERSIT, enquanto expressão do conhecimento teórico e prático dos seus técnicos, é uma prova de que é possivel à sociedade civil e aos cidadãos não organizados em partidos mostrar soluções concretas.
Infelizmente, o bloqueio à operacionalização das soluções imposto pela própria estrutura politica e partidária tem sido muito eficaz e a eficácia das ações como as da ADFERSIT reduzida.
Não parece assim ter sido suficientemente profundo o debate que se verificou, nem passíveis de rápida concretização as medidas propostas, nem existirão grandes esperanças de que o poder politico, especialmente na sua vertente económica e financeira, tenham recebido as mensagens.
Fica uma sensação de que a população anda a ser enganada quando é revelado, numa das apresentações do congresso, que no programa dos fundos europeus de coesão 2000-2006,  Portugal utilizou 24% das verbas (equivalente a 5.000 milhões de euros) em  infraestruturas de transportes (certo, já sabemos, muito foi mal gasto em autoestradas, mas consideremos o estado prévio deplorável das ligações rodoviárias). Nos fundos do programa de 2007-2013 foi programada uma utilização de 13% (equiv.2.800 Meuro) para infraestruturas de transportes, que foi baixada para 9% !!! (equiv.1.900 Meuro) pelo atual governo em 2012.
Será, para utilizar os termos de Vinicius, uma piedosa distancia da realidade e das necessidades da comunidade portuguesa em transportes (passageiros e mercadorias,claro) por parte dos decisores.
Ter-se-á manifestado mais uma vez a maldição dos economistas, que manipulam as suas contabilidades sem saber como funcionam na realidade as coisas correspondentes (não se pretende ofender, apenas que perguntem como as coisas funcionam e qual o efeito delas não funcionarem, ou de não se construirem as respetivas infraestruturas).

Foi comunicado no congresso que a UE aprovou o plano dos fundos europeus (QEE - quadro estratégico europeu, sucessor do QREN, dotado, para Portugal, duma verba total de 21.800 Meuro) para 2014-2020 com as prioridades das redes Transeuropeias, que incluem os corredores ferroviários atlanticos Lisboa/Sines/Setubal - Madrid e Leixões/Aveiro - Salamanca (para passageiros e mercadorias, claro).
Ficam assim, mais uma vez, sem argumentação os decisores e seus apoiantes que repetem "não há dinheiro" .
Que parte da frase "a UE aprovou as redes transeuropeias com os corredores atlanticos com comparticipação de 85%" não terão percebido?
Mas há um problema: os projetos já deveriam estar a ser elaborados a todo o vapor, e reina o silencio sobre isso.
Foi dito informalmente que nas verbas sobrantes do QREN ainda cabiam os acabamentos da estação do metro da Reboleira de correspondencia com a linha de Sintra.
E que nas verbas do QEE seriam contempladas a ampliação dos cais da estação Arroios e a adaptação a pessoas com mobilidade reduzida de algumas estações do metro.
Esperemos, embora o problema principal seja aquele: é preciso acabar rapidamente os projetos para a  candidatura ser aprovada, vencer a inércia, o olharmos uns para os outros sem nehuma entidade decisora tomar a iniciativa, enquanto a bola do voleibol cai no chão e a equipa perde o ponto.
Das sessões especializadas em que participei, saliento a necessidade de redução da dependencia de combustíveis fósseis nos transportes (36% da energia primária, 3.700 milhões de euros anuais, correspondente a petróleo importado, é consumido em transportes rodoviários)  através do desenvolvimento de frotas elétricas (relacionado com isto, são boas sugestões a construção de uma linha de muito alta tensão de corrente continua entre Portugal, Espanha e França para absorver o excesso de produção das eólicas, e a conclusão do plano de barragens com centrais hidroelétricas com bombagem).
De assinalar que, entre os participantes, ainda há técnicos que não estão sensibilizados para a maior eficiencia energética por passageiro.km de uma linha ferroviária Lisboa-Madrid quando comparada com a ligação aérea (a economia energética de uma ligação aérea, para alem da taxa de ocupação elevada, reside na baixa resistencia ao deslocamento a alta altitude, em velocidade de cruzeiro; na ligação Lisboa-Madrid o avião tem de começar a descer ao atingir a altitude de cruzeiro, perdendo assim rendimento; por maioria de razão na ligação Lisboa-Porto).
Igualmente se viu no congresso que a perceção da opinião pública ainda está dominada pelo chavão de que as empresas públicas de transportes são mal geridas e que só os privados podem gerir bem o respetivo serviço público.
Trata-se de uma questão que tem de ser analisada caso a caso, que depende dos técnicos executantes e não de ideologias.
Por exemplo, a FERTAGUS dispõe de indemnizações compensatórias por passageiro.km muito superiores às que os metropolitanos e unidades de suburbanos recebem. Foi ainda dado o bom exemplo dos transportes municipais  rodoviários do Barreiro e o mau exemplo da concessionária dos transportes urbanos de Cascais.
Assinalo ainda as excelentes intervenções sobre a problemática a nível global da energia e do ambiente.
Por exemplo, a equação Kaya para estimativa da produção de CO2:  
produção CO2 = população x (volume de serviços/pessoa) x (volume de energia/serviço) x (emissão de CO2/energia produzida)
Por exemplo, a evolução da extração de combustíveis fósseis (fratura hidráulica de rochas de xisto para obtençao de petróleo e gás de xisto - oil and gas shale)


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O Desespero da Piedade
Meu senhor, tende piedade dos que andam de bonde
E sonham no longo percurso com automóveis, apartamentos...
Mas tende piedade também dos que andam de automóvel
Quando enfrentam a cidade movediça de sonâmbulos, na direção.

Tende piedade das pequenas famílias suburbanas
E em particular dos adolescentes que se embebedam de domingos
Mas tende mais piedade ainda de dois elegantes que passam
E sem saber inventam a doutrina do pão e da guilhotina.

Tende muita piedade do mocinho franzino, três cruzes, poeta
Que só tem de seu as costeletas e a namorada pequenina
Mas tende mais piedade ainda do impávido forte colosso do esporte
E que se encaminha lutando, remando, nadando para a morte.

Tende imensa piedade dos músicos dos cafés e casas de chá
Que são virtuoses da própria tristeza e solidão
Mas tende piedade também dos que buscam silêncio
E súbito se abate sobre eles uma ária da Tosca.

Não esqueçais também em vossa piedade os pobres que enriqueceram
E para quem o suicídio ainda é a mais doce solução
Mas tende realmente piedade dos ricos que empobreceram
E tornam-se heróicos e à santa pobreza dão um ar de grandeza.

Tende infinita piedade dos vendedores de passarinhos
Que em suas alminhas claras deixam a lágrima e a incompreensão
E tende piedade também, menor embora, dos vendedores de balcão
Que amam as freguesas e saem de noite, quem sabe onde vão...

Tende piedade dos barbeiros em geral, e dos cabeleireiros
Que se efeminam por profissão mas que são humildes nas suas carícias
Mas tende mais piedade ainda dos que cortam o cabelo:
Que espera, que angústia, que indigno, meu Deus!

Tende piedade dos sapateiros e caixeiros de sapataria
Que lembram madalenas arrependidas pedindo piedade pelos sapatos
Mas lembrai-vos também dos que se calçam de novo
Nada pior que um sapato apertado, Senhor Deus.

Tende piedade dos homens úteis como os dentistas
Que sofrem de utilidade e vivem para fazer sofrer
Mas tende mais piedade dos veterinários e práticos de farmácia
Que muito eles gostariam de ser médicos, Senhor.

Tende piedade dos homens públicos e em particular dos políticos
Pela sua fala fácil, olhar brilhante e segurança dos gestos de mão
Mas tende mais piedade ainda dos seus criados, próximos e parentes
Fazei, Senhor, com que deles não saiam políticos também.

E no longo capítulo das mulheres, Senhor, tende píedade das mulheres
Castigai minha alma, mas tende piedade das mulheres
Enlouquecei meu espírito, mas tende piedade das mulheres
Ulcerai minha carne, mas tende piedade das mulheres!

Tende piedade da moça feia que serve na vida
De casa, comida e roupa lavada da moça bonita
Mas tende mais piedade ainda da moça bonita
Que o homem molesta - que o homem não presta, não presta, meu Deus!

Tende piedade das moças pequenas das ruas transversais
Que de apoio na vida só têm Santa Janela da Consolação
E sonham exaltadas nos quartos humildes
Os olhos perdidos e o seio na mão.

Tende piedade da mulher no primeiro coito
Onde se cria a primeira alegria da Criação
E onde se consuma a tragédia dos anjos
E onde a morte encontra a vida em desintegração.

Tende piedade da mulher no instante do parto
Onde ela é como a água explodindo em convulsão
Onde
ela é como a terra vomitando cólera
Onde ela é como a lua parindo desilusão.

Tende piedade das mulheres chamadas desquitadas
Porque nelas se refaz misteriosamente a virgindade
Mas tende piedade também das mulheres casadas
Que se sacrificam e se simplificam a troco de nada.

Tende piedade, Senhor, das mulheres chamadas vagabundas
Que são desgraçadas e são exploradas e são infecundas
Mas que vendem barato muito instante de esquecimento
E em paga o homem mata com a navalha, com o fogo, com o veneno.

Tende piedade, Senhor, das primeiras namoradas
De corpo hermético e coração patético
Que saem à rua felizes mas que sempre entram desgraçada
Que se crêem vestidas mas que em verdade vivem nuas.

Tende piedade, Senhor, de todas as mulheres
Que ninguém mais merece tanto amor e amizade
Que ninguém mais deseja tanto poesia e sinceridade
Que ninguém mais precisa tanto de alegria e serenidade.

Tende infinita piedade delas, Senhor, que são puras
Que são crianças e são trágicas e são belas
Que caminham ao sopro dos ventos e que pecam
E que têm a única emoção da vida nelas.

Tende piedade delas, Senhor, que uma me disse
Ter piedade de si mesma e de sua louca mocidade
E outra, à simples emoção do amor piedoso
Delirava e se desfazia em gozos de amor de carne.

Tende piedade delas, Senhor, que dentro delas
A vida fere mais fundo e mais fecundo
E o sexo está nelas, e o mundo está nelas
E a loucura reside nesse mundo.

Tende piedade, Senhor, das santas mulheres
Dos meninos velhos, dos homens humilhados - sede enfim
Piedoso com todos, que tudo merece piedade
E se piedade vos sobrar, Senhor, tende piedade de mim!

                                       Vinicius de Morais 

domingo, 20 de outubro de 2013

Viabilidade das energias renováveis em transportes - a tração por hidrogénio

Este blogue saúda a realização do XI congresso da ADFERSIT, no centro de congressos do Estoril, em 17 e 18 de outubro de 2013.
A ADFERSIT orgulha-se da sua irreverencia, inconformismo e vontade de colaboração na resolução dos problemas de transportes do país.
Junto a apresentação que fiz sobre a aplicação das energias renováveis à tração por hidrogénio, numa perspetiva de redução e substituição das  importações de combustíveis fosseis par aos transportes
(ficheiro powerpoint da apresentação em:            http://sdrv.ms/H6TiTa                  ).



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VIABILIDADE DAS ENERGIAS RENOVÁVEIS NOS TRANSPORTES
  -  razões para recorrer às energias renováveis e proposta da tração com hidrogénio  -  numa perspetiva de cidadania

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         pais  civilizado  não é aquele em que pobre anda de carro; é aquele em que rico usa transportes públicos
                              num cartaz numa manifestação no Brasil em Agosto de 2013 por
                                                                      educação, saúde e transportes públicos

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         “… Vivemos apavorados, com medo de sermos mortos nas cidades, de sermos atropelados. Depois de 5.000 anos de civilização, será que esse é o lugar aonde queremos chegar?
         … Onde não há calçada não há democracia.
         … Um secretário de transporte precisa de pensar imediatamente em medidas para se reduzir o uso do carro. Mas muitos pensam exatamente o contrário. Definem meios de aumentar o uso dos veículos
         … a qualidade de vida precisa ser igual para todos, passageiro de transporte individual ou publico …”
                                                         Enrique Peñalosa, ex prefeito de Bogotá

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         a quota de deslocações motorizadas em transporte individual (TI) na área metropolitana de Lisboa ultrapassa 60% do total de deslocações motorizadas,
         trata-se de energia consumida com origem no petróleo, com uma eficiencia energética inferior ao transporte coletivo (TC), quer ferroviário, quer rodoviário;

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para tentar atenuar o desperdício de energia, podemos imaginar uma transferência de 10% de deslocações do transporte individual para o TC, através de:

    • limitação severa de velocidade em vias rápidas e em ambiente urbano, privilegiando as deslocações pedonais e em segunda prioridade em bicicleta
    • penalização do estacionamento urbano
    • portagens nos acessos às zonas centrais urbanas
    • correspondencia com o TI em “park and ride”
    • desenvolvimento de redes de aluguer partilhado de bicicletas e pequenos automóveis elétricos em pontos de correspondencia com o TC
    • taxação extraordinária da venda de combustíveis
    • criação de escalões de consumo de combustível
    • benefícios fiscais para as empresas que paguem as deslocações em TC aos seus empregados ou clientes ou emitam cartões de desconto associados ao TC
    • taxação de empresas (0,5 a 1% dos salários) servidas pelo TC, tipo “versement” francês
      §
    • concessão à empresa de TC, incluindo as mais valias, da urbanização de novos bairros servidos pelas suas linhas, tipo Hong Kong
    • afetação do IMI ao financiamento do TC
    • politica de reorganização urbanística e de reabilitação habitacional

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         com esta transferência de 10% de deslocações em TI pouparíamos talvez 15 milhões de euros anuais de combustíveis importados e 40.000 toneladas de CO2,

          mas ganharíamos a ira dos automobilistas, pese embora tratar-se duma ira auto castigadora, por também serem contribuintes

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         podemos então nada fazer, esperando remansadamente que:

      • os preços de mercado do petróleo subam a 200 dolares/barril tornando rentáveis as energias renováveis
      • as taxas de carbono ou licenças de emissão ultrapassem 50 euros/tonCO2 , ou
      • venha a ser económica a exploração do petróleo ou metano de Alcobaça
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ou,
considerando que:
         em 2012 a  taxa de dependência energética de Portugal foi de    
                                                        79,8%                  (fonte: DGEG)

         a quota dos transportes no consumo final de energia foi de cerca de 
                                                        36%                   (fonte: DGEG)

         o consumo final de petróleo rodoviário foi cerca de
     5,3 milhões de tep  ~ 3.700 milhões de euros      (fonte:  AdC/DGEG)
                                                                                                       
                 podemos tentar seguir a via da politica energética e ambiental da UE,

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         79,8% como dependencia energética é um numero ainda mais preocupante do que o da dependência alimentar  (47% dos alimentos consumidos são importados, embora
                                 a taxa de dependência baixe para 25%, considerando o                     
                                                                peso das exportações de alimentos)

         o país não produz rendimentos para pagar estes dois défices em importações de bens essenciais

         “a energia é o problema fundamental da humanidade”
                   (a energia necessária para mover um automóvel é 10 vezes a energia necessária à
                                                                                                               alimentação do condutor)

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“No plano da utilização de energia proveniente de fontes endógenas renováveis, pretende-se que em 2020:
          31% do consumo final bruto de energia
          10% da energia utilizada nos transportes
       provenha de fontes renováveis …”
Valores atuais: 22,8% e 5,5% (bio combustíveis, tração elétrica)


                             Resolução do Conselho de ministros 20/2013 de 2013-04-10  (inclui
                            o PNAER) , Decreto -Lei n.º 39/2013 e Diretiva europeia 2009/28/CE

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estes objetivos não se fundamentam apenas na redução das emissões      
                     de gases com efeito de estufa,
    
mas também na necessidade de conter as importações
                                          porque:

             saldo orçamental = investimento privado - 
                                             poupanças privadas + exportações - importações

equação deduzida da fórmula do
PIB = Consumo famílias+Investimento privado+Gastos públicos+Exportações-   
Importações     ;                fazendo       
PIB = Consumo famílias+Poupanças  privadas+Impostos- prestações sociais ;  e   saldo orçamental=impostos-gastos públicos –prestações sociais


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linhas de desenvolvimento principais do PNAER para aumento da quota das energias renováveis nos transportes:
                       
    • Bio-massa e produção de bio-combustíveis  (receia-se que a produção nacional de bio-combustíveis que não seja a partir das algas provoque aumento de preços de alimentos nacionais e importação de alimentos)
    • baterias de veículos de tração elétrica com baterias: frotas de táxi, de autocarros urbanos e veículos de serviço municipais e de empresas (por razões de densidade energética, estes veículos não são competitivos para percursos maiores que 80 -100 km, relativamente aos de combustão interna, a menos que se imponham restrições de velocidade e aumentos sobre os combustiveis ou fiscalidade; a considerar ainda a pequena longevidade das baterias)
    • construção de barragens com bombagem para compensação da intermitencia eólica (potencial : 5GW, duplicando a potencia instalada)

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autocarro elétrico (de baterias) Caetanobus/EFACEC em experiencia em Lisboa, no Martim Moniz

painel posterior de baterias do autocarro Caetanobus


taxis tuk tuk elétricos (de baterias) no Funchal (foto Magnum Cap.Aveiro)
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         perante a imperiosa necessidade de ter o saldo orçamental positivo, e as previsíveis reações negativas dos automobilistas, propõe-se, numa perspetiva de cidadania de contenção de importações, o aumento da quota de energias renováveis nos transportes para 10%, através da  “solução islandesa”         (deliberação do parlamento
                                  islandês em 1998 de conversão até 2050 das frotas rodoviárias e     
                                  maritimas  para hidrogénio obtido a partir de energias renováveis)

         basicamente, será uma forma de desenvolver o roteiro do hidrogénio referido no PNAER



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Posto de abastecimento de  hidrogénio de veículos com células de combustível no Hawai

Idem, na Califórnia

Idem, em Dusseldorf


Autocarro movido a hidrogénio na experiencia CUTE/STCP, no Porto




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1kg de H2 necessita de 60 kWh para ser fabricado e colocado no posto de abastecimento, e dele só se pode tirar 10 kWh de tração na roda
                               (consumo de um autocarro elétrico urbano ~1,5 kWh/km;          
                                                      autocarro diesel: 50l/100km ~ 4,5kWh/km)
            o hidrogénio não é uma panaceia barata, é apenas um portador de energia que, apesar de mais caro do que os combustiveis fósseis, tem também como justificação, como as energias renováveis:
    • menores emissões de CO2
    • menor importação (desde que seja significativa a componente nacional no fabrico dos equipamentos)


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         os riscos são os de qualquer investimento em tecnologias já testadas em funcionamento real mas há menos de uma década;

         ainda no âmbito do PNAER, é de referir que as soluções de centrais solares térmicas de concentradores e de sais fundidos (para produção após o pôr do sol) já estão testadas em funcionamento real, nomeadamente em Espanha, com várias em construção (inconvenientes: custo elevado, exigencia de água; vantagens: armazenamento de calor, possibilidade de produção por gaseificação/reforma, ou separação do H2 do vapor em atmosfera pobre em O2 e aquecida e de CO de matérias com carbono ou biogás)



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         Voltando à área metropolitana de Lisboa, pôs-se atrás a hipótese de transferir 10% de deslocações em TI para o TC ferroviário
         pôs-se também a hipótese de nada fazer
         põe-se finalmente a hipótese de transferir 10 % das 400.000 deslocações em TI de tração por combustíveis fósseis para tração elétrica com origem eólica

         estimo grosseiramente uma economia diária de 36.000 euros por dispensa da importação de petróleo (ca 9 milhões de euros anuais),

         os consumos de energia elétrica eólica seriam um pouco superiores no caso da tração por baterias, ou 3,6 vezes no caso de tração por hidrogénio

         os custos de produção de energia elétrica eólica estão fixados em 10 cent/kWh (comparáveis com 5,5cent/kWh em geral) estimando-se que 7cent/kWh seja razoável (para baixar este valor: desenvolver a exportação dos equipamentos de produção, diminuir os custos de fabrico e instalação)



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o que leva a colocar esta questão de difícil resposta:

       -  quantas vezes poderá o custo de exploração de ativos e consumíveis exclusivamente nacionais (incluindo custos de investimento),
                       
                        ser superior ao custo de ativos e 
                        consumíveis importados?


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parecerá razoável considerar do interesse da UE, atendendo à estratégia de redução de emissões de gases com efeito de estufa e de importação de combustíveis fósseis,
    a sua participação como investidora em linhas de transmissão de alta tensão contínua ligadas às fontes de produção solar e eólica em Portugal e Espanha,
    rentabilizando assim o excesso de capacidade instalada em Portugal e Espanha, e melhorando a reação aos picos de consumo por aumento da capacidade de interligação França-Espanha



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os riscos para os investimentos em energias renováveis nas direções propostas terão de ser cobertos, incluindo os défices de exploração quando comparados com as tecnologias de combustíveis fósseis, por mecanismos de investimento do tipo                         
  QREN (quadro de referencia estratégico nacional)           e
  JESSICA (joint european support for sustainable investment in city areas)


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A complexidade desta problemática justifica que, numa perspetiva de participação da sociedade civil:

    • sejam chamadas à colaboração com a DGEG no desenvolvimento do PNAER, no domínio das energias renováveis e dos transportes, entidades relacionadas como universidades, associações profissionais como a ordem dos engenheiros, associações como a ADFERSIT, a industria, a imprensa da especialidade, organismos municipais e empresas de transporte públicas e privadas;
    • seja possível o acompanhamento pelos cidadãos dos resultados que forem sendo obtidos;
    • sejam incentivadas as entidades à participação em projetos europeus de mobilidade elétrica.


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Leitura adicional

         “Sector dos transportes, uma perspectiva energética e ambiental”, J.Fonseca Nabais, ed. ETEP
         “Renewable energy”, Bent Sorensen, ed.Elsevier Academic Press
         “Energia para o futuro”, Robert Laughlin, ed.Monitor
         “10 tecnologias para salvar o planeta,conciliar clima e energia”,Chris Goodall,ed.Livros Horizonte
         Enrique Peñalosa,         http://www.cnt.org.br/Paginas/Agencia_Noticia.aspx?n=8326
         comunicações da conferencia de mobilidade urbana de setembro de 2013, http://www.imtt.pt/sites/IMTT/Portugues/Noticias/Paginas/4ConferenciadaMobilidadeUrbanaComunicacoes.aspx
         economia do hidrogénio, solução islandesa, http://en.wikipedia.org/wiki/Hydrogen_economy 
                                          http://en.wikipedia.org/wiki/Renewable_energy_in_Iceland#Hydrogen
                                          http://newenergy.is/en/projects/research_and_demonstration_projects/
                                         http://www.airliquide-hydrogen-energy.com/
         centrais solares térmicas de concentradores e sais fundidos, http://www.torresolenergy.com/TORRESOL/gemasolar-plant/en
         Hydrogen supply infrastructure and fuel cell bus technology, CUTE (Clean urban transport for Europe),     www.fuel-cell-bus-club.com   ,     www.usea.org/iphe.htm  ,
                         europa.eu.int/comm./research/energy/nn/nn_rt_htp1_en.html 
         “a energia é o problema fundamental da Humanidade”,
         parecer sobre o PNAEE e o PNAER,
         estimativa dos ganhos da transferência de 10% de pass.km do modo individual para o transporte público,
         conversão em tração elétrica de 10% de automóveis da área metropolitana de Lisboa,
         estratégia energética da Europa,
         veículos de pilha de combustível,
            http://www.hydraflx.com/index.html     
         ficção sobre energias renováveis,  
         fórmula do saldo orçamental:        “Economia para todos”, David A.Moss, ed. Academia do Livro