terça-feira, 12 de abril de 2016

Entrevista de 10 de abril no DN do primeiro-ministro do XXI governo

http://www.dn.pt/portugal/interior/antonio-costa-quer-limpar-de-vez-o-lixo-que-ha-nas-contas-dos-bancos-5118926.html

Tenho interesse em comentar alguns pontos desta entrevista pelas relações com questões de organização da comunidade ou com questões técnicas.
1 - capitalização da CGD pelo Estado - a opinião geral é a de que as regras da UE proibem o Estado de capitalizar o seu banco. O primeiro-ministro chama a atenção que as regras da UE proibem a discriminação entre entidades públicas e privadas. Isso impede o favorecimento e o prejuízo de uns relativamente a outros. Como já referido neste blogue  a propósito das empresas públicas de transporte, a consequência lógica é que impedir o Estado de capitalizar as empresas públicas é discriminá-las negativamente. Ver a diretiva 1370/2007 da CE. Isto para não falar nas exceções devidas a condições especialmente desfavoráveis como desemprego e caraterísticas periféricas. Mas a dificuldade de interpretação de textos não é exclusiva de Portugal. Por isso é de aplaudir a posição do primeiro-miinistro. O problema é de facto a falta de dinheiro disponível para a capitalização.
2 - intervenção na TAP -  tratou-se de cumprir o programa de governo anunciado na campanha eleitoral. Porém, a realidade da TAP é muito grave, esperando-se que a intervenção possa reduzir eventuais prejuízos futuros. No entanto, é possível afirmar desde já que os prejuízos acumulados da VEM, empresa de manutenção no Brasil montam, segundo notícias publicadas, a cerca de 500 milhões de euros, que a sua aquisição foi desde o início criticada e que o consultor jurídico que apoiou as negociações esteve ligado à Geocapital, que vendeu a sua participação na VEM à TAP em 2005. Penso que só este facto deveria ser suficiente para um pedido de dispensa pelo próprio consultor. Desejaria pois ver este assunto esclarecido. Igualmente choca a coincidência entre o acordo com a Barraqueiro na TAP e o ajuste direto no prolongamento da exploração Porto (neste blogue já se afirmou que devido ao não investimento público em meios de exploração do metro do Porto não se justificaria a reversão da concessão à Transdev). O que é outro assunto que se desejaria ver esclarecido. Acresce a preocupação pela utilização até à última do aeroporto da Portela, com supressão de uma pista para estacionamento, com a ameaça constante de obras eternas e desperdício na solução Montijo em vez de novo aeroporto faseado. Não posso portanto apoiar a ação do governo no caso da TAP.
3 - investimento em infraestruturas ferroviárias com fundos comunitários-  trata-se de uma omissão. Na entrevista não se aborda a questão dos investimentos em infraestruturas ferroviárias, cujo desenvolvimento, em termos de ligação à Europa, faz aliás parte das orientações europeias (pelo que não deveriamos contrariar os compromissos com a  Europa). Dado já ter sido divulgado o plano ferroviário e ele ser omisso no planeamento dessa ligação à Europa (apenas prevê uma ligação em via única em bitola não europeia, contrariando assim compromissos com a Europa, entre Évora e a fronteira do Caia, esquecendo a necessidade de iniciar a transição para a bitola europeia e esquecendo as ligações de passageiros Lisboa-Madrid numa altura em que a Espanha obtem financiamento para concluir a ligação em alta velocidade de Madrid a Badajoz), deixo também registada a minha discordância neste assunto relativamente ao XXI governo, lamentando a perda da oportunidade na obtenção de fundos comunitários.
4 - banco mau para o crédito malparado - como já referido neste blogue e aprendido no livro de Tim Harford, Adapte-se, trata-se da solução de Bulow/Klemperer. Mas choca-me no meio de tantos comentadores e sábios de economia ninguém dizer o que vem no livro de Tim Harford, na página 233, que a solução implica que o banco mau (ou de retaguarda) fica dono das participações proporcionais dos bancos bons (de transição ou ponte) que descarregarem nele os seus créditos malparados. Mas é possível que seja má interpretação minha, num país em que tantos sábios e uma elite esclarecida nos têm conduzido onde estamos. Ao menos que lessem o livro.


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